Antes e depois: como está o bairro um mês após o rompimento do dique
Quase um mês após o rompimento do dique que alagou cerca de 700 casas no bairro Sarandi, na zona norte de Porto Alegre, os moradores atingidos pela enchente relatam as dificuldades para retomar a rotina e ainda contabilizam os prejuízos.
Apesar de três comissões mistas terem sido criadas para auxiliar as vítimas, para os que sofreram com os estragos causados pela água isso ainda é muito pouco.
- Temos feito várias reuniões mas até agora não teve nada em definitivo. Estamos tentando que pelo menos nos próximos seis meses os moradores paguem apenas a taxa mínima de água e esgoto - disse Clóvis Welter, presidente da Associação Loteamento Asa Branca, que teve um prejuízo de cerca de R$ 10 mil em mercadorias de seu estabelecimento.
A tarifa básica já foi garantida para todos os moradores, mas apenas para o mês de setembro. A família do pedreiro Josué da Silva perdeu tudo o que tinha:
- O que a gente construiu em 12 anos foi perdido em duas horas. Salvamos a família e mais nada. Meu prejuízo vai dar uns R$ 18 a 20 mil. Perdi minha casa, que era de madeira, e tudo o que estou reconstruindo agora foi tirado do meu bolso, com financiamento pessoal do banco. Eu não espero nada da prefeitura, só de mim mesmo.
De todos os objetos que perdeu, aquele de que o armador José Dorlei da Rosa mais sente falta é sua antiga Parati vermelha:
- Minha esposa sofreu um AVC há alguns anos e eu dependo do carro pra levar ela pra fisioterapia, levar no médico. O carro tá na oficina mas está difícil de recuperar. Por enquanto ainda não recebi nenhuma ajuda. Mas tudo o que vier vai ajudar, né. Porque a situação está muito difícil.
Nesta semana, a prefeitura realizou um mutirão em conjunto com outros órgãos do governo para atendimento às vítimas, onde foram reemitidos documentos perdidos na inundação, realizados agendamentos para vistorias nas residências mais atingidas e cadastros para obtenção de microcrédito.
Para a comerciante Ivonete Ribeiro, que perdeu R$ 4 mil em móveis e eletrodomésticos, o microcrédito não é solução:
- Se a gente já não tem nem pra gente, vai pegar uma dívida em banco? Para pagar de que jeito?
A cozinheira Cristina Rodrigues teve que dividir por três dias, com outros 30 moradores, o segundo andar do pequeno sobrado para assim impedir a ação de saqueadores que começavam a rondar o bairro. Ela não aceita arcar com os prejuízos:
- Moro aqui há 8 anos e nunca tivemos problema com água. Na enchente perdemos dois carros, o vizinho perdeu uma caminhonete que tinha comprado duas semanas antes. Quem é que vai indenizar as famílias? - diz a cozinheira.
De acordo com a prefeitura, já há duas mil famílias cadastradas, e um grupo de trabalho está tratando do tema quanto a eventuais indenizações, mas, como há um inquérito em andamento, essas questões só serão resolvidas após o fim das investigações.
O diretor do Departamento de Esgotos Pluviais (DEP), Tarso Boelter, acredita que o rompimento tenha sido intencional:
- O dique nunca rompeu pela força das águas desde que foi construído, nos anos 1970. Ou foi aberto de forma autorizada, como já aconteceu, ou de forma clandestina, como também já ocorreu no passado. O cenário só não foi pior agora porque a rede estava limpa, pois realizamos periodicamente a dragagem do arroio.
Segundo o delegado Omar Abud, titular da 22ª Delegacia de Polícia, ainda não há previsão de conclusão do inquérito:
- Não estou descartando nada ainda porque não tenho nada de concreto. A perícia ficou prejudicada, porque apesar de ter sido feita pouco tempo depois, já tinham fechado o dique e não deu pra dizer se foi por causa natural ou por uma ação criminosa. Só tenho provas testemunhais, e na próxima semana vou colher mais depoimentos
Em mapa, confira a localização do dique:
VÍDEO: Alagamento atinge centenas de casas