Os oito funcionários da Vale presos nesta sexta-feira (15) por envolvimento na tragédia de Brumadinho possuem "fundadas razões de autoria ou participação" na prática de centenas de crimes de homicídio qualificado, considerado hediondo.
As palavras são do juiz Rodrigo Heleno Chaves, da 2ª Vara Cível, Criminal e de Execuções Penais da Comarca de Brumadinho (MG), no despacho em que ordena a prisão temporária das oito pessoas por 30 dias, que podem ser renovados por mais 30. O magistrado salienta que, "...aparentemente, no primeiro semestre de 2018, os funcionários da Vale ora representados tinham conhecimento da situação precária da barragem".
Os presos são o gerente-executivo operacional, Joaquim Pedro de Toledo, os integrantes da gerência de geotecnia Renzo Albieri Guimarães Carvalho, Cristina Heloiza da Silva Malheiros e Artur Bastos Ribeiro, o gerente-executivo de geotecnia corporativa, Alexandre de Paula Campanha, e os funcionários do setor de gestão de riscos geométricos Marilene Christina Oliveira Lopes de Assis Araújo, Hélio Márcio Lopes da Cerqueira e Felipe Figueiredo Rocha. Eles foram detidos de manhã em Belo Horizonte e Itabira (na Região Central de Minas) e Rio de Janeiro. Foram ainda executados 14 mandados de busca e apreensão.
O juiz usou a expressão "tsunami de lama" ao descrever os fatos que levaram à tragédia em Brumadinho, no dia 25 de janeiro. Até o momento, o rompimento de uma represa da Vale nessa localidade deixou 166 mortos e 147 desaparecidos. Ao todo, são 14 mandados de busca e apreensão e oito de prisão.
Pesou na decisão do magistrado a descoberta de e-mails trocados por funcionários da Vale e da consultoria alemã Tüv Süd, nos quais fica claro que a empresa de mineração já sabia de problemas com sensores da barragem, dois dias antes do rompimento da represa.
O juiz considera que, diante de todas as anomalias verificadas na barragem B1 (Mina Córrego do Feijão) desde meados de 2018, aliadas à alteração drástica nos piezômetros (equipamento que mede pressão de líquidos represados) verificada em janeiro de 2019, aparentemente não havia outra alternativa aos funcionários da Vale senão a de acionar o PAEBM (Plano de Ação de Emergência para Barragens), com imediata evacuação da área.
Rodrigo Heleno Chaves ressalta que os autos apontam que qualquer um dos oito funcionários da Vale preso, pela posição que ocupavam na época do acidente e sabedores da situação crítica da barragem desde meados de 2018, "...deveriam obviamente ter agido de maneira preventiva e acionado o PAEBM, o que evitaria que centenas de vidas fossem ceifadas." O juiz reclama que nenhuma medida eficaz foi tomada, situação que permaneceu sem solução até o dia anterior ao rompimento da represa.
O juiz cogita de que tenha havido dolo eventual dos oito funcionários da Vale - quando, mesmo sabedor de riscos, alguém decide que continuará a tomar uma atitude prejudicial.
"...é possível que os oito funcionários, mesmo não querendo diretamente que o resultado ocorresse, tenham assumido o risco de produzi-lo, pois já o haviam previsto e aceitado as suas consequências", conclui o despacho.
Confira a íntegra da decisão sobre as prisões no caso Brumadinho: