Após as morte de 10 meninos no Ninho do Urubu, CT do Flamengo, visitamos os alojamentos das duas únicas equipes da Primeira Divisão do Gauchão que abrigam adolescentes. Juventude e Brasil-Pel estão em período de férias para as categorias sub-15 e sub-17, mas abriram as portas para mostrar como são suas estruturas. Os espaços, ainda que diferentes, recebem jovens de 14 a 17 anos. Segundo os clubes, há investimento na segurança para evitar novas tragédias.
No Juventude, há monitoramento 24 horas
Poucos clubes no Rio Grande do Sul têm uma dependência tão grande da categoria de base quanto o Juventude. Nem mesmo no tempo da parceria com a Parmalat, na década de 1990, os jovens foram deixados de lado. Vários deles estavam nas conquistas da Série B, em 1994, do Gauchão, em 1998, e da Copa do Brasil, em 1999. Os goleiros Umberto e Márcio Angonese, o volante Lauro e o meia Itaqui são exemplos de atletas que saíram debaixo da arquibancada do Alfredo Jaconi para levar o time aos anos mais gloriosos de sua história.
No caso do Juventude, morar embaixo da arquibancada não chega a ser um problema. Mesmo sem grande luxo, o alojamento da categoria de base é confortável, espaçoso e organizado. Nos 10 quartos que funcionam atualmente, vivem 15 jovens das diversas regiões do Estado e do país — o local tem capacidade para até 25 pessoas. Ficam ali garotos das categorias sub-15 e sub-17. A partir dos 18 anos, o clube paga uma ajuda de custo para auxiliar com aluguel, além do salário.
Como está localizada no estádio, a instalação passa por inspeções do Plano de Prevenção e Proteção contra Incêndios (PPCI) do Corpo de Bombeiros.
— O alojamento está inserido na segurança que a gente dá para o estádio como um todo. Ele tem um projeto (junto ao Corpo de Bombeiros) e alvará com laudo vigente, que é renovado uma vez ao ano. Tem o alvará de vigilância sanitária também. São os documentos que a FGF e a CBF exigem para se usar o estádio em competições oficiais — diz o vice-presidente de patrimônio do clube, Luís Carlos Bianchi.
Na vistoria para 2019, foi pedido que aumentasse a altura do corrimão das escadarias, obra realizada antes do início do Gauchão.
Até 2016, a realidade do alojamento era diferente. Eram ocupados dois andares, com capacidade de até 80 atletas. Com a reorganização financeira, um dos andares virou a sede das escolinhas.
Os riscos aos atletas que moram no Alfredo Jaconi são mínimos. Apesar de ainda não ter uma segunda saída — o projeto está em desenvolvimento, segundo a direção do clube —, o fato de toda a estrutura ser de tijolo e concreto diminui as chances de chamas se propagarem de um quarto para outro. Até mesmo os armários são de alvenaria. O que há de inflamável são as camas, colchões e as portas.
— Estamos construindo uma saída de emergência nova. Mas, ainda assim, temos 35 metros entre a última parede do alojamento e a saída principal. A exigência do Corpo de Bombeiros é uma a cada 40m. A nova servirá para reduzir ainda mais os riscos — diz Bianchi, lembrando que há monitoramento durante o período no alojamento:
— Há um monitor, até o começo da noite. Na madrugada, há portaria e monitoramento 24 horas. Então, sempre há alguém de olho.
Como não há treinamentos das categorias de base no verão, não existem aparelhos de ar-condicionado nos quartos. Quando necessário, os próprios jogadores levam ventiladores, que são avaliados pelos diretores. Para o inverno, bastante rigoroso na região, o Juventude disponibiliza uma estufa a óleo para cada habitação. O modelo é o mais seguro, garante o clube.
O Juventude também disponibiliza uma equipe multidisciplinar para acompanhar o desenvolvimento dos atletas. Uma psicóloga e uma pedagoga trabalham com os garotos. O departamento médico é o mesmo do profissional, com horários específicos para a base. A fisioterapia tem profissionais exclusivos para as categorias sub-20, sub-17 e sub-15. Todos os alojados no Jaconi são matriculados em uma escola da rede pública. O clube disponibiliza transporte para ida e volta até as aulas.
A utilização de atletas formados no clube na equipe principal é praticamente uma obrigação no Juventude. Com o investimento na categoria de base em torno de R$ 1,8 milhão para a temporada — aproximadamente 18% do orçamento para 2019 —, a necessidade de colocar os meninos em campo vai além de futuras negociações. Dos 33 atletas que estão no grupo do técnico Luiz Carlos Winck, 13 foram formados em Caxias.
Alguns deles, como o goleiro Raul, de 21 anos, passaram a adolescência morando debaixo das arquibancadas do Jaconi.
— Cheguei aqui com 14 anos, vindo de Ernestina. Foi um período bom. O Juventude nunca deixou nos faltar nada. O que precisou, sempre teve ali — elogia.
Brasil-Pel fez parceria com CT do Fragata
Foi graças a uma parceria com o Fragata FC, clube criado pelo ex-jogador da Seleção Brasileira Emerson para formação de atletas, que o Brasil-Pel tem o alojamento para as categorias de base. No local ficam atletas das categorias sub-15, sub-17 e sub-19. Além do alojamento, os campos de treinamento também são utilizados pelo Xavante.
O vice-presidente das categorias de base do clube, Jorge Moro, garante que a estrutura é uma das melhores do Estado:
— Todo mundo que vai ao CT fica impressionado. Inclusive, ele foi preparado abrigar uma seleção na Copa do Mundo de 2014. Como o local estava fechado, nossa intervenção foi apenas no visual e nos cortes de grama.
O clube investe R$ 85 mil mensais para manter sua base no CT. O alojamento tem capacidade para 30 meninos, mas foi ocupado por 18 na última temporada. Os jovens atletas vêm de cidades como São Paulo, Belo Horizonte e alguns municípios gaúchos, como Uruguaiana, Camaquã e Porto Alegre.
Cerca de 15 funcionários do clube atuam no local, entre cozinheiras, funcionários administrativos e esportivos. O calendário da base prevê, nesta temporada, a disputa de campeonatos regionais, estaduais, Brasileiro (sub-19) e a Copa do Brasil (sub-17).