O Estado tem pelo menos quatro Unidades de Pronto Atendimento (UPA) prontas, mas com as portas fechadas. Juntas, as obras em Alegrete, Bagé, Lajeado e Santo Ângelo custaram mais de R$ 13,3 milhões aos cofres públicos. Sem uso, deixam de atender entre 400 e 900 pessoas por dia.
A demora para que as construções passem a receber pacientes tem diferentes justificativas. Rachaduras, falta de equipamentos e problemas na rede elétrica estão entre as explicações. Estruturas de complexidade intermediária, entre as Unidades Básicas de Saúde as urgências hospitalares, elas possibilitariam desafogar os atendimentos nos pronto-socorros dos hospitais.
Um dos casos mais emblemáticos é o de Santo Ângelo, nas Missões. Inaugurada em 2012, a unidade, que poderia receber até 300 pacientes por dia, não realizou nenhum atendimento até hoje. No local, entregue à população com solenidade em 21 de dezembro do ano passado, foram investidos mais de R$ 3 milhões - R$ 2,1 milhões destinados pela União para a execução da obra, R$ 837 mil pagos pelo Estado para aquisição de equipamentos e o restante, pelo município. Problemas na estrutura impedem o uso do lugar. Conforme a administração municipal, uma vistoria da Secretaria Estadual de Obras Públicas, Irrigação e Desenvolvimento Urbano (SOP) apontou falhas na construção e de acabamento, como rachaduras no piso e fissuras. Falta, também, a instalação de um gerador de energia.
- Aguardamos o governo estadual fazer os ajustes necessários na estrutura do prédio. Atualmente, não tem condições de funcionar. Também queremos reclassificação para Porte 1 (redução da capacidade) - diz o prefeito de Santo Ângelo, Valdir Andres.
A Secretaria Estadual da Saúde (SES) afirma que já acionou a de Obras para a resolução das questões apresentadas pelo município, mas não foi divulgado prazo para a conclusão da obra. Quanto à reclassificação do porte, o processo está em andamento, precisando da validação do Ministério da Saúde.
Situação semelhante é encontrada em Lajeado, no Vale do Taquari. Concluída no final de 2012, ao custo de R$ 4,6 milhões, somando o valor da obra com a compra dos equipamentos, a UPA que teria capacidade para atender ao menos 150 pessoas ao dia, até agora não teve atendimentos. Segundo a prefeitura, a administração anterior não abriu licitação para a compra de equipamentos, o que foi realizado pela atual gestão. Agora, a previsão é que a unidade passe a funcionar em dezembro.
Na Fronteira, é um problema na rede elétrica que atrasa o início das atividades da UPA de Alegrete, oficialmente entregue em abril. Uma estação para geração de energia está sendo instalada, com conclusão prevista para o próximo mês. Além disso, segundo a secretária de Saúde, Maria do Horto, o município ainda estuda uma forma para a contratação de profissionais.
De acordo com Alfredo Menegheti Neto, especialista em finanças públicas estaduais da Fundação de Economia e Estatística (FEE), o desperdício de recursos públicos dificulta a relação do cidadão com o Estado.
- Quando o cidadão recolhe praticamente 36% de tudo que ele ganha e não recebe de volta em termos de qualidade de serviço, ele acaba tendo que buscar no mercado privado, e isso o onera ainda mais - avalia.
Em Bagé, problemas com licitações
O excesso de burocracia é um dos fatores apontado pelo pesquisador como um dos principais responsáveis pelo desperdício de recursos.
Em Bagé, também na Fronteira, o problema é a licitação para a compra de um aparelho de raio X, que já foi realizada mais de uma vez. Além disso, a empresa que ficou em segundo lugar na licitação para os serviços de limpeza da unidade contestou o edital. A previsão é que as atividades tenham início neste mês - quase um ano depois da conclusão da obra, em dezembro do ano passado.
Para o professor da UFRGS Alcindo Antônio Ferla, especialista na área da Saúde Coletiva e Educação, a situação em que se encontram as UPAs traz prejuízos ao cidadão, pois, com o Samu, as unidades têm ajudado a diminuir as mortes por acidentes e outras emergências.
- Elas estão em expansão e é evidente que existe prejuízo, não apenas financeiro. Elas foram inventadas não só porque há dinheiro para gastar, mas porque efetivamente a população precisa - salienta.
A Secretaria Estadual de Saúde afirma que, após a conclusão das obras nas unidades, a gestão fica a cargo dos municípios. São realizados repasses para o custeio mensal, que varia de acordo com o porte da unidade - de R$ 50 mil a R$ 250 mil. O Ministério da Saúde também financia as unidades em funcionamento, com repasses de R$ 100 mil a R$ 500 mil por mês. Ainda de acordo com a pasta, já foram investidos cerca de R$ 30 milhões nas Unidades de Pronto Atendimento do Estado. Nos próximos dois anos, há a previsão de novas unidades serem erguidas em outros 19 municípios: Erechim, Esteio, Ijuí, Santa Cruz do Sul, Guaíba, Gravataí, Alvorada, Sapucaia do Sul, Passo Fundo, Uruguaiana, Novo Hamburgo, São Leopoldo, Sapiranga, Taquara, Viamão, Pelotas, Parobé, Santana do Livramento e Carazinho.
Prefeituras questionam repasses
Prefeituras alegam ter dificuldades para manter as unidades em funcionamento, e prefeitos querem mais repasses do Estado e da União para isso. O assunto já foi tema de debate entre prefeitos na Federação das Associações dos Municípios do Estado (Famurs). Segundo Valdir Andres, presidente da entidade e prefeito de Santo Ângelo, os valores de repasse foram calculados em 2007, ano de publicação da portaria que cria as UPAs. Segundo ele, a parcela que os municípios precisam investir é maior do que o montante repassado pelo Estado e pela União.
- Os repasses do Estado e União não vão suprir toda a demanda, o que vai gerar um alto custo aos municípios. Nas cidades distantes dos grandes centros, a situação se agrava, porque o custo com funcionários é mais caro ainda - afirma Paulo Azeredo, assessor técnico da área da saúde da entidade.
Para o presidente do Conselho Regional de Medicina do RS (Cremers), Fernando Weber Matos, a questão do dinheiro para a manutenção do serviço é o principal problema e explica a falta de funcionamento de algumas unidades no Estado.
- A manutenção da UPA e o gerenciamento de pessoal ficam por conta do prefeito. O custo operacional é elevado. Os municípios não têm capacidade de manter este custo - critica.
- O que é uma UPA
De acordo com o Ministério da Saúde, as Unidades de Pronto Atendimento (UPA 24h) são estruturas de complexidade intermediária, entre as Unidades Básicas de Saúde e as urgências hospitalares. O serviço das unidades está ligado ao trabalho do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu), que deve organizar o fluxo de atendimento e encaminhar o paciente ao serviço adequado à situação. As UPAs devem ser instaladas em locais estratégicos.
- Capacidade de atendimento das UPAs
Porte I - de 50 a 150 pacientes por dia
Porte II - de 150 a 300 pacientes por dia
Porte III - de 300 a 450 pacientes por dia
Fonte: Secretaria Estadual da Saúde (SES)