Os tenistas Novak Djokovic e Andy Murray protagonizaram a mais recente final do Aberto da Austrália, torneio que abre o primeiro dos quatro Grand Slam, os maiores da temporada.
Um jogo pode ser analisado, e aqui o esboçamos: vitória em três sets do sérvio, mais arrasadora no primeiro, menos no segundo e terceiro, e assim por diante. Pode-se também evocar o acúmulo de erros não forçados do britânico, a solidez no fundo de quadra de Djokovic, e assim por diante. Assim é o esporte, como a arte, cada gênero ou modalidade com seu mundo próprio, suas regras, suas leis até que um sujeito criativo (os finalistas) venha desafiá-los.
Mas não vamos assim por diante, não somos teóricos do esporte, da arte ou do que quer que seja. Somos, como qualquer um, viventes e observadores. Por detrás do esportista, o homem. Por detrás do artista, o homem. E ali encontramos um sérvio que começou a sua carreira em um país arrasado pela guerra e pela violência. Contam que treinava num paredão crivado de balas e há de ter extraído o melhor dessa terrível experiência. Chamamos de resiliência a capacidade de resistir às adversidades (de um jogo em cinco sets, metáfora palatável de uma Guerra), e a vida, como diz a popular sabedoria, quando não mata engorda. Pois ali estava um atleta capaz de se manter sereno (não frio) diante de um impasse maior.
Ainda mais recente do que o drama de seu adversário, estava o de Andy Murray, que deixou a esposa grávida e enlutada pela morte do pai para cumprir a sua responsabilidade de estar ali, fazendo o seu trabalho. De fase em fase, foi batendo adversários até se defrontar com o maior deles e que estava dividido, pois talvez não fosse apenas o número 1 do mundo no outro lado da quadra, e sim a distância do primeiro filho de Andy, prestes a nascer no outro lado do mundo. Jogue-se com um barulho desses! Em seu discurso de britânico emocionado, Murray abriu espaço para sentirmos o quanto uma vida pode interferir com razão e sentimento em um jogo.
Porque se arte e esporte conquistam linguagens próprias, nenhum deles e nenhuma delas pode ser maior do que aquilo que começou antes e continuará depois: ela mesma, novamente e sempre, a vida em si.