Fabiano Leismann chegou ao Beira-Rio em março quase como um anônimo. Terceiro lateral-direito do Palmeiras, ele foi cedido para um Inter que até então tentava se encontrar na temporada. Apesar de ter no currículo boas passagens por Chapecoense, por Cruzeiro, além de ter feito o gol que deu ao Palmeiras o título do Brasileirão de 2016, Fabiano não foi uma contratação empolgante. Até porque, um mês depois, o Inter ganhou as manchetes nacionais ao assinar com Zeca. Também lateral-direito. E uma contratação bem mais rumorosa.
Pois, com o passar dos meses, Zeca perdeu espaço no time, e Fabiano ficou com a lateral direita da equipe de Odair Hellmann. E nada indica que o alemão com cara de brabo, de poucos sorrisos, barba ruiva, e quase 1m90cm de altura, perca a posição. Fabiano deu estabilidade ao lado direito da defesa colorada. Dificilmente comete erros, mantém uma regularidade impressionante, e, por vezes, se torna uma arma mortal nos avanços com Nico López.
Catarinense de São João do Oeste - cidadezinha de pouco mais de seis mil habitantes, quase na divisa com o Rio Grande do Sul -, Fabiano é o orgulho local. O município foi colonizado por agricultores de origem alemã, muitos deles recém-chegados ao Brasil, ingressando através do Rio Grande do Sul, e que, nos anos 30, compraram terras a preços baixos para habitar a região. Segundo dados do IBGE, São João do Oeste possui um nível de alfabetização de 99,5%, um dos maiores do país. Fabiano e o irmão gêmeo, Cristiano, foram alfabetizados pelos pais. Inácio e Janete, em alemão e, na escola, em português.
— Minha cidade fica distante 140 quilômetros de Chapecó. Algo como 97% da população só fala em alemão. É a primeira língua, a mais falada na cidade. Quando eu vou para lá, sempre converso com os meus amigos e com a minha família em alemão - conta Fabiano. - Quando eu estava no Palmeiras, com o Zé Roberto, e o Barrios, que tinham jogado na Alemanha, descobri que o que eu falo é um dialeto, e que o alemão que eles aprenderam lá, era diferente do meu. Mas dava para compreender, se a pessoa falar um pouco mais devagar, você consegue compreender tranquilamente - diverte-se o lateral.
Genoma colorado
De certa forma, Fabiano sempre esteve ligado ao Inter. Explica-se. Aos 14 anos, quando o então zagueiro que disputava peladas com os amigos de São João pensou mais sério sobre o futebol, ele procurou o Genoma Colorado, na cidade vizinha de Itapiranga-SC, algo como meia-hora de ônibus, entre um município e outro.
— Com o Genoma, fomos campeões estaduais e ficamos em terceiro no Brasileiro da categoria. Depois disso, o meu treinador e os amigos sugeriram que eu tentasse levar o futebol como uma profissão. Foi então que coloquei na cabeça que seria um atleta profissional - conta Fabiano.
Do Genoma Colorado, Fabiano receberia a sua primeira chance num clube profissional em Ijuí. O São Luiz o contratou para os juvenis. Entre subidas e descidas da base para o time principal do São Luiz, acabou sendo contratado pela Chapecoense. Aos 19 anos de idade, o zagueiro Fabiano voltava ao oeste catarinense. Em 2011, a primeira conquista: campeão catarinense com a Chape.
Relação com a Chapecoense
A Chapecoense também foi um clube-chave na formação de Fabiano. Já havia sido transformado pelo técnico Gilmar Dal Pozzo em lateral-direito quando os dois participaram da incrível ascensão do clube que, num prazo de três temporadas, deixou a Série C e se classificou para a Série A.
— Toda a minha base havia sido como zagueiro, e também no primeiro ano de profissional na Chapecoense. Foi só em 2012, com a chegada do Gilmar Dal Pozzo, que eu fui deslocado para a lateral. Fui me adaptando - lembra Fabiano.
Em 27 de novembro de 2016, Fabiano, já defendendo o Palmeiras, e depois de fazer carreira no Cruzeiro, reencontrou os seus companheiros de Chapecoense. O jogo, no Alianz Arena, foi vencido pelo Palmeiras por 1 a 0, com gol de Fabiano, batendo por cobertura na saída do amigo e goleiro Danilo. Foi também o gol do título nacional. O eneacampeonato palmeirense. Dois dias depois, o voo que levaria a delegação da Chape a Medellín para enfrentar o Nacional, não chegou ao destino original. Fabiano perdeu o amigo Danilo e muitos outros companheiros, na maior tragédia do futebol mundial.
— Saí de um momento feliz, alegre, conseguindo ganhar o Campeonato Brasileiro e, horas depois, passei pelo momento mais triste da minha vida, ao saber do acidente. Ao saber que 71 pessoas haviam morrido. Ao saber que o Danilo, com quem eu tinha uma grande amizade, havia morrido. Sempre vai ficar marcado na minha vida, por ter feito o último gol no Danilo, por termos conversado depois daquele jogo - lamenta.
Bicampeão brasileiro?
Fabiano pode ser considerado uma das "zebras" de 2018. Ninguém imaginaria que ele desbancaria Zeca e, com méritos, seria um dos pilares da terceira defesa menos vazada do Brasileirão (antes do início desta rodada, o Inter havia sofrido 20 gols, contra 18 de Palmeiras e de Grêmio).
— Aqui, no Inter, há um respeito muito grande por parte de todos os jogadores. Todos respeitam o momento do companheiro. Independente de quem está tendo a oportunidade, todo mundo está se respeitando, e torcendo pra que aquele que entra faça o seu melhor dentro de campo. E isso está dando os frutos - diz o lateral.
Com a bagagem do título nacional de 2016, Fabiano entende que o Inter de Odair Hellmann está na rota do título. Restam nove rodadas para o fim da temporada e os colorados precisam recuperar os três pontos de déficit que têm para o Palmeiras. Para o lateral-direito titular do Inter, ainda dá tempo:
— Estamos em um momento bom. O time está confiante, e isso nos dá a certeza de estarmos no caminho certo, fazendo um bom trabalho, sempre respeitando os adversários, impondo o nosso ritmo, a nossa maneira de jogar. É um momento de bastante concentração. Nesta reta final não pode existir erro porque são momentos decisivos, todos os jogos são de grande importância, e vão ser decididos no detalhe. Cada jogo vai ser uma decisão.
A primeira decisão para o Inter de Fabiano, o orgulho de São João do Oeste, se avizinha. Nesta segunda-feira (22), às 20h, o Inter recebe o Santos no Beira-Rio. E, uma vez mais, é obrigado a vencer para seguir sonhando com o tetracampeonato do clube e o bicampeonato de Fabiano.