Um tema polêmico envolvendo futebol e álcool voltará à pauta no Rio Grande do Sul. Nos próximos dias, o presidente do Sindiclubes-RS, César Cabral, com o aval dos presidentes de clubes gaúchos, enviará um documento para o presidente da Assembleia Legislativa, Marlon Santos, para que bebidas alcoólicas voltem a ser vendidas nos estádios. A medida prevê atualizar uma lei estadual em vigor desde abril de 2008 que proíbe a venda durante as partidas.
A liberação de bebidas alcoólicas nos bares dos estádios durante os jogos é uma reivindicação antiga dos clubes do Interior, que veem na medida um reforço no orçamento. Cabral se baseia em uma recente pesquisa do Instituto Methodus, realizada de 11 a 22 de novembro do ano passado no Beira-Rio e na Arena do Grêmio. Foram entrevistados 600 torcedores nos jogos Grêmio x São Paulo, Inter x Vila Nova e Grêmio x Lanús. Foram 63,8% pessoas a favor da liberação. Dos 34,8% contra a venda de bebidas, 76% acreditam que a liberação é a porta de entrada para o início de confusões, de acordo com a pesquisa.
A solução, segundo o presidente do Sindiclubes-RS, é a identificação e punição dos torcedores desordeiros, por meio de câmeras de alta tecnologia nos dois estádios da dupla Gre-Nal, além do aumento do efetivo da Brigada Militar durante as partidas.
– As pessoas têm de ter responsabilidade. Aprontou? Identifica e pune. O Estado, a Brigada Militar têm que se responsabilizar. Vamos ter vários elementos que não sabem beber e serão punidos.
Têm de ter responsabilidade. Aprontou? Identifica e pune. O Estado, a Brigada Militar têm que se responsabilizar"
CÉSAR CABRAL
Presidente do Sindiclubes-RS
Segundo Francisco Noveletto, presidente da Federação Gaúcha de Futebol, a venda de bebidas representa um terço do orçamento dos times pequenos. E esses clubes, diz o dirigente, não poderiam ser prejudicados pelas confusões causadas por torcedores de Grêmio e Inter, que arrecadam mais de R$ 100 milhões, cada, em patrocínios por ano:
– O inocente não pode pagar pelo pecador. Cidadão de bem que quer tomar dois chopinhos, faz parte do programa de futebol, não pode ser punido por quem já vai ao estádio mal intencionado. Os problemas que acontecem são na Capital, envolvendo torcedores da dupla Gre-Nal. Nunca houve qualquer situação com o Interior. E eles pagam pelos dois clubes de Porto Alegre.
PROMOTOR DIZ QUE LIBERAÇÃO DA VENDA SERÁ RETROCESSO
A polêmica, para o promotor do Juizado do Torcedor, Márcio Bressani, vai além de questões comerciais. O consumo de bebidas alcoólicas está relacionado a incidentes recentes, quando uma mulher foi assediada na esplanada da Arena e um sinalizador foi jogado, também no estádio gremista, no fim do Gre-Nal pelo Brasileirão:
– É um retrocesso no que foi conquistado até agora. As ocorrências acontecem, muitas vezes, em decorrência do consumo de bebidas alcoólicas. O episódio em que um torcedor passa a mão em uma torcedora, na Arena, o caso do sinalizador, na maior parte das vezes, existe vinculação com o consumo de álcool, que é remanescente do entorno. Essas iniciativas trazem o problema para dentro do estádio. E tendem a aumentar. Vamos sempre ser rigorosos que os clubes, quando tomam iniciativa como essa, não podem reclamar e pedir aumento da segurança (da Brigada Militar, no caso). E, sim, precisam fazer alguma coisa, aumentar a segurança por conta própria.
O episódio em que um torcedor passa a mão em uma torcedora, na Arena, o caso do sinalizador, na maior parte das vezes, existe vinculação com o consumo de álcool"
MÁRCIO BRESSANI
Promotor do Juizado do Torcedor
Um projeto para liberar bebidas alcoólicas nos estádios gaúchos já tramita na Assembleia desde 2015. O texto do deputado Juliano Roso (PC do B) foi encaminhado à Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), onde recebeu um parecer contrário de Alexandre Postal. Para que seja encaminhado a votação no plenário, o projeto precisa de um parecer favorável da CCJ. Roso já pediu a redistribuição à comissão e, desde fevereiro de 2018, está sob o parecer de Vilmar Zanchin, outro integrante do colegiado.
O que dizem os presidentes:
"Já existe um projeto tramitando na Assembleia, do deputado Juliano Roso. eu acho que é uma hipocrisia o que temos aqui. Se bebe adoidadamente na esplanada, e não se bebe dentro do estádio. Sou a favor, com horário. Libera no início, intervalo e no fim. Não pode indiscriminadamente. Precisa ter horas para beber. É uma questão de regulação, do bem estar do torcedor e poder aproveitar melhor os jogos. Bebida e violência, claro, tem muito a ver. Mas os riscos são os mesmos dentro quanto fora do estádio."
Romildo Bolzan, presidente do Grêmio
"O assunto é polêmico, que merece uma ampla discussão. E tem prós e contras. No caso da bebida ser vendida nos estádios, vejo com mais prós. Nós estamos vivendo um período em que não se vende bebida dentro dos estádios do RS. Não acabou a violência. Tem quebra de cadeiras, briga dentro do estádio e no entorno. Então, acho que o problema na violÊncia é muito mais profundo, geralmente provocado pelos mesmos, que não dá para chamar de torcedor. A liberação da venda de bebida alcóolica poderia passar por uma regulamentação. A gente conhece outros esportes e cenários em que a comercialização é feita. No basquete americano, a venda vai até o intervalo. No futebol inglês, se não me engano, vende só no bar. O clube não tem como ter o controle do que é comercializado fora de suas dependências. Se tiver controle e regramento do que pode ser feito dentro das suas dependências, pode diminuir o consumo e a violência. Eu duvido que a gente veja as cenas de violência como o Vasco e o Sporting, de Portugal, tenha a ver com bebida. A falta de punição e a sensação de que nada vai acontecer são piores do que a liberação da venda."
Marcelo Medeiros, presidente do Inter
"Eu sou favorável por vários motivos. No mundo todo, nos estádios, é permitida a cerveja. Não vejo como isso seja determinante para a violência. Até porque, pelo que se percebe, como é proibido, as pessoas bebem fora além da conta. A lei veio com o intuito de diminuir a violência, e está aumentando. Financeiramente, para o clube, seria interessante. Mesmo os clubes que não controlam a venda, tem o percentual sob o faturamento do bar. Tendo um produto a mais, a receita sobe."
Roberto Tonietto, presidente do Juventude
"Sou a favor da liberação. Estamos com poucos estados que estão com esta proibição. Eu acredito que é um dos motivos de ter caído o número do público. Não acredito que seja incentivadora de mais ou menos violência. Está sendo penalizada aquela pessoa que perde receita de copa. Não conseguiria quantificar quanto que aumentaria a renda, mas é um fator de lucro. Hoje, a gente compete com televisão, internet, tudo para que a pessoa não saia de casa. Liberação seria um atrativo a mais. Não vejo motivo para proibir. Estamos a 50km de Chapecó, e ali é liberado. E está tudo bem."
Adilson Stankiewicz, presidente do Ypiranga
"Eu sou favorável à liberação, porque eu vejo que existe um comércio muito forte, que aumentou muito desde que proibiu. Nós aumentamos muito o monitoramento, a segurança. Agora, temos uma central de monitoramento, e eu não vejo nada que possa ir contra a venda. Vende fora, e o pessoal entra no estádio. Tem gente que chega duas horas antes para beber no entorno. Isso acaba sendo uma fonte de renda para os clubes, e quem se beneficia são os comércios informeis. Acho que a lei precisa ser revista, sim."
Raul Hartmann, presidente do Novo Hamburgo