O sistema de transporte público foi apunhalado em cheio pela crise do coronavírus. Com o medo do contágio, quem pôde evitar os ônibus e trens esvaziou assentos e levou embora a renda das empresas.
O conjunto de empresas que opera as linhas que ligam Porto Alegre e as cidades da Região Metropolitana enfrenta um de seus piores momentos. Isso porque, do início do ano até julho, conforme dados da Associação dos Transportadores Intermunicipais Metropolitanos de Passageiros (ATM), o número de passageiros nos ônibus caiu mais do que a metade. Enquanto em janeiro foram transportados 6.604.871 de usuários, julho fechou com 3.034.487 – redução de 54% na demanda.
E esses números ainda indicam uma leve melhora na demanda. Os piores meses para o transporte metropolitano foram abril e maio, com 2,2 milhões e 2,9 milhões de passageiros transportados, respectivamente. Os dados representam o total de passageiros – pagantes, usuários do cartão TEU! e isentos – transportados por 11 empresas associadas à ATM, e que correspondem a 85% do transporte metropolitano.
Planos revistos
Essa queda de usuários afeta as empresas. E um dos principais pontos onde o passageiro pode notar isso ao longo dos anos é a renovação das frotas. Enquanto nos últimos anos algumas das operadoras vinham renovando seus ônibus, quem pretendia fazer isso neste ano ou nos próximos, precisou rever os planos.
Segundo a legislação estadual, os ônibus metropolitanos têm dois limites de vida útil. Os coletivos da modalidade comum podem rodar por até 16 anos. Já os que são executivos ou seletivos podem transportar usuários por 20 anos.
O Diário Gaúcho procurou as seis principais empresas de ônibus metropolitanas – Guaíba, Sogil, Soul, Transcal, Viamão e Vicasa. Apenas a Guaíba – que opera linhas entre Guaíba, Eldorado do Sul e Porto Alegre – não retornou. A Sogil informou seus dados de frota, mas não revelou a idade média dos coletivos, pois afirmou estar passando por uma renovação.
Entre as empresas que apresentaram os dados completos, a que está em melhor situação é a Viamão. Segundo os dados da companhia, a idade média dos 182 veículos comuns da frota é oito anos e um mês. Entre 2017 e 2020, a empresa comprou 76 veículos, como parte do seu plano de renovação.
Já entre os ônibus executivos, o posto de frota mais jovem ficou com a Transcal, de Cachoeirinha, que possui 39 carros executivos com idade média de pouco mais de oito anos. A Transcal iniciou a renovação em 2014. A última aquisição foi em dezembro passado, quando a companhia investiu R$ 3,5 milhões em seis veículos para a frota comum. Mas, com a pandemia, os planos futuros foram revistos.
Dúvidas sobre o futuro do transporte
A Transcal aponta “a queda brusca do número de passageiros transportados” como razão para uma parada nos investimentos. A Viamão tem argumento semelhante, alegando que “ainda é prematuro tratar do tema sem compreender quais serão os efeitos pós-pandemia na mobilidade urbana”.
A Soul, de Alvorada, reconhece a crise, mas é a única que afirmou ter planos de renovação para o próximo ano. Segundo a empresa, a ideia é adquirir 30 veículos em 2021.
O temor das empresas é que os patamares de uso não voltem mais ao “antigo normal”. Em nota, a ATM aponta que “as pessoas, ao longo desse tempo de pandemia, descobriram maneiras novas de viver, com menor dependência da mobilidade pública, independentemente do modal”. Por isso, na visão da entidade, o futuro do setor depende de respostas que ainda não são possíveis de serem obtidas. Como, por exemplo, entender qual será o “novo normal” da quantidade de passageiros transportados, a eterna busca pelo equilíbrio econômico para o setor, e a incerteza sobre a capacidade dos passageiros custearem o sistema sozinhos, só com a passagem, sem outras rendas que auxiliem o setor.
Vicasa tem frota mais antiga
A Vicasa, de Canoas, tem o conjunto de coletivos mais antigo. Segundo a empresa, a pandemia já reduziu a operação. Atualmente, são apenas 48 ônibus fazendo a ligação entre a Capital e o município – sendo apenas dois na modalidade executiva. É um número pequeno se comparado às outras empresas. A Transcal, por exemplo, que tem menor frota comum depois da Vicasa, conta com 89 carros.
E quando se trata da idade média, os carros também não vão bem. Mesmo dentro dos patamares exigidos pela Metroplan, órgão estadual que fiscaliza o transporte metropolitano, os carros estão acima da média de outras empresas. A frota comum, por exemplo, apresenta uma idade média de 13 anos e meio. Entre os dois executivos, 17 anos.
Sem prazo
Segundo a Vicasa, na frota comum, 12 carros vão completar 16 anos em dezembro de 2021. Ou seja, precisarão obrigatoriamente ser substituídos. A empresa diz que já havia elaborado um plano de ação para renovação da frota a partir do terceiro trimestre deste ano. Porém, com a crise, “não houve viabilidade financeira, nesse momento, para dar continuidade a esse plano de ação”. A Vicasa ainda não sabe quando terá ônibus novos, mas afirma que “assim que houver a retomada da normalidade na demanda, a empresa irá rever e dar continuidade ao plano de renovação da frota”.