Ativistas de uma ONG de Porto Alegre, a S.O.S PUG, resgataram 49 cães da raça em uma casa no bairro Conceição, às margens da RS-122, em São Sebastião do Caí. O caso aconteceu na última sexta-feira (2) e gerou confusão, que foi parar na delegacia da Polícia Civil, já que a dona do espaço entende ter tido o imóvel invadido (confira a nota encaminhada pelos advogados ao final deste texto).
De acordo com esses ativistas, houve denúncias de moradores da região ao grupo sobre maus tratos dos animais no local, que funcionava como um criadouro para a venda.
Ao entrar, os voluntários afirmam que encontraram os cães em meio à fezes, urina e com sérias restrições de água e comida. O confinamento estava em espaços inadequados, com pouca capacidade de locomoção. O ambiente foi descrito como de "completa insalubridade".
De acordo com os voluntários, os cães foram examinados e há casos de pneumonia, anemia, tumores, desidratação e problemas oculares sérios. Também há uma cadela idosa e obesa em gestação. Alguns cães estão com suspeita de cinomose, que é uma doença viral altamente contagiosa que afeta os sistemas digestivo, respiratório e neurológico.
Inquérito
Ao todo, 17 voluntários entraram no local, incluindo alguns veterinários. Segundo um dos participantes, o grupo chegou cedo, por volta das 7h. Em um primeiro momento, eles foram impedidos pela dona e deixaram a casa. Após alguns instantes, alguns deles voltaram, arrombaram um cadeado e entraram.
O grupo S.O.S PUG afirma que avisou de antemão a Brigada Militar, que chegou no local após a confusão, e também o Ministério Público (MP). A promotoria confirma que foi avisada com antecedência e que estava "preparando a ação cautelar de busca e apreensão dos animais", mas soube posteriormente do resgate por meio de redes sociais. Por isso, de acordo com o MP, "o expediente para resgatar os animais não segue porque eles já não estão em perigo".
Segundo a Polícia Civil, após a invasão, a dona da casa e os voluntários foram parar na delegacia, já que a mulher entende que teve a residência invadida. A delegada Cleusa Spinato confirma que instaurou um inquérito policial para investigar o fato e que há indícios de maus-tratos:
— Está sendo apurado a crueldade contra os animais, mas vai ser investigado, também, tudo o que aconteceu. Ela (proprietária) está discutindo que a ONG entrou na casa sem mandado judicial. Recordo que há excepcionalidade em caso de flagrância e já adianto que há, sim, indícios de maus-tratos contra os cães.
Ainda de acordo com a delegada, só ao final do inquérito se terá o entendimento definitivo do procedimento e a responsabilização. O MP ainda lembrou que o expediente criminal deve ir pra Promotoria, caso seja enviado pela delegacia, momento em que a promotoria vai tratar da responsabilização criminal e garantir q os animais não retornem, caso sejam comprovados os maus-tratos.
Enquanto as autoridades apuram as responsabilidades, os cães seguirão sob tutela das pessoas que os resgataram.
Na quinta-feira (8), os advogados da dona do imóvel enviaram nota a GZH com sua versão sobre os fatos. Eles classificaram o ocorrido como "um roubo" e afirmaram que estão tomando medidas cabíveis na Justiça.
Confira a nota da defesa na íntegra:
"Patricia Andrade Gomes, dona do canil 3 Q Pugs, em São Sebastião do Caí, teve sua propriedade invadida, às 7 da manhã, por quase 20 pessoas. Sua propriedade foi depredada e todos seus cães da raça pug, roubados.
Foi uma ação ilegal e covarde. Seus cães jamais sofreram maus tratos. Dos 54 cães roubados, 6 estavam sendo tratados com medicação importada. Todas as imagens e vídeos veiculados são um recorte, e exclusivamente objetivando atribuir uma roupagem de legalidade, invocando a opinião pública, usando da causa animal para apoiarem esse desproporcional ato criminoso. À luz dos direitos que assistem à Patrícia, seria impossível de ocorrer, sem que houvesse a participação das autoridades competentes. Isso porque nem o Ministério Público, tampouco a delegacia especializada de combate a maus tratos visitou o local, que conta com um hectare de área, destinado à recreação dos animais.
Quanto às imagens e vídeos dos cães em tratamento, em nada justifica o roubo de 54, de forma unilateral pelos invasores e sem qualquer acompanhamento pelos agentes públicos. Os animais usam produtos importados e com nota fiscal, prescritos por médico veterinário a um tratamento alérgico, causado pela imperícia de uma ex-colaboradora do canil. Tudo será demonstrado ao judiciário e os autores deste desproporcional e desumano episódio será responsabilizados.
Não é aceitável que qualquer pessoa invoque a opinião pública, sob o pretexto de temas tão sensíveis para práticas criminosas, como ocorrido com Patrícia, cuja vida se transformou em um verdadeiro massacre coletivo, principalmente pelas redes sociais.
Os seus advogados, Éder Renato Martins Siqueira e Adelita Silveira estão tomando todas as medidas cabíveis. Não houve maus tratos, o que houve foi um roubo, muito bem arquitetado, cujo meio empregado é a calúnia coletiva de Patrícia. Todos serão responsabilizados."
Manifestação de criadores
O Kennel Clube do Rio Grande do Sul, entidade que representa os criadores, postou uma nota em suas redes sociais em que repudia a ação. Assinada por Pedro Armando Ramos Lang, presidente, o texto diz que a associação "repudia veementemente quaisquer formas de maus-tratos", mas também "condena a atitude arbitrária e violenta das pessoas que orquestraram e praticaram a ilegal invasão da propriedade privada".
"O Kennel Clube do Rio Grande do Sul repudia veementemente quaisquer formas de maus-tratos ou situações que impliquem em desconforto e danos à saúde dos animais.
No dia de ontem (02/10) a comunidade cionófila restou estarrecida com notícia amplamente divulgada nas redes sociais (inclusive pelo próprio protagonista) do arrombamento, invasão, destruição e retirada de cães da raça PUG, da residência de uma criadora na cidade de São Sebastião do Caí-RS.
O Kennel Clube do Rio Grande do Sul, condena a atitude arbitrária e violenta das pessoas que orquestraram e praticaram a ilegal invasão da propriedade privada em total afronta ao art. 5º, XI, da Constituição Federal, bem como o art. 150 do Código Penal, uma vez que adentraram ao domicílio, sem poder de polícia, sem autorização judicial, ou da proprietária ou detentora da residência, situação essa que não se respalda nas exceções legais, havendo portanto, o cometimento de crime que acarretam consequências penais.
Ninguém tem o direito de violar o domicílio sem autorização para tal.
O Kennel Clube do Rio Grande do Sul está atento às leis que tratam de situações que podem ser consideradas de maus-tratos aos cães, muito embora o tema remeta a diversas interpretações, porém, toda vez que houver comprovação de práticas inadequadas que afetem o bem estar e saúde dos cães, será implacável no sentido de punir associados. Todavia, para isso, formalidades tem que ser seguidas, como representações ao clube, ocorrências policiais, o devido processo legal, etc, mas jamais a utilização de violência, sem qualquer autorização ou mandado judicial.
Por fim, o Kennel Clube do Rio Grande do Sul, reitera que sempre atuará na defesa dos direitos de seus associados, quando estes demonstrarem a correção de suas práticas de criação e zelo pelos animais, assim como reiteramos nosso apego ao diálogo, à democracia e ao estado de direito, no sentido de construir uma cinofilia melhor para todos."