Castigado pela estiagem, Piratini é um dos municípios gaúchos que enfrentam muitas dificuldades com a falta de chuva. Pelo menos 150 famílias precisam de água para beber porque não tem abastecimento canalizado. A prefeitura só conseguiu levar à metade delas até agora. Só há um caminhão-pipa para os 21 mil habitantes. Hulha Negra, por exemplo, tem um terço dos moradores e está atuando com dois caminhões para atender quase o dobro de famílias afetadas.
O secretário de Desenvolvimento Rural de Piratini, Jovan Itamar de Lima, admite que o problema é bem maior do que a capacidade do município e que já pediu ajuda ao Exército de Bagé e aos bombeiros de Pelotas – que é a corporação mais próxima e fica a 100 quilômetros de distância. Ambos os órgãos teriam informado não ter disponibilidade. A solução provisória tem sido abrir poços artesianos — já foram mais de 40 até agora.
— O problema é que todo mundo só se preocupa com a seca quando ela já chegou. Agora, estamos correndo atrás da máquina — disse Lima.
Máquina é algo que também falta em Piratini. O secretário conta que há só uma retroescavadeira e na terça-feira ela quebrou. A expectativa é que o conserto seja rápido, pois ela é necessária para abrir açudes e outros reservatórios de água.
Faz apenas uma semana que a prefeitura decretou situação de emergência e o pedido ainda está em análise pela Defesa Civil. Por isso, nenhuma ajuda estadual ou federal chegou. Diante da falta de suporte, apesar de serem responsáveis pelo sustento financeiro do município, os produtores rurais se viram como podem.
Wilson Fernando Jacondino, de 59 anos, emprestou um trator com reservatório acoplado para vizinhos com menos condições buscarem água para beber. Enquanto isso, o pecuarista faz o possível para manter suas 400 cabeças de gado vivas na localidade de Capela.
— Parece o Nordeste. Sabe quando a gente vê na TV as pessoas levantando o boi pela cola, porque ele não consegue levantar, e levando ele até um tanque para dar de beber? Isso que estou fazendo aqui — conta Jacondino.
De cima do cavalo, Íris Govea Brede, de 74 anos, gerencia uma propriedade de 118 hectares, sendo metade dela composta de pastagem — ou o que restou dela. A produtora, que cuida das vacas leiteiras e de ovelhas "como se fossem gente", chora a perda de três terneiros e quatro ovelhas desde que a estiagem deu as caras, em novembro passado.
— Estamos gastando agora os recursinhos que estávamos guardando para o inverno para comprar milho e dar comida aos animais. Quando o inverno chegar, temos medo de que eles não vão aguentar de tão fracos — lamenta Íris, pois no verão, quando deveria estar ganhando peso, o rebanho está é secando como o solo.
Chefe da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater-RS) no município, Marina Sinott explica que o prejuízo está muito além do que os produtores imaginam. Segundo ela, a falta de comida pode causar stress nutricional, o que impede que as ovelhas de darem cria.
— A estiagem agora pode demorar anos para ser recuperada no campo — afirma a médica veterinária.
As garoas que caíram na última semana mascararam o problema em Piratini: esverdearam as plantas por cima, escondendo caules e sementes mortos. É o caso da soja. Principal fonte de receita do Estado, o grão dourado virou verde por falta de água.
Dói olhar para a lavoura
PEDRO CERETTA
Produtor rural
Pedro Ceretta, 60 anos, que administra junto de três irmãos 520 hectares de soja na localidade de Passo dos Carretas, distante 70 quilômetros do centro de Piratini, chegou ao ponto de calcular o que vai sobrar.
— Só vamos salvar 30% dos grãos. Dói olhar para a lavoura — suspira, acrescentando que na "melhor" das áreas, que foi plantada mais tarde e por isso sofreu menos com a estiagem, no máximo será colhido 60%.
A estimativa é de que cada hectare renda R$ 1,4 mil, sendo que o custo deles foi de R$ 2,8 mil.
— Essa é safra de passar, não de lucrar — sintetiza o produtor.
Por coincidência, a série de reportagens de GaúchaZH "Diário da Estiagem" tem encontrado chuva por onde passa. Primeiro foi Bagé, depois Hulha Negra e, agora, Piratini. Nesta quarta-feira (21), o tempo se armou, as nuvens escureceram e o vento veio. Mera promessa do horizonte. Na propriedade dos Ceretta, o pluviômetro caseiro marcou 6 mm — estima-se que sejam necessários mais de 200 mm de chuva para fazer efeito sobre a terra seca.
Em busca de ajuda
Prefeitos e coordenadores da Defesa Civil dos municípios mais atingidos pela estiagem têm reunião com representantes do governo estadual nesta quinta-feira (22), às 14h, no Sindicato Rural de São Lourenço do Sul. Até o momento, nove municípios já tiveram os decretos de situação de emergência homologados pelo Estado.