O deputado estadual Marlon Santos (PDT), corregedor da Comissão de Ética da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul, será o responsável por investigar as denúncias contra o colega Diógenes Basegio, do mesmo partido. No entanto, além de ser correligionário, Santos responde na Justiça pelo mesmo crime do qual o colega é suspeito: extorquir funcionários.
Conforme denúncias levantadas em 2007, Santos teria exigido parte dos salários de ao menos seis servidores de seu gabinete. O fato teria ocorrido em 2004, quando era deputado estadual e iniciava a campanha que o levou à prefeitura de Cachoeira do Sul. O processo tramita no Tribunal de Justiça, está na fase de apresentação de provas da defesa e não tem previsão para ser julgado.
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Assim como Basegio, Santos se considera vítima de uma "armação". A versão alegada pelos dois deputados é a mesma: um ex-assessor, afastado por irregularidade, teria criado as acusações para prejudicar a imagem deles. No caso de Santos, segundo o próprio deputado, o ex-funcionário afirmou que passava 6% de seu salário para o custeio da campanha do candidato a prefeito.
- Mas não tem filmagem, não tem nada escrito, e está sendo desmentido na Justiça. Esse processo vai terminar sei lá quando, daqui dez anos. E até lá a gente continua sangrando. Por isso que digo: na política, tem o ficha suja e o "ficha sujada" - afirmou o deputado em conversa com Zero Hora (leia a íntegra da entrevista abaixo).
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Santos se considera neste segundo grupo, dos que têm suas fichas "sujadas". Quando prontamente atendeu o telefonema da reportagem, na manhã desta quarta-feira, foi questionado em relação aos processos que responde (por crime ambiental, concussão, improbidade administrativa e de contratação). E respondeu, então, que todas as acusações feitas a ele poderiam ter sido publicizadas antes, porque ele nunca as escondeu:
- Se eu tiver um furinho na cueca, eu mostro. Não tenho problema algum com isso.
Em "desabafo" publicado em sua página no Facebook, na terça-feira, o deputado falou dos processos, divulgando inclusive o número pelo qual podem ser consultados na página no Tribunal de Justiça (TJ-RS). O pedetista falou ainda sobre a "perseguição religiosa" que sofre devido ao fato de ser médium, os ônus de ser político - área onde, segundo ele, o "amigo e o inimigo andam juntos". Santos também rebateu críticas em relação à integridade de sua atuação na investigação de Diógenes, "um amigo deputado":
- E a quantos interessar possa, tenho essa cara de taipa, mas sei o tamanho da Assembleia muito bem. De um lado não estarei exercendo a Corregedoria para destruir reputações, de outro, não vou deixar a reputação do Colegiado e da Assembleia ser destruída. Só que tudo será feito no mais sagrado direito da ampla defesa e do zelo, respeitando dignidades e punindo, no rigor, quem deva ser punido.
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Confira a entrevista com o deputado Marlon Santos:
O senhor fala que "coleciona" processos judiciais. Quais ainda tramitam?
Eu torno público tudo o que é meu. Se eu tiver um furinho na cueca, eu mostro. E isso ninguém mostra. Entrei na política por causa da perseguição religiosa, em razão do centro mediúnico em Cachoeira, onde eu atuava. Foi por causa disso que comecei a ser prejudicado. De 1997 a 1998, fui preso por exercício ilegal da Medicina, acusado pelo Ministério Público. Mas foi quando vi que o pessoal da prefeitura estava envolvido, que se tratava de politicagem, que entrei na política.
Em função de processos movidos em função da intolerância religiosa, em 2000, perdi dois dias do meu mandato enquanto vereador pelo PFL. Depois recorri e consegui reaver o mandato. Quando me candidatei a deputado estadual, em 2002, tive minha candidatura impugnada por 45 dias. Quando o TRE me absolveu, já tinha pouco tempo para fazer campanha. Quando concorri a prefeito em Cachoeira, veio tudo novamente a tona. Mas fui eleito prefeito da cidade aos meus 28 anos.
Na tentativa de reeleição, um ex-assessor se uniu com um grupo contrário, e suscitaram o processo de medicinal ilegal, levantando suspeitas ainda sobre a questão eleitoral, criminal e de improbidade. Esse assessor dizia que eu pegava 6% do salário dele para custear a campanha em 2004. Foi uma armação. É um processo que vem se arrastando por quase uma década e quem sendo desmentido dentro da Justiça. Por isso que digo: na política, tem o ficha suja e o ficha sujada. É muito fácil tu sujar a ficha de alguém. Chega uma hora que tu não tem mais o que fazer, tem que ficar só se defendendo.
E, no meu caso, tudo saiu de um ranço religioso, de uma rejeição religiosa estúpida.
Ser do mesmo partido e ainda amigo do deputado investigado não pode atrapalhar o seu trabalho enquanto corregedor?
Se eu tiver que me afastar de uma situação, será do partido, e não da corregedoria. Quando a Comissão de Ética trabalha na Casa é porque tem problema. Quando eu assumi, não havia processo. Agora tem. E envolve um amigo, um médico, uma pessoa do mesmo partido. Eu vou agir nem pelo certo, nem pelo errado. Mas pelo justo. E vou dar o tempo para a defesa, coisa que eu nunca tive. Como eleitora, tu pode ter certeza de farei um trabalho justo.
O senhor fala que não existem santos, que na política tem os maus e os menos maus, que seriam "os melhores". Mas diz também que é preciso tirar os maus do processo político, desde que sejam maus mesmo. "O que é ser mau mesmo" na política?
Ser "mau mesmo" é ter provado que existe o ato ilícito, que vá de encontro ao que é o princípio dos bons costumes e da prática legal.
E ser um político "menos mau"?
Partimos de um processo de ignorância na vida. Em toda a sociedade, não existem pessoas que possam se dizer 100% sábias ao ponto de sempre acertarem. E as pessoas que são eleitas vem pra cá com uma parcela de inexperiência, ignorância. É aquilo que eu digo: atire a primeira pedra quem é 100% santo.
O senhor fala que já fez coisas ridículas, que lhe quebraram a cara e geraram confusão. Por que tipo de coisas o senhor não é "santo"?
O prefeito que me sucedeu em Cachoeira do Sul, por exemplo, é um médico. Uma das coisas mais ridículas que fiz na vida foi chamá-lo de idiota. Ele disse que eu havia feito "intemperismos" na prefeitura durante o meu mandato, e eu, de cabeça quente, fui lá e disse isso.
Mas não tem mesmo bônus na política?
Tu acha que tem preço tu botar toda a tua reputação em risco? Na política tu conta as horas pra terminar o dia e continuar ilibado. Isso porque nós temos a cultura de achar que uma pessoa processada é condenada. Se esquece que Ministério Público é parte e não juiz.
A verdade é que é muito fácil criar um "ficha sujada". Basta ter um desconfiado que fale com um promotor que, sem o mínimo de consideração, não vai te escutar e já vai tocar um processo pra cima de ti. Eu já tenho mais 15, fui absolvido em vários. Outra parte foi arquivada. Quem vai restaurar todo o tempo e o dinheiro que perdi com isso?
* Zero Hora
Irregularidades na Assembleia
"É muito fácil sujar a ficha de alguém", diz corregedor que investigará Basegio
Em processo judicial, deputado Marlon Santos é acusado de extorsão - o mesmo crime do qual Diógenes Basegio é suspeito
Bruna Scirea
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