Com cinco viagens interrompidas nos últimos dias no RS, a Buser, conhecida como a "Uber dos ônibus", segue oferecendo transporte a passageiros no Estado. A empresa afirma que atua de forma legal e se propõe a atender pessoas que "querem viajar com empresas que oferecem viagens por fretamento".
No entanto, para o Departamento Autônomo de Estradas de Rodagem (Daer), que fiscaliza o fretamento de veículos em solo gaúcho, a forma como a atuação da empresa se dá é ilegal.
Abaixo, veja o que se sabe sobre a atuação da Buser no Estado:
Cinco ônibus a serviço da empresa foram recolhidos
Nos últimos dias, cinco ônibus a serviço da Buser foram recolhidos pelo Daer. Os passageiros que estavam nos coletivos foram encaminhados para seguirem viagens de outra maneira, e os veículos acabaram sendo guinchados e levados a depósitos do Departamento Estadual de Trânsito (Detran).
Os veículos apreendidos não pertencem à Buser, mas a transportadoras contratadas para operar as viagens comercializadas pela startup.
Algumas viagens da Buser foram canceladas nos últimos dias. A empresa não revela o motivo do cancelamento, mas informações extraoficiais dão conta de que isso ocorreu porque não havia veículos disponíveis para fazer os trajetos.
Daer afirma que fretamento oferecido é irregular
De acordo com o Daer, a forma como a Buser opera colide, em diversos pontos, com a legislação, o que torna o fretamento ilegal. O diretor de Transportes Rodoviários da entidade, Lauro Roberto Lindemann Hagemann, explica que um desses pontos inadequados se refere à comercialização de passagens.
— Não existe ilegalidade em a Buser contratar as empresas (que fazem transporte). A ilegalidade consiste em ela ofertar viagem mediante pagamento de passagem, ou até gratuidade de passagem (como nos casos de promoções que a empresa faz). Ela comercializa, mesmo que não cobre, o bilhete. E isso é uma prerrogativa das empresas de transporte regular. A ilegalidade se dá dessa forma. Aí se configura o ato irregular, onde a gente notifica, multa e apreende o veículo — alerta Hagemann.
Segundo o diretor, a atribuição de vender passagens é de rodoviárias. Quando uma empresa de transporte oferece um bilhete pela internet, por exemplo, a taxa a ser destinada para a rodoviária já está embutida no valor.
Assim, para se enquadrar nas regras, a Buser poderia agenciar as viagens mas não ofertar as passagens. Isso ocorrendo, a empresa transportadora ficaria responsável por fazer a lista de passageiros, teria os seus documentos validados pelo Daer e poderia executar o serviço.
— As rodoviárias precisam dessa comissão. Quando se deixa de cumprir as regras previstas, se cria uma prática desleal e predatória. No momento em que a rodoviária fechar, a cidade como um todo vai sofrer essa perda. Não temos como permitir que funcione assim, seria uma desmoralização máxima deixar que empresas cheguem e façam o que quiserem. É desrespeitoso tanto com as demais empresas que trabalham atendendo a toda a legislação vigente e com o passageiro, que pode acabar tendo a viagem interrompida — diz Hagemann.
Buser argumenta que operação é regular
A Buser descarta que realize qualquer operação irregular e afirma que apenas agencia as viagens, ao buscar o passageiro interessado em realizar as rotas oferecidas. Então, a plataforma contrata empresas que realizam o serviço de transporte. Conforme a Buser, esse sistema permite passagens 60% mais baratas do que o valor cobrado por empresas tradicionais.
"A Buser é uma plataforma de tecnologia que faz a intermediação entre grupos de viajantes e empresas de fretamento. Essas empresas são todas regulares, registradas em todos os órgãos reguladores, pagam todos os impostos e possuem todas as licenças necessárias para o serviço de fretamento. Além das normas de segurança estabelecidas por lei e pelos órgãos que regulam o transporte, a Buser ainda impõe uma série de exigências, como telemetria em todos os veículos. O usuário, no momento de comprar sua viagem por meio de um grupo de fretamento, é informado sobre qual empresa prestará o serviço e pode ter acesso a todas as licenças e documentos se achar necessário", disse a empresa em nota emitida nesta semana.
— Não tem nenhuma irregularidade. Nossos parceiros oferecem ônibus registrados na autoridade e cumprem todos os requisitos legais. Acontece que a inovação chega antes da regulação — justificou a diretora de Relações Governamentais da Buser, Juliana Natrielli, em entrevista à Rádio Gaúcha.
Decisão do TRF4 proibiu operação da Buser na Região Sul
Após decisões do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), a operação da Buser foi proibida nos três Estados da região sul do país. As ações foram julgadas em 2018 e 2019, de forma liminar, e valem para Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná.
A empresa ficou proibida de divulgar, comercializar e realizar atividades de transporte rodoviário interestadual de passageiros sem a prévia autorização da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) para a atividade. As decisões estabelecem ainda que a ANTT deve impedir a saída de veículos utilizados para toda e qualquer viagem irregular comercializada pela Buser e operada pelas empresas parceiras.
O relator dos casos no tribunal, desembargador Rogerio Favreto, destacou em seus votos que "o serviço ofertado pela Buser trata-se de modelo irregular de fretamento instaurado pela ré que, inegavelmente, cria um mercado de transporte interestadual paralelo àquele regulamentado pelo poder público, gerando um sistema de concorrência desleal àquelas empresas que atuam de forma regular e previamente autorizada".
O magistrado concluiu a manifestação observando que "tudo indica que a tendência seja a adequação da legislação em atendimento às inovações do mercado de transporte, seja para regular a modalidade de serviços alternativos, seja para coibir de forma mais expressa seus limites e conflitos com outras formas já existentes, como ocorrem em outras áreas conhecidas pelo uso e pela incorporação de novas tecnologias eletrônicas. Contudo, enquanto ausente disciplina legal específica, cabe aplicar a legislação vigente e obstar o exercício irregular da atividade atacada", finalizou.
Sobre a decisão, a Buser argumenta que ela é "exclusiva para viagens interestaduais" nos três Estados e que ingressou com recurso contra a decisão. "Vale ressaltar, no entanto, que as operações de fretamento colaborativo da Buser no Rio Grande do Sul são de viagens intermunicipais", afirma. Os processos seguem tramitando.