Paulo Pimenta (PT-RS) preside uma comissão em crise de identidade. Criada há 20 anos, reduto tradicional da esquerda, a Comissão de Direitos Humanos da Câmara foi dominada pelas bancadas da fé e da bala. A guinada ocorreu em 2013, quando Marco Feliciano (PSC-SP) tornou-se presidente. Ele segue na comissão em um time que traz os também pastores Eurico (PSB-PE) e Sóstenes Cavalcante (PSD-RJ), os delegados Éder Mauro (PSD-PA) e Laerte Bessa (PR-DF), além de Jair Bolsonaro (PP-RJ) e do filho Eduardo (PSC-SP). Agora, Jean Wyllys (PSOL-RJ), Dionilso Marcon (PT-RS), Erika Kokay (PT-DF) e Luiza Erundina (PSB-SP) são minoria.
A ZH, Pimenta admite a dificuldade de barrar projetos polêmicos, como o Estatuto da Família.
A comissão mudou seu perfil histórico?
Há um grupo de igrejas evangélicas e um da extrema direita, no caso do Bolsonaro e seu filho. Ainda há setores de delegados e oficiais das polícias militares que se elegeram com pauta de endurecimento da legislação na segurança. Eles têm uma aliança tática, na qual um apoia o outro para compor maioria.
Como evitar a aprovação de projetos como o Estatuto da Família, que só aceita família composta por homem e mulher?
Entre os evangélicos há posições tolerantes. Estamos em uma pauta de resistência. A comissão completa 20 anos, foi criada para ser a voz de setores sem espaço no parlamento. Hoje, resiste para não se tornar a antítese da sua origem.
O pastor Marco Feliciano presidiu a comissão em 2013 e, depois disso, quase dobrou sua votação. Virou estratégia eleitoral estar na comissão?
Eles descobriram um nicho. Como um percentual pequeno de pessoas tem posição muito radical, na medida em que você tem essa fala, se elege. Eles são reconhecidos por esse discurso de intolerância.
O presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), é o autor do projeto do Orgulho Hétero. Ele disse que não votará projetos que flexibilizem o aborto, por exemplo.
Corremos o risco de, em meses, termos retrocessos em avanços construídos por décadas. O sucesso da resistência depende da capacidade de mobilização externa. O parlamento é sensível à pressão da sociedade. A defesa dos direitos dos homossexuais vai além da disputa partidária. Você defende que um filho seja tratado de maneira diferente por ter relação com uma pessoa do mesmo sexo? Aposto e confio na resposta da sociedade para enfrentar o conservadorismo.
O senhor quer discutir aborto, consumo de maconha e criminalização da homofobia. É possível?
Que família não trata sobre sexualidade, drogas e violência? Não é razoável ignorar questões objetivas do dia a dia. Quero que o parlamento enfrente temas da realidade das pessoas.
Algum projeto na Câmara preocupa o senhor?
O do Orgulho Hétero é quase uma provocação. Não existe heterofobia, não se conhece caso de alguém espancado por ser heterossexual. Ele é tão provocativo quanto o projeto da cura gay.