Banhado em mais de 40 quilômetros de seu território pela Lagoa dos Patos — a maior laguna da América do Sul —, São Lourenço do Sul ainda assim sofre com a estiagem que assola o sul do Estado. A água do manancial doce só chega nas maiores lavouras de arroz, localizadas na costa da cidade conhecida como "Pérola da Lagoa". Em propriedades de agricultores familiares, como a de Leomar Bork, de 58 anos, a cerca de 30 quilômetros da laguna, na localidade de Boa Vista, é preciso contar com arroios e poços artesianos. No entanto, a água não chega até as lavouras devido ao alto custo de um sistema de irrigação.
— O milho é o que mais tem sofrido. A soja, com as pancadas de chuva recentes, deu uma recuperada, mas as espigas têm perda total porque elas já cresceram antes do tempo e estão sem grãos ou então nem nasceram — conta o agricultor, que tem área de 29 hectares.
Como o milho é peça-chave para toda a propriedade, o prejuízo com essa cultura vai além da lavoura.
— Ele é usado como alimento de todos os animais e o excedente é vendido para empresas de ração animal. Com isso, a quebra na safra de milho vai refletir no gado de corte e o preço da carne, principalmente aves e suínos, vai subir no supermercado — explica o engenheiro agrônomo da Emater, Paulo Wetzel.
Coordenador municipal da Defesa Civil, Valdoir Ribeiro diz que o custo seria muito alto para levar água da lagoa à zona rural:
— Tem propriedades que ficam mais de 500 metros acima do nível da lagoa. Os recursos seriam inviáveis, para não dizer que é geograficamente impossível levar água até lá.
Na área urbana do município, não há problema e os moradores têm água tratada nas torneiras, oriunda do Rio São Lourenço. Já na zona rural, a rede de abastecimento não chega e, com cacimbas, poços e aludes secando, muitas famílias dependem de auxílio público.
A prefeitura não tem caminhão-pipa próprio. Com o decreto de situação emergência, tem se virado com o empréstimo de dois viniliq pipas (tanques móveis com capacidade de 4 mil litros cada) para abastecer quase 100 famílias com água doada pela Corsan. A necessidade, no entanto, é muito maior, admite o coordenador municipal da Defesa Civil:
— A gente faz o possível e entrega onde dá. Mas não vamos usar caminhões que transportam líquidos, como de leite, para evitar uma contaminação social.
Joel da Silva Ferreira, de 46 anos, e Giane Pinto Ferreira, 44, moram em uma das quatro comunidades quilombolas de São Lourenço do Sul. Como as duas cacimbas secaram, eles têm contado com abastecimento de um caminhão de uma cooperativa.
— É só para a gente beber e usar nas coisas de casa. Estamos lavando menos roupa e água usada no tanque serve para plantas e lavar o chão — conta Giane.
Com isso, a horta que mantinha para subsistência padeceu. Com a chuva de quarta-feira (21), estimada em 18 milímetros pela Emater, as cacimbas até coletaram um pouco de água, mas está suja e imprópria para consumo.
— Secou tudinho. Tomate, alface, couve e repolho. Parece um matagal de palha — lamenta a dona de casa, que aumentou os custos por ter de comprar mais alimentos.
Na comunidade quilombola Coxilha Negra, moram os Ferreira e mais 27 famílias. Todas, juntas, somam apenas 14 hectares — área muito pequena para manter lavouras. Por isso, a expectativa de Joel é conseguir recursos públicos e aumentar o pequeno açude que tem, dando condições de montar um aviário na porção de terra que herdou do pai.
— É meu sonho, meu plano de vida. Mas preciso de água, e para ter água, preciso de ajuda — diz o servidor público.
Esperança de ajuda
São Lourenço do Sul será sede, na tarde desta quinta-feira (22), de uma reunião entre prefeitos e coordenadores da Defesa Civil dos municípios mais atingidos pela estiagem. Até o momento, 26 municípios já decretaram situação de emergência, sendo que nove tiveram os decretos homologados pelo Estado e cinco foram reconhecidos pela União.
Veja a lista:
- Cristal*
- Amaral Ferrador*
- Hulha Negra*
- Morro Redondo*
- Pedras Altas*
- Canguçu*
- Cerro Grande do Sul*
- Arroio do Padre*
- São Jerônimo*
- Bagé
- Candiota
- Aceguá
- Turuçu
- Camaquã
- Cerrito
- Dom Feliciano
- Chuvisca
- São Lourenço do Sul
- Piratini
- Pinheiro Machado
- Santana da Boa Vista
- Jaguarão
- Pedro Osório
- Herval
- Encruzilhada do Sul
- Pelotas
*Decreto homologado pelo Estado
*Com reconhecimento pela União