A Rádio Gaúcha entrevistou os quatro candidatos à presidência do Inter neste sábado (31) para que pudessem apresentar suas ideias ao torcedor colorado. Cada um teve 20 minutos para responder aos questionamentos dos jornalistas Zé Alberto Andrade e Raphael Gomes.
O primeiro turno da eleição está marcada para 26 de novembro, em que o Conselho Deliberativo do clube indicará dois nomes para concorrerem aos votos dos associados, no segundo turno, em 15 de dezembro. Assim será escolhido o sucessor de Marcelo Medeiros na presidência do Inter.
Um dos candidatos é Cristiano Pilla, 46 anos, que representa a Chapa 4. Vinculado ao movimento "O Povo do Clube", ele é sócio desde 1999. Eleito conselheiro em 2014, cumpriu mandato até 2018. Um ano antes, atuou como diretor de relacionamento social do clube.
Confira as respostas de Pilla:
Formação e tempo de clube
Sou médico, formado pela UFRGS, me especializei em diagnóstico por imagem. Atualmente trabalho fazendo ecografia, interpretando tomografia, raio-x, mamografia. Entrei no Conselho do Inter em 2014. Estou com 46 anos e comecei a minha história no Beira-Rio levado pela mão do meu saudoso pai, no final da década de 1970. Com uns quatro ou cinco anos ele começou a me levar nas sociais do Beira-Rio. Já na minha adolescência, com o pai um pouco cansado de frequentar o estádio, comecei a ir com os meus amigos o colégio Rosário. A gente ia de ônibus, pegava ali no Centro, na Avenida Salgado Filho, o ônibus abarrotado de vermelho, ia junto do povo, cantando.
Os meus lugares preferidos no Beira-Rio eram a arquibancada inferior, ali no portão seis, ia muito na Coreia também quando estava um pouco apertado de grana. Então esse contato com o Beira-Rio na minha adolescência foi muito importante, me deu muitos ensinamentos, como tratar o outro de igual para igual, independentemente de classe social, de cor. Já na minha adolescência, por esse ligação que eu tinha com o meu pai muito forte, também me apaixonei muito pelo Inter pela identidade popular do clube. Essa história de clube do povo nossa é muito importante para mim, sou muito ligado nisso.
Saindo da faculdade, com um pouco mais de condições financeiras para pagar a mensalidade, eu me associei no Inter. Então, sou sócio desde 1999. Depois, vem a parte política, que vou deixar para vocês perguntarem mais detalhes. Mas a minha vida de colorado é assim, apaixonado, fanático, não perco nenhum jogo praticamente. Já viajei para ver o Inter fora do Beira-Rio. E agora estamos com essa missão histórica de ter a honra de ser candidato à presidência do Inter, uma coisa que eu jamais imaginaria no passado. Mas aconteceu naturalmente.
Primeira vez no Beira-Rio
Me lembro de jogos de 1979, do meu pai me levando. Até faço força e pergunto para ele qual primeiro jogo que eu fui, mas ele não sabe me dizer. Mas lembro do Valdomiro a direita, Falcão no meio, aquele timaço de 1979, campeão invicto. Então, meu primeiro jogo foi em 1979, isso eu tenho certeza, mas lembro especificamente qual foi o jogo.
Jogo inesquecível
Meu jogo inesquecível foi o Gre-Nal do Século, em fevereiro de 1989. Eu tinha 14 anos, estava em Cidreira com a família, de férias, e nessa época eu até jogava na escolinha do Inter. Tinha carteirinha de sócio-atleta e não tinha muito a preocupação de comprar ingresso. Aí consegui convencer o meu primo Ricardo, que estava comigo em Cidreira, porque ele era adulto e eu ainda era menor de idade, e convenci, chorei para irmos ao jogo, pegamos o ônibus, viemos a Porto Alegre naquele domingo de manhã cedo e foi um jogo inesquecível, um dia inesquecível.
Aquela virada, com um jogador a menos, em cima deles, valendo vaga na final do Campeonato Brasileiro e na Libertadores ao mesmo tempo, o Beira-Rio lotado, aquela massa colorada enlouquecida. Nenhum jogo para mim, presencialmente, conseguiu superar aquele até hoje. Estava na final contra o São Paulo, contra o Chivas, estava no Morumbi contra o São Paulo também, mas o jogo mais emocionante para mim até hoje, que eu mais fui à loucura, foi o Gre-Nal do Século, aquele 2 a 1.
Grande ídolo entre jogadores
Essa é uma pergunta dificílima de responder. Temos Fernandão, Falcão, Tesourinha, Figueroa, mas para mim, pessoalmente, meu maior ídolo é o Valdomiro. Foi o jogador que mais atuou com a camisa do Inter até hoje, conquistou oito campeonatos gaúchos ou mais até, três brasileiros, teve participação decisivas tanto no primeiro quanto no segundo brasileiros. Para mim, o primeiro Campeonato Brasileiro do Inter é o título mais importante do Rio Grande do Sul na história, porque abriu as portas do futebol gaúcho para o Brasil e o mundo. E o Valdomiro era um cara que tinha muita raça, determinação e amor à camisa, além do cruzamento fulminante, o petardo de falta, fazia gols de cabeça, de fora da área, de tudo quanto era jeito. Raramente se machucava. Então, tenho vários ídolos, mas se tivesse que escolher um, apesar do grande Fernandão, tenho uma ligação muito forte com o Valdomiro.
Técnico que mais admira
A gente lê sobre vários técnicos como Ênio Andrade e Rubens Minelli, o próprio Teté, o Coudet está sendo agora um grande técnico, mas ainda tem muito caminho pela frente para entrar nesse rol, mas para mim, sentimentalmente, é o Abel. Até porque em 1989, naquele jogo contra o Olímpia, que foi o mais triste da minha vida, estava com o pai, com 14 anos, aquela vitória era certa, o time estava jogando muito bem, ganhamos de 1 a 0 do Olímpia lá, com gol de bicicleta do Luís Fernando Rosa Flores, e o jogo aqui era formalidade. A expectativa era golear, mas aconteceu aquela tragédia.
O Abel era o técnico, o Leomir era jogador do time e até errou um pênalti. Aquele jogo foi muito ruim, fiquei chorando horas e horas depois. Mas eu gostava muito do Abel, aquele time era ofensivo, ia para cima, não tinha medo, e aconteceu aquilo. Ficou aquela marca. Que pena o Abel não ter conseguido levar o Inter ao título da Libertadores. E quis o destino que em 2006 ele voltasse para o Inter e nos levasse ao título da Libertadores e, mais do que isso, ao título Mundial contra o Barcelona.
Então, a história do Abel no Inter parece um livro, porque é uma história fantástica, com esse capítulo inicial de tragédia e depois o capítulo vencedor, mais bonito impossível, ganhando do Barcelona, o melhor time do mundo na época. Detalhe também que o Leomir, que era jogador dele em 1989, que perdeu o pênalti, era o auxiliar quando ele voltou e foi campeão. Para mim, é o Abel meu técnico na história.
Modelo de dirigente
O Inter vive em uma mentalidade de anos já, que o pessoal chama de caciques, que são dirigentes que mandam e desmandam no clube, como se fossem donos do Inter, então tenho um pouco de ranço geralmente com dirigentes por causa dessa falta de diálogo com os próprios conselheiros e com a torcida, uma certa falta de humildade. Mas é claro que tivemos vários bons dirigentes, a grande maioria foram bons dirigentes, acredito.
Não tenho nenhum ídolo entre os dirigentes ou que seja a minha preferência, mas acho que quem ficou na história foi o Ildo Meneghetti, que é o patrono do clube, que foi muito importante na década de 1930 e alavancou a construção dos Eucaliptos. Foi um período muito difícil para o Inter como clube, como instituição, que teve de ceder a Chácara dos Eucaliptos, e o Ildo Meneghetti capitaneou essa construção dos Eucaliptos, ajudando inclusive com recursos financeiros.
Então, para mim, ele é o meu preferido na história do Inter. Mas não chego a ter um dirigente como ídolo ou exemplo a ser seguido. Sou um cara de muito diálogo e gosto muito de escutar os outros, formular ideias a partir de opiniões de várias pessoas. Não gosto muito de figuras de uma pessoa só. Nosso Conselho de Gestão será bem democrático, as decisões serão bem debatidas, escolhidas por maioria, então essa pergunta do dirigente fico devendo um ídolo, mas para mim o mais importante é o Ildo Meneghetti.
Extravagância para assistir ao Inter
Na década de 1990 eu ia muito no portão seis, onde ficava a camisa 12, e ficava sempre ali ao lado da 12. Sou aquele torcedor que gosta de cantar junto com a torcida durante o jogo, de extravasar. Nos últimos tempos tenho ido bastante ao portão sete. Ali, agora, tem o setor sem cadeiras. Inclusive, o Povo do Clube foi o protagonista na criação desse setor sem cadeiras, nós que lutamos por isso e conseguimos cumprir essa demanda.
Extravagâncias teve uma que não faz muito tempo, faz uns cinco ou seis anos, em que fui com alguns amigos a Veranópolis, no Gauchão, e chegamos lá e o ingresso era caríssimo, algo em torno de R$ 100, e eu estava com alguns parceiros que estavam mal de grana, e não tínhamos dinheiro para entrar, e atrás de umas goleiras do estádio do Veranópolis tem umas lajes, que para subir precisava dar um pezinho um para outro, um negócio meio alto, até perigoso, mas aí fui lá com esses amigos. Assistimos o jogo de lá, se não me engano foi 1 a 1. Essa foi uma que não consegui entrar o jogo, mas vi de fora.
A viagem mais cansativa acho que foi Inter e Boca, na Bombonera, em que a gente acabou perdendo, em 2005. Tomamos 4 a 2, se não me engano. Foi uma viagem longa, fui no ônibus de uma torcida organizada, mesmo não sendo componente, então era aquela algazarra, aquela confusão, então foi bem cansativa a viagem. Teve para La Plata, contra o Estudiantes, naquele final da Sul-Americana, gol do Alex de pênalti. Acho que essas são as que mais me lembro fora do comum.
Por que é candidato
Quero ser presidente do Inter porque acredito muito no nosso projeto, em primeiro lugar. Entrei na política do Inter em 2014, depois da fundação do Povo do Clubes, em 2012, um movimento oriundo das arquibancadas do Beira-Rio, da alma do Beira-Rio. Um movimento diferente dos outros.
Com a entrada no Conselho, em 2014, a gente viu que tinha muita coisa errada. A gente chegou exigindo transparência, fiscalizando, e fomos barrados na nossa tentativa de fiscalização. Pedimos acesso a notas fiscais, pedimos o cumprimento do orçamento, e gestão após gestão nada disso é feito. O clube anda deficitário ano após ano, as gestões não cumprem os orçamentos, não valorizam a identidade popular do Inter, apesar de termos conseguido mudar bastante isso desde que entramos.
A nossa primeira ação foi colocar no estatuto do Inter o slogan de Clube do Povo e o mascote Saci, que não tinha no estatuto do Inter. Criamos a modalidade associativa Academia do Povo. A gente teve uma rápida passagem na gestão em 2017, eu fui o responsável pela aprovação e pela implementação dessa modalidade, que hoje é uma realidade. Os torcedores que ganham até dois salários mínimos pagam R$ 10 por mês e R$ 10 por jogo. Então trazer o povo de volta ao Beira-Rio é um obsessão nossa, porque sem o povão lá dentro não é o Sport Clube Internacional. Então o povão sempre vai estar com a gente lá dentro quando chegarmos à gestão. Essa nossa passagem pelo Conselho Deliberativo e pela gestão mostrou que o Inter merece muito mais, que a gente tem que fazer, não pode ficar esperando acontecer.
Temos as propostas e já mostramos que em uma curta passagem pela gestão fizemos tudo que nos propusemos a fazer, que foi a criação dessa modalidade associativa popular, a reconstrução do futebol feminino, a criação do setor sem cadeiras. A gente entrou para fazer isso, foi lá e fez em menos de um ano. E saímos da gestão porque a gente discorda da maneira como o Inter é gerido. Sem democracia, muitas vezes de forma amadora.
Nosso projeto tem quadro pilares, que são a profissionalização, a identidade popular, a democracia e a transparência. Temos propostas e planos de ação concretos para cada um desse pilares. Outra coisa é a valorização das categorias de base do Inter. A gente vai ter a missão de fazer das categorias de base do Inter a melhor do Brasil, uma referência na América do Sul. Isso vai ser uma obsessão para nós e isso passa, é claro, pela profissionalização com a contratação de profissionais que entendem do assunto, de ponta. Vamos criar uma vice-presidência de categorias de base também, que hoje não tem, para pensar na base 24 horas por dia. Então é por isso que quero ser presidente do Inter, porque acredito muito no projeto do Povo do Clube. Nosso projeto está acima de nomes.