Três anos após o atropelamento que provocou a morte do jornalista Róger Bittencourt, em Florianópolis (SC), o caso chegou a um desfecho na Justiça: o motorista Gustavo Raupp Schardosim, de 42 anos, foi condenado pelo crime de homicídio, com dolo eventual e recebeu pena de sete anos de prisão em regime semiaberto.
A sessão de julgamento ocorreu nesta quinta-feira (7), no Tribunal do Júri de Florianópolis. Schardosim poderá recorrer contra a sentença em liberdade.
O motorista já cumpriu um ano e quatro meses de prisão em caráter preventivo. Por isso, os cinco anos e oito meses que faltam da pena podem ser cumpridos em regime semiaberto. No entanto, como cabe recurso da decisão, a pena pode ser alterada.
De acordo com o Tribunal de Justiça de Santa Catarina, o motorista também foi condenado pela tentativa de homicídio de outra vítima, que estava com Róger Bittencourt no dia do acidente. Por esse crime, ele deveria pegar outros três anos de prisão. Entretanto, por serem casos que aconteceram em apenas um momento, o juiz levou em conta apenas a maior condenação - o homicídio.
O motorista terá ainda de pagar uma multa de R$ 50 mil à família do jornalista. O dinheiro deverá ser dividido em partes iguais entre a viúva de Roger Bittencourt e a filha do casal.
O julgamento
Durante o interrogatório, o motorista disse não ter certeza sobre o momento do acidente. Ele atingiu a bicicleta de Bittencourt, que pedalava com um grupo de treino na SC-401, em dezembro de 2015.
Schardosim disse que, na noite anterior ao crime, tomou uma cerveja na casa de um amigo, fumou meio cigarro de maconha e ainda bebeu entre quatro e cinco cervejas longneck em uma casa noturna.
Ele teria passado a noite na casa de uma mulher que conheceu na festa. Pela manhã, ele disse ter chamado um táxi para voltar à casa do amigo, onde havia deixado o carro. O acidente na SC-401 ocorreu na sequência, quando assumiu a direção. Schardosim disse ter lembrança apenas de acordar com o barulho da colisão.
—Estava bem para dirigir. Não entendo o que aconteceu. Acredito que só dormi ao volante — falou.
O motorista negou que estivesse dirigindo de maneira desorientada antes da batida. Também afirmou que não tentou fugir após o atropelamento, mas que foi hostilizado e agredido por pessoas no local.
Perguntado sobre um antigo acidente, confirmou que chegou a ser preso e processado em 2010, quando foi flagrado embriagado após uma colisão com outro carro na BR-101. Ele ainda reconheceu que, naquele caso, tentou esconder algumas latinhas de cerveja dos patrulheiros. O processo daquele acidente, disse Schardosim, foi extinto com uma proposta de suspensão condicional.
Em sua última manifestação no júri, o réu disse ter consciência do estrago provocado e que está arrependido.
— Sempre me mostrei arrependido. Sei que destruí uma família. De certa forma, eu destruí minha família também — afirmou.
O motorista chegou a ficar preso por um ano e quatro meses no complexo prisional da Agronômica, em Florianópolis, mas um recurso o colocou em liberdade em abril de 2017.
Mobilização de familiares
Familiares e amigos de Róger Bittencourt fizeram uma grande mobilização para acompanhar o julgamento do motorista durante toda quinta-feira. Em homenagem à memória do jornalista, o grupo vestia camisetas estampadas com as frases "a corrida continua" e "corremos por você, Róger".
Uma faixa também foi estendida na escadaria de acesso ao Tribunal do Júri, com a frase "Não vai trazer o Róger de volta, mas a Justiça precisa ser feita".
Desde o início do julgamento, a expectativa das pessoas que conviveram com Róger era de que o júri confirmasse a tese de embriaguez anunciada pela acusação.
Para a viúva de Róger, a também jornalista Karin Verzbickas, o caso julgado nesta quinta-feira simbolicamente representa outras mortes provocadas no trânsito que deveriam ser tratadas como crime ao invés de de acidente.
— Estamos vivendo uma questão que transcende o caso do Róger. Chegou no ponto em que estamos discutindo se a sociedade vai continuar tolerando crimes desse tipo, violentos, e que permaneçam no silêncio. Ou se a sociedade vai, enfim, dar uma resposta à altura e dizer que não se tolera mais álcool e direção. E se beber, dirigir e matar vai preso, sim. Não é crime de trânsito, é homicídio — defendeu Karin.
Um dos momentos de maior comoção dos amigos e familiares de Róger ocorreu durante o depoimento de um dos companheiros de pedalada dele, que estava junto na hora do acidente.
Emocionado, ele lembrou que o estado do amigo já era crítico quando tentou socorrê-lo no asfalto, tamanha a violência do impacto. Também mencionou que outro ciclista atingido pela Parati nunca mais praticou o esporte ou participou das atividades do grupo.
Policiais militares atestam embriaguez
Dois policiais militares acionados na ocorrência do atropelamento narraram em juízo que, embora Schardosim tenha recusado o teste do bafômetro, ele apresentava sinais de embriaguez aparentes, como vermelhidão nos olhos, sonolência e hálito etílico.
Ambos disseram que era possível perceber o cheiro de álcool dentro do carro quando o acusado foi levado para a viatura.
Motoristas que passavam pela SC-401 no momento do acidente também prestaram depoimento no Tribunal do Júri. Um deles, que dirigia uma van com turistas, afirmou ter visto a Parati de Schardosim andar em ziguezague antes de invadir a ciclovia e provocar o acidente. Esse mesmo motorista contou em juízo que o réu teria tentado fugir após a colisão.
Outro condutor ouvido no júri, um argentino que mora há 40 anos em Florianópolis, disse que chegou a trancar a passagem da Parati para evitar uma fuga.