A Associação dos Delegados de Polícia do Estado de Santa Catarina (Adepol) divulgou nesta terça-feira uma nota sobre o atendimento prestado pela delegada Daniela Elisa de Souza Bruce a uma vítima de tentativa de estupro em Balneário Camboriú. A entidade caracteriza como inverídica e leviana a declaração de que Daniela teria constrangido a vítima. Também sustentou a decisão de tipificar a denúncia como invasão a domicílio.
"A alegação por parte da Polícia Militar de que a Delegada Daniela gritou com a vítima, constrangendo-a, é totalmente inverídica e leviana. O próprio filho da vítima asseverou em entrevista que foi muito bem tratado na delegacia", escreveu a Adepol em nota, fazendo referência à reportagem do jornal Diarinho, que entrevistou o parente da vítima.
Em referência à decisão da delegada de tipificar a denúncia com invasão a domicílio, a diretoria da Adepol escreve: "O Delegado de Polícia é o primeiro “juiz” da causa, pois a ele incumbe avaliar juridicamente o caso concreto, verificando se houve ou não crime. Não cabe a Polícia Militar, órgão legalmente responsável pelo patrulhamento ostensivo, insurgir-se contra a posição jurídica de um Delegado de Polícia ou de qualquer outra carreira jurídica." (Leia a nota na íntegra abaixo.)
A diretoria da Adepol é liderada pelo presidente Ulisses Gabriel, primeiro vice Artur José Régis Neto e segundo vice Rodrigo Falck Bortolini.
Entenda a polêmica
O caso aconteceu na madrugada de segunda-feira, no bairro Vila Real. O suspeito, um homem de 34 anos que tem passagens pela polícia, foi encontrado no quarto da vítima por volta das 2h. No relatório da Polícia Militar (PM), a mulher disse que acordou com o homem "tocando em suas partes íntimas e com as calças já baixadas na altura dos joelhos". Após os gritos de socorro, o filho dela, que dormia no quarto ao lado, deteve o homem até a chegada dos policiais.
De acordo com o relatório do caso, registrado pela PM, no momento em que os policiais acompanhavam os procedimentos para o registro do boletim de ocorrência na Delegacia da Comarca, a delegada Daniela gritou com a vítima. O boletim diz que ela descaracterizou o crime contra a dignidade sexual questionando "Quem mandou dormir com a porta aberta. Pensas que mora na Suíça?"
Por telefone na noite desta segunda-feira, a delegada Daniela Elisa de Souza Bruce afirmou que não constrangeu a vítima durante o atendimento na delegacia. Daniela explicou que apenas orientou a mulher que não deixasse a porta aberta. Já sobre o registro como invasão de domicílio, e não tentativa de estupro, a delegada foi categórica ao afirmar que não houve tentativa de estupro.
– O crime de estupro para que ele exista, o agente deve utilizar violência ou grave ameaça, nesse caso, o que ocorreu – disse à reportagem do Diário Catarinense.
Leia a nota da Adepol na íntegra:
A Associação dos Delegados de Polícia do Estado de Santa Catarina (ADEPOL/SC) vem a público esclarecer os fatos relacionados ao atendimento prestado pela Delegada de Polícia da Comarca de Balneário Camboriú, Exma. Sra. Dra. Daniela Elisa de Souza Bruce, no caso apresentado pela Polícia Militar como crime de tentativa de estupro.
Em síntese, na madrugada do dia 03/04/2017, segundo o apurado, um homem entrou em uma casa e deitou-se na cama ao lado da mulher que ali reside, supostamente tocando em suas partes íntimas. Imediatamente a mulher passou a gritar e o homem foi detido pelo filho da vítima. Conduzido a delegacia de polícia pela Polícia Militar a Delegada plantonista, Dra. Daniela, após ouvir os envolvidos, entendeu que a conduta em questão melhor se enquadrava no crime de invasão de domicílio.
Infelizmente, o caso em tela foi apresentado para imprensa, pela Polícia Militar, de forma deturpada, enfatizando a inverídica afirmação de que a referida Delegada teria bradado para a vítima: “Quem mandou dormir de porta aberta? Pensas que moras na Suiça?” Nesse passo, imperioso o esclarecido de dois pontos:
1) A alegação por parte da Polícia Militar de que a Delegada Daniela gritou com a vítima, constrangendo-a, é totalmente inverídica e leviana. O próprio filho da vítima asseverou em entrevista que foi muito bem tratado na delegacia. No ponto, vale destacar que afirmações como essas somente prejudicam o relacionamento entre as instituições policiais, acirrando os ânimos dos policiais e em nada contribuindo para aplicação da lei.Enquanto houver instituições digladiando por poder, a população e a segurança pública estarão sendo prejudicas.
2) O Delegado de Polícia é o primeiro “juiz” da causa, pois a ele incumbe avaliar juridicamente o caso concreto, verificando se houve ou não crime. Não cabe a Polícia Militar, órgão legalmente responsável pelo patrulhamento ostensivo, insurgir-se contra a posição jurídica de um Delegado de Polícia ou de qualquer outra carreira jurídica. Será que o policial militar questionaria a absolvição proferida pelo juiz ou a não oferecimento da denúncia pelo Ministério Público? A Polícia Militar deveria se preocupar e depositar seus esforços no trabalho de prevenção do crime. Possivelmente, se a Polícia Militar estivesse cumprindo seu papel constitucional, qual seja, a prevenção de crimes, aquele homem não teria invadido a casa da vítima, mas essa é uma outra questão, já que acreditamos que as instituições tem que trabalhar unidas em prol do bem comum, em uma sociedade onde o poder/dever de atuação do Delegado de Polícia não seja pautado apenas no entendimento da Polícia Militar sobre o certo e o errado, pois não pode a Polícia Civil obrigar que o Ministério Público ofereça ou não denúncia, ou mesmo não pode o Ministério Público obrigar que o Juiz condene ou absolva, pois cada um deve exercer suas respectivas funções.
Dessa forma, ressaltamos que a missão do Delegado de Polícia é garantir a aplicação da lei de forma imparcial e técnica, mesmo diante de pressões populistas. Certamente, muito mais fácil seria simplesmente prender, mesmo que um possível inocente. Entretanto, a postura autoritária não representa a função do Delegado de Polícia em um Estado Democrático de Direito.
A DIRETORIA