Se aproxima de seu rito final o maior julgamento já realizado no Rio Grande do Sul. A previsão é de que o júri do incêndio da boate Kiss se encerre nesta sexta-feira (10), com a leitura da sentença por parte do juiz Orlando Faccini Neto.
O destino dos quatro réus que respondem pela morte de 242 pessoas será definido por sete jurados, que compõem o Conselho de Sentença. Entre um dia e outro, ficam isolados em um hotel, sem poder se comunicar com o mundo externo.
A sessão será retomada às 10h. A votação dos jurados começa após o fim das manifestações de testemunhas e réus e dos debates da acusação e das defesas, o que deve ocorrer a partir das 15h30min desta sexta.
Então, o júri é indagado se sente-se pronto para decidir sobre o caso. Se sim, o grupo é encaminhado para a chamada sala secreta (ou sala especial), acompanhado de integrantes do MP, da defesa e de um oficial de justiça.
Ali, o juiz formula perguntas sobre o incêndio, os homicídios, culpa, intenção ou inocência. Essas questões são feitas com base na denúncia do Ministério Público e nas teses de defesa. Elas são apresentadas às partes, que podem impugnar alguma questão, que será reavaliada pelo juiz. Não há número limite para as perguntas, que costumam ser bastante objetivas, já que os jurados podem responder apenas com "sim" ou "não".
Depois de formuladas as perguntas, o juiz faz a leitura delas aos jurados. Para cada pergunta, os jurados irão depositar a cédula correspondente à resposta em uma urna, que garante o sigilo sobre o voto. As decisões são tomadas por maioria simples, ou seja, vence a posição que somar quatro votos. O magistrado do caso determinou prazo de até oito horas para a votação.
De acordo com o pós-doutor em Direito e professor de Processo Penal da Pontifícia Universidade Católica do RS (PUCRS) Marcelo Peruchin, a primeira pergunta a ser feita ao júri é se houve ou não dolo eventual (quando se assume o risco de matar) por parte dos réus, conforme sustenta o Ministério Público — segundo as defesas, no entanto, o incêndio foi um acidente, do qual os próprios réus poderiam ter sido vítimas.
Se a resposta a essa pergunta for positiva, o rito segue e são feitas as demais perguntas, até o fim da votação. Se a resposta for negativa — se o júri entender que não houve dolo —, não caberá mais ao conselho de sentença decidir sobre o destino dos réus, e sim ao magistrado, e a matéria passa ao juiz presidente. Isso ocorre porque os casos de crimes culposos (quando não há intenção) não são de competência do Tribunal do Júri. Neste caso, o juiz teria que definir se os réus são condenados por homicídio culposo ou absolvidos.
Entretanto, como houve o desaforamento (troca de comarca) do julgamento, a competência será do juiz Ulysses Fonseca Louzada, titular da 1ª Vara Criminal da Comarca de Santa Maria, onde o processo tramitou. Orlando Faccini Neto, que preside o júri na Capital, tem competência para os casos dolosos.
Nesse momento de votação desta sexta, possíveis dúvidas dos jurados são sanadas pelo próprio magistrado. Eles não podem conversar sobre o caso, apenas sobre demais assuntos que não envolvam o julgamento.
Encerrada a votação dos jurados, o magistrado define a sentença, que é lida no plenário. É também o juiz que irá definir se os réus serão presos logo após o fim do julgamento ou se seguirão respondendo o processo em liberdade até o trânsito em julgado.
Atualmente, os quatro acusados respondem em liberdade. Por terem residência fixa e bom comportamento pelo período que ficaram presos, por exemplo, a Justiça permitiu que eles fossem soltos. Contudo, se forem condenados pela morte das 242 pessoas na boate, o juiz pode modificar a decisão e definir que eles sejam presos de forma imediata.
Independentemente da decisão do magistrado, cabe recurso tanto por parte do MP quanto das defesas. Conforme o TJ, os tribunais só poderão modificar a pena ou determinar a realização de novo julgamento, jamais modificar a decisão dos jurados.
Jurados assistiram jogo e pediram pizzas
Afastados do mundo externo, os jurados estão hospedados em um hotel e são acompanhados por uma equipe de oficiais de Justiça. Eles podem conversar entre si, desde que não falem sobre o julgamento, e também fazer ligações para familiares, sempre acompanhados por oficiais.
Desde o dia 1º, quando o júri começou, o grupo teve alguns momentos de descontração. Um deles foi quando assistiu ao segundo tempo da partida entre Grêmio e Corinthians, no último domingo (5), no intervalo para lanche da sessão do julgamento.
Em outros dias, o grupo pediu hamburguer, pizzas e também recebeu docinhos para complementar o lanche da tarde, em que normalmente são servidos sanduíches. Em dois momentos, os jurados almoçaram no Palácio da Justiça.
Também na semana passada, alguns jurados pediram equipamentos para se exercitarem, como halteres e colchonetes para fazer abdominais, além de baralho para jogar carta.