Por Thiago Lacerda, ator
Amanheci nesta sexta-feira (8) com a notícia sobre os meninos do Flamengo, vindo de uma semana de tempestades impressionantes. Some-se a isso o evento das favelas do Rio de Janeiro, também nesta sexta. Não tenho a menor ideia do que acontece hoje no Rio de Janeiro. É a soma de tantas coisas, de tantos fatores, que é muito difícil ter uma visão clara do que de fato se passa na cidade.
Sou torcedor do Flamengo e tenho um envolvimento especial com a questão, mas estou um pouco anestesiado com tudo isso. Acredito que todos nós estejamos. A perda de vidas tão jovens, interrompidas de forma tão abrupta durante a caminhada pela busca de sonhos... Conheço a estrutura do clube e sei o quanto eles investem nos meninos e em um centro de treinamento de excelência. Ainda assim, é preciso apurar o que de fato aconteceu. Nosso papel é de ir atrás dos fatos, das razões que levaram à tragédia, a fim de evitar que aconteça novamente. Que sirva de lição.
Neste momento de lamento, de pranto, é fundamental todo apoio às famílias envolvidas nesta tragédia terrível. Mas também é importante entender se houve negligência no cenário, garantir que isso não seja uma realidade e investigar os responsáveis, onde deve existir responsabilidade. Tenho certeza de que o Flamengo, por tudo que representa, dará todo suporte às famílias e contribuirá para a investigação civil, a fim de entender o que possibilitou essa tragédia.
As consequências da demonstração de força da natureza contra a cidade do Rio de Janeiro evidenciam, mais uma vez, que a questão ambiental não é coisa de cartilha marxista. O aquecimento global e nossa fragilidade diante da potência da natureza são uma realidade, que precisa ser trazida à tona, que precisa ser discutida, sim, de forma séria e absolutamente comprometida pelos poderes públicos.
Não só da cidade do Rio de Janeiro, mas também no âmbito estadual e, principalmente, federal e mundial. Informar com responsabilidade e educar o cidadão precisa ser um compromisso global. Essa mesma força natural que nos revela a necessidade de tratar o assunto de forma séria revela também o despreparo de figuras públicas importantíssimas nesse processo.
O prefeito do Rio de Janeiro, o governador do Rio de Janeiro, o presidente eleito e suas equipes não me parecem preparados e nem compreendem o que de fato tudo isso significa. É preciso que algo seja feito de forma contundente na direção do nosso comprometimento com as condições climáticas do planeta.
A mesma incapacidade de oferecer segurança para absorver os impactos ambientais de nossa cidade também se revela na questão social. Vivemos em uma cidade absolutamente entregue ao poder paralelo e ao crime organizado há décadas. Hoje, o crime parece ser o próprio poder público no estado e no município do Rio. E essa responsabilidade é nossa, enquanto cidadãos.
Temos escolhido muito mal nossas lideranças, talvez essa seja uma das explicações para esses terríveis 40 dias de 2019 na minha cidade, no meu estado, no meu país. Vivemos na cidade que mais mata jovens no mundo. Algo precisa ser feito. Se isso não acontecer imediatamente, nosso luto se estenderá por muito tempo. Tudo isso é muito sério.
O caminho é pela educação. Educação no sentido amplo. E educação é um tema para ser tratado de forma séria, com absoluta responsabilidade e comprometimento. O caminho é longo, mas transformador. Pela educação, espero que encontremos meios de entender que a negligência não pode existir onde deve existir responsabilidade. Espero que, pela educação, possamos entender que a discussão sobre o aquecimento global, o veneno, o lixo, o capitalismo irresponsável de Mariana e Brumadinho, é uma realidade que vai cobrar uma conta muito alta.
E espero que, pela educação, possamos entender que a vida é mais importante do que o medo. E que, pela educação, possamos entender que segurança é uma consequência do entendimento da palavra respeito. Sem educação, é impossível entender o que significa, de fato, essa palavra. Sobreviveremos a tudo isso, e espero que nossa dor não se estenda por muito tempo.