Nem simples, nem composto. Na sessão em que deveria decidir quem está com a razão na discussão sobre o cálculos dos juros da dívida pública, o Supremo Tribunal Federal (STF)surpreendeu ao decidir suspender por 60 dias o julgamento do mandado de segurança apresentado pelo governo de Santa Catarina e tentar promover nesse período um entendimento entre os Estados e a União em nome de uma renegociação política da questão.
A busca pela solução negociada foi construída pelo ministro Luis Roberto Barroso, que vinha criticando a judicialização da questão da dívida com os Estados. O adiamento foi aceito pelo procurador-geral do Estado, João dos Passos Martins Neto, que defendeu a tese catarinense na tribuna junto com os procuradores do Rio Grande do Sul, Euzébio Ruschel, e de Minas Gerais, Onofre Alvez Batista Junior.
A trégua veio no momento em que a ação de Santa Catarina sofria um duro golpe: o relator do caso, Luiz Fachin, surpreendeu em seu voto ao ignorar a discussão sobre o uso de juros simples ou compostos no recálculo das dívidas.
Em vez disso, Fachin apontou inconstitucionalidade em uma das leis aprovadas pelo Congresso Nacional para renegociar as débitos – em 2015, os parlamentares alteraram a legislação criada no ano anterior para promover a mudança nos índices de correção dos débitos. Na mudança, o governo federal passou a ser obrigado a conceder os descontos, em vez de apenas autorizado.
No avaliação do relator, a alteração gerou renúncia de receita e por isso a proposta deveria ter sido enviada ao Congresso pelo governo federal. Assim que o voto foi dado, Barroso pediu a palavra para apresentar a sugestão de suspender o julgamento em nomes de uma nova rodada de discussão entre União e Estados, ressaltando a existência de um projeto no Congresso para alongar as dívidas.
Enquanto Fachin lia seu voto, Barroso conversava com outros ministros fora do plenário, assim como a advogada Grace Fernandes, representante da União, e os procuradores estaduais.
– Corremos o risco de dizer aos governadores que eles têm que pagar a União e eles responderem 'os aposentados vão morrer de fome' – chegou a dizer Barroso.
Após a aprovação unânime da concessão do novo prazo, os ministros iniciaram uma longa discussão sobre a manutenção da liminar que permite aos Estados pagarem as parcelas da dívida com a União com base nos cálculos com juros simples. O ministro Marco Aurélio Mello liderou a argumentação pela revogação da decisão dada a Santa Catarina e depois conquistada por outros nove Estados.
Alegou que a liminar abriu brecha para que os Estados deixassem de pagar as parcelas. Coube mais uma vez a Barroso apresentar a proposta que conquistou a maioria: manter as liminares para, nas palavras dos ministro, "dar um refresco" nas contas dos governos nesses dois meses e permitir que os Estados chegassem com mais força na mesa de negociações.
Durante esse debate, Barroso, Marco Aurélio e Gilmar Mendes defenderam o uso de juro composto no recálculo das dívidas, alegando que esse é o procedimento de mercado e que a União sofre com eles ao captar recursos. Os demais ministros não se manifestaram sobre a tese catarinense, embora o presidente do STF, Ricardo Lewandowski, tenha dito que a questão continuava aberta.
A posição fez o secretário estadual Antonio Gavazzoni (PSD), da Fazenda, deixar o plenário ainda com esperança de emplacar a tese catarinense.
– Começamos perdendo, depois viramos. Hoje a tese perdeu bastante força, a União saiu fortalecida. O final do julgamento reacendeu a chama. O jogo não está terminado – disse Gavazzoni.
*Colaborou Victor Pereira