Fora do terreno sobre o qual ainda tem domínio suficiente para adiar à exaustão o processo de cassação do mandato, o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), enfrenta nesta quarta-feira um dia decisivo diante dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). O principal item a ser examinado pela Corte na sessão desta tarde será o aceite ou não à denúncia movida pela Procuradoria-Geral da República (PGR) contra o peemedebista por corrupção e lavagem de dinheiro. Apesar de tentar minimizar o impacto da decisão do STF ao declarar que não pretende deixar o cargo se a acusação for acolhida, Cunha pode passar a carregar a pecha de réu, o que deixará cada vez mais ameaçado o futuro do polêmico político fluminense.
O julgamento desta quarta-feira não envolve o mérito da acusação. Os ministros vão apenas avaliar se há indícios suficientes para a abertura de ação penal contra o deputado. A partir do momento em que o Supremo se posicionar, começará a fase de instrução processual, com prazos para depoimentos, apresentação de provas e defesa. Na semana passada, o peemedebista invocou o princípio da presunção de inocência para descartar chances de renunciar.
- Já aconteceu comigo de ter sido declarado réu e, depois, absolvido - lembrou Cunha.
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Apesar da relutância do parlamentar em reconhecer as dificuldades que enfrenta - após perder o controle sobre o processo de impeachment, viu o candidato que apoiava ser derrotado na eleição para a liderança do PMDB na Casa -, o aceite da Corte à denúncia da PGR pode abrir caminho para o seu afastamento, que é objeto de outra ação no Supremo. Nesse caso, o processo está na fase em que o deputado apresenta a defesa e não tem data para entrar em pauta no plenário. Na opinião de especialistas políticos e de líderes partidários, o Supremo reforçaria, com o peemedebista na condição de réu por corrupção e lavagem de dinheiro, uma tendência de acatar a ação do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, pedindo a saída de Cunha do cargo. Em dezembro, Janot fez a solicitação sob a acusação de que o parlamentar se utilizava da presidência da Casa para atrapalhar as investigações da Operação Lava-Jato.
A investigação que será submetida à análise do plenário nesta quarta-feira diz respeito à acusação de que o peemedebista teria cobrado propinas que totalizam US$ 5 milhões para viabilizar contratos de dois navios-sonda da Petrobras. Os depoimentos do executivo da Toyo Setal Júlio Camargo e do lobista Fernando Baiano, prestados a partir de delação premiada, sustentam a denúncia da procuradoria. Segundo eles, Cunha pediu o montante em um encontro no Rio de Janeiro, em 2011. O acordo era referente a contratos que totalizavam R$ 1,2 bilhão em aluguel de navios-sonda da Petrobras. Para exigir a propina, o presidente da Câmara, na época apenas deputado, teria tentado articular investigações no Legislativo contra as empresas de Camargo.
- Se o Brasil fosse um país normal, já teria renunciado há muito tempo, mas aqui o nível de tolerância é muito alto e as situações vão se mantendo. Os advogados certamente vão dizer que não há condenação e nem motivos para afastá-lo, mas nesse cenário de abertura de processo, tudo pode acontecer. O mais provável é que Cunha busque criar algum fato novo para abafar a sua condição de réu e minimizar o impacto político contra si. Pode ser um ataque à presidente Dilma, algo mais frontal ao governo - opina Ricardo Caldas, professor de Ciência Política da UnB.
Pelo lado da oposição, o possível acolhimento da denúncia contra Cunha é visto como mais um golpe nas tentativas do peemedebista de enfraquecer o governo Dilma Rousseff e teria efeito nas manifestações marcadas para o dia 13 de março. Com um dos principais rivais da presidente na condição de réu, os governistas esperam que as vozes contrárias ao governo perderiam força nos protestos. Também contribui para isso o fato de pesquisa recente do Datafolha mostrar ampla rejeição a Cunha: 76% dos entrevistados opinaram pela sua renúncia da Câmara.
PRÓXIMOS PASSOS
Veja como será o procedimento caso a denúncia contra Cunha seja aceita
- Há uma indefinição se Cunha será citado para oferecer resposta à acusação no prazo estabelecido pelo Código de Processo Penal. Se for seguida a lei 8.038, de 1990, o prazo seria de cinco dias para uma defesa prévia. No caso de adoção do rito do código, o réu terá prazo de 10 dias para resposta à acusação.
- Início da instrução processual com a oitiva de testemunhas.
- Concluídos os depoimentos, é concedido prazo de cinco dias para as partes requererem diligências.
- Eduardo Cunha será chamado a depor, mas o momento em que isso ocorrerá será definido pelos ministros. A lei estabelece o interrogatório como primeiro ato do processo, mas o Código de Processo Penal deixa para depois da oitiva de todas as testemunhas. A tendência é de que o Supremo adote o código.
- Realizadas ou não as diligências, acusação e defesa são intimadas para, em 15 dias, apresentar alegações finais por escrito.
- Após, é realizado o julgamento no plenário do Supremo Tribunal Federal (STF).
- À decisão do STF cabe recurso de embargos declaratórios (quando uma das partes questiona pontos da decisão).