Ricardo Eugênio Boechat era um dos mais influentes jornalistas do país. Todas as manhãs, abria a programação noticiosa da Band News FM com um editorial pungente, traduzindo para os ouvintes o significado das manchetes dos jornais e a atuação dos principais personagens do poder. À noite, apresentava o Jornal da Band com mais sobriedade, mas sempre fazendo questão de deixar sua marca pessoal na narração de cada notícia. Aos 66 anos, estava no auge de uma carreira multipremiada, apresentando os programas de maior audiência na rede Bandeirantes, assinando coluna na revista IstoÉ e ministrando palestras Brasil afora.
Filho de um diplomata brasileiro, Boechat nasceu em Buenos Aires em 13 de julho de 1952. Começou no jornalismo nos anos 1970, no extinto jornal Diário de Notícias, no Rio. Logo passou a auxiliar o célebre colunista social Ibrahim Sued, com quem trabalhou por quatro anos coletando informações para as notas mais picantes da imprensa nacional.
Em 1983, foi contratado pelo O Globo, onde passou a assinar a Coluna do Swann, com notas sobre política, economia e sobre as altas rodas da sociedade fluminense. As informações exclusivas e o estilo único na redação das notícias logo o transformaram num cronista dos textos curtos e das frases certeiras. Admirado pelos leitores, não tardou a batizar a coluna com o próprio nome. Com o prestígio em alta, passou também a fazer comentários na TV Globo, no programa matinal Bom Dia Brasil.
Em 1987, deixou o jornalismo para uma breve experiência como secretário de Comunicação Social do governo do Rio, convidado pelo então governador Moreira Franco. Permaneceu apenas seis meses no cargo. De volta às redações, passou pelo Jornal do Brasil e pelo O Estado de S. Paulo antes de um retorno à Globo. Venceu três vezes o Prêmio Esso, o mais importante do jornalismo brasileiro.
Em 2001, envolveu-se em um episódio controverso ao ser grampeado antecipando para uma fonte o teor de uma reportagem que publicaria no jornal no dia seguinte sobre disputas pelo controle acionário de empresas de telefonia. Demitido, voltou ao Jornal do Brasil e passou pelo SBT até migrar para a Band.
Na empresa, Boechat voltaria ao panteão dos mais admirados jornalistas do país. No comando do principal programa jornalístico da Band News, esbanjava carisma com os ouvintes e era implacável com as autoridades. O mesmo apresentador que fornecia o próprio número do telefone celular - e atendia as ligações - não poupava críticas a deputados, ministros, governadores, presidentes, seja quem fosse, colecionando inimigos em todas as esferas do poder.
Mas logo após concluir seus caudalosos e temidos editoriais, comentava com bom humor os mais prosaicos acontecimentos domésticos, como o fato de ter colocado uma meia de cada pé após mais uma vez ter dormido demais e se atrasado para apresentar o programa. Tamanha espontaneidade com que tratava em público a vida particular fez da mulher, a quem chamava de "minha doce Veruska", e da mãe, "Dona Mercedes", pessoas íntimas dos ouvintes, de tantas vezes que eram citadas no ar. Além de Veruska, Boechat deixa seis filhos: Paula, Bia, Rafael, Patrícia, e as pequenas Valentina e Catarina, as duas caçulas também onipresentes nas conversas radiofônicas.
A repentina perda do jornalista fez a Band News suspender a programação no meio da tarde. Às 15h, a rádio retomou sua programação normal, "em respeito à memória do próprio Boechat. Temos a obrigação, emocional e jornalística, de reportar o falecimento do nosso amigo", explicou a emissora via Twitter. Neste sinistro começo de 2019, em que uma sucessão de tragédias leva ao noticiário um permanente sentimento de dor e luto, a morte de Ricardo Boechat é um desafio a mais a quem faz da vida a missão cotidiana de bem informar. Que seu carisma e rigor sirvam de inspiração.