Um homem sem nada a perder. Assim apresentou-se a GZH Jose Maria Morr, 42 anos, técnico responsável por conduzir o Metropolitanos-VEN de forma meteórica do ostracismo à elite do futebol venezuelano. Lanterna do grupo na Copa Libertadores, o adversário do Inter nesta quinta (25), em Caracas, assume a postura de franco-atirador e fala inclusive em aprender com o futebol dos colorados, independentemente do resultado no Estádio da Universidad Central da Venezuela.
Com vasta experiência no comando das seleções de base venezuelanas, Morr assumiu o cargo de técnico do Metropolitanos em 2019. Em apenas quatro anos, formou uma base de jovens talentos, conduziu o time duas vezes à Copa Sul-Americana e, em 2022, conquistou o sonhado título venezuelano, o que garantiu a participação inédita na Copa Libertadores 2023.
Em entrevista exclusiva a GZH, ele projetou o jogo contra o Inter, analisou o seu trabalho no clube e projetou as perspectivas pouco animadoras do futebol da Venezuela, país assolado desde 2013 por uma grave crise econômica.
Como chega o Metropolitanos para o jogo contra o Inter? Apesar de não ter somado pontos ainda na Libertadores, há confiança em um bom resultado?
A nossa equipe começou muito mal a temporada, mas está em ascensão. Nas últimas oito partidas do Campeonato Venezuelano, ganhamos seis e perdemos apenas duas, o que nos fez subir para o quinto lugar. Depois de um mau início, conseguimos melhorar. Para a partida contra o Inter, iremos buscar o nosso primeiro ponto na Copa Libertadores. Somos um clube novo e sabemos da força do Inter, mas somos locais e estamos confiantes em somar o primeiro ponto na Copa, algo que não conseguimos nas primeiras três partidas.
Qual será a postura do Metropolitanos contra o Inter?
Hoje o Brasil para mim é o futebol de primeiro nível da América do Sul em todos os sentidos. Vamos jogar sabendo das nossas limitações e tratando de melhorar a nossa postura. Não vamos ficar atrás, mas precisamos saber em que zonas do campo seremos capazes de competir. Fizemos uma grande partida em Porto Alegre, apesar da derrota por 1 a 0 e podemos melhorar ainda mais, pois jogaremos em casa. Porém, como sempre digo, independentemente do resultado, temos muito a ganhar e pouco a perder. Será para nós mais uma oportunidade para aprender. Sabemos da grande diferença que temos para o futebol brasileiro, e o jogo será mais uma oportunidade para aprendermos e copiarmos o alto nível do futebol brasileiro, o que sempre tentamos fazer como venezuelanos.
O Inter perdeu o Gre-Nal no último domingo e chega sob forte pressão. Você está ciente da crise pela qual passa o clube? Como o Metropolitanos pode aproveitar esta turbulência? Sim, lemos sobre tudo isso. Sabemos o que representa perder um clássico da magnitude do Gre-Nal e que isso afeta a confiança os jogadores. Ainda que o nosso adversário esteja no seu pior momento no ano e esteja há seis jogos sem ganhar, sabemos que não vai ser fácil. Vamos fazer de tudo para que o Inter não consiga se recuperar deste mau momento contra nós.
Sabemos o que representa perder um clássico da magnitude do Gre-Nal e que isso afeta a confiança os jogadores. Ainda que o nosso adversário esteja no seu pior momento no ano e esteja há seis jogos sem ganhar, sabemos que não vai ser fácil
JOSE MARIA MORR
Técnico do Metropolitanos
O que mais te agrada no Inter?
Alan Patrick é um jogador diferente. O uruguaio canhoto (Carlos de Pena) é interessante. E gosto dos pontas também. O treinador não tem tanto tempo de trabalho, pois sabemos que o Campeonato Brasileiro não permite muito isso. Mas pudemos analisar todas as individualidades do Inter e faremos o possível para não deixarmos nossos defensores no um contra um, precisamnos estar sempre com superioridade numérica.
Um dos seus atletas é o jovem zagueiro Andrés Ferro, que vem sendo convocado pela seleção venezuelana e é filho do dono do clube, Juan Carlos Ferro? É um dos destaques?
Sim, de fato Andrés Ferro é o filho do dono do clube. Está comigo desde o início do projeto. Temos uma boa geração de jovens atletas. Andrés tem boa experiência pelas seleções venezuelanas e tem muito potencial, embora ainda possa melhorar na parte muscular. Mas está tendo uma evolução muito rápida e positiva. Para muitos, ele ganhou projeção por ser filho do dono, mas a verdade é que ele joga e sempre jogou por sua qualidade e talento, que vem mostrando tanto na liga como em competições internacionais.
Não é delicado treinar o filho do dono? E se você tiver que colocá-lo no banco ou tomar uma decisão que desagrade a ele e a seu pai?
Graças a Deus, Juan Carlos (Ferro) é muito estável emocionalmente em relação a todas as decisões que envolvem o seu filho. Na minha chegada, expliquei que desenvolveríamos o futebol dele aos poucos e ao longo do tempo. Todo dono tem as suas opiniões e nós a respeitamos, mas a verdade é que nunca tivemos divergências em relação ao seu filho. Em um momento, conversei com ele para que ele não exigisse dele mais que o normal, pois Andrés leva essa pressão de ser filho do presidente, e é normal que em algum momento ele não consiga jogar bem. Mas graças a Deus não tive esse azar de viver uma situação em que não possa escolher ou escalar quem eu quero. Por isso, estou no clube.
O Metropolitanos é um clube novo. O título do Campeonato Venezuelano 2022 e a participação na Copa Libertadores já foram suficientes para criar uma torcida?
O nosso clube tem apenas 11 anos. É um clube muito jovem, que fica na mesma cidade do Caracas Fútbol Club, que tem a maior torcida da capital, e também de outras equipes mais tradicionais, como o La Guaira e a UCV (Universidad Central de la Venezuela). Estamos crescendo aos poucos. Cheguei em 2019 e, desde então, estamos crescendo. Participamos pela primeira vez da Copa Sul-Americana em 2020 e, depois, novamente em 2021. Em 2022, armamos um time competitivo e conquistamos a Liga Nacional, o que nos possibilitou chegar em 2023 à competição mais difícil, importante e emocionante do continente, que é a Copa Libertadores. Ainda somos um clube de pouca história e pouca torcida, além de sermos da capital, que tem mais de três equipes. Isso torna difícil angariar torcedores. A verdade é que nós estamos crescendo muito mais rápido no aspecto esportivo do que no estrutural.
Aqui na Venezuela, nos falta ainda muita estrutura. A nossa equipe treina em um gramado sintético e, duas ou três vezes na semana, precisamos alugar um gramado natural para que os atletas possam se adaptar à velocidade da bola.
JOSE MARIA MORR
Técnico do Metropolitanos
Quais são as suas características como treinador?
Meu trabalho desde 2010 é predominantemente em equipes de base, como as seleções sub-15, sub-17 e sub-20 da Venezuela. Trabalhei como auxiliar de Dudamel na seleção principal, mas tenho muito mais experiência em equipes de base. Estou há apenas cinco anos como técnico principal de uma equipe profissional, e creio que o que mais me agrada no futebol é formar e desenvolver jogadores, para que o clube possa vender e se estruturar. Aqui na Venezuela, nos falta ainda muita estrutura. A nossa equipe treina em um gramado sintético e, duas ou três vezes na semana, precisamos alugar um gramado natural para que os atletas possam se adaptar à velocidade da bola.
A economia da Venezuela apresentou sinais de melhora nos últimos dois anos. Isso não permite ao futebol venezuelano sonhar com objetivos maiores no ciclo da Copa 2026?
Olha, a economia do país está melhorando, mas não é o melhor momento do país em termos estruturais. Ainda nos falta muita coisa. Os nossos clubes profissionais não tem grandes complexos e centros de treinamento, como Grêmio, Inter e os demais clubes brasileiros. Acredito que isso é um grande limitador para o nosso futebol. Sabemos que, no futebol, como em qualquer empresa, precisamos de investimento financeiro para evoluir. Para a Copa 2026, temos uma oportunidade a mais devido ao aumento de vagas para a América do Sul. Para mim, somos uma liga exportadora de jogadores e treinadores. Não vou mentir. Nossos salários são baixos e a inflação no país é alta. Mas eu sempre comento que é muito importante para cada equipe melhorar as suas estruturas, seus campos e suas academias para que possamos desenvolver mais os jogadores venezuelanos.