Elenco com nomes importantes. Folha salarial entre as mais altas do país. Finanças em ordem. Uma final nacional a poucos dias de distância. Esse era o quadro do Grêmio no primeiro dia de 2021. Pouco a pouco o cenário foi sendo desconstruindo a ponto de no último dia do ano o clube e o time estarem em reconstrução para disputar a Série B na próxima temporada. Nada que não tenha sido vivido no passado, mas imaginava-se que não faria parte da realidade gremista tão cedo.
Foram 365 dias de frustrações e esperanças despedaças. Um ano marcado pelo terceiro rebaixamento, pelas trocas de técnicos e por um futebol minúsculo se comparado com aquele apresentado nos momentos vitoriosos nem tão distantes assim.
Foram 86 partidas disputadas, com 31 vitórias incapazes de evitar o pior desfecho desde 2004, 18 empates e 31 derrotas. Exatos 50% de aproveitamento. Com a queda para a Segunda Divisão, o título do Campeonato Gaúcho não serviu nem de consolação para um 2021 de derrotas marcantes e vitórias efêmeras.
Abaixo confira uma retrospectiva do ano gremista.
Janeiro
O ano chegou com o Grêmio na quinta colocação no Campeonato Brasileiro. A busca por uma vaga à Libertadores parecia ter uma situação cômoda. A vantagem para o Santos, primeiro clube fora do G-6, era de cinco pontos. O time de Renato Portaluppi tinha 12 rodadas para defender a vantagem.
Um mês e oito jogos depois, o clube estava na sétima colocação, ainda na zona de classificação, esticada pelo título da Libertadores pelo Palmeiras. O primeiro mês do ano teve duas vitórias na arrancada, seguidas de uma sequência sem vencer, com quatro empates e duas derrotas.
Fevereiro/Março
Para quem ainda não percebia, fevereiro deu mais sinais de que o bom momento tinha ficado para trás. O Brasileirão terminou com o Tricolor na sexta colocação e uma vaga para as fases preliminares da Libertadores. A chance de cair direto na fase de grupos era vencer a Copa do Brasil.
A esperança virou pó. Na Arena, derrota para o Palmeiras por 1 a 0. Na volta, os palmeirenses venceram por 2 a 0. Entre um jogo e outro, a direção anunciou a renovação de contrato do técnico Renato Portaluppi até o final do ano.
Além do abalo pela perda do título, havia uma frenética sequência de jogos pela frente. A temporada 2020 recém tinha terminado, mas a de 2021 já tinha começo. Ensanduichado pelas partidas decisivas, o time gremista estreou no Gauchão.
Três dias depois do segundo jogo da decisão, os jogadores estavam em campo para enfrentar o Ayacucho pela Libertadores. O calendário recheado teve uma conta alta para um elenco repleto de atletas acima dos 30 anos.
Temporada 2021
Técnicos
Em ano em que pouco funcionou em campo, a troca de treinadores era tão certa quanto os resultados ruins. Em 2021, o Grêmio teve quatro técnicos. Nem Renato, nem Tiago Nunes, nem Felipão, nem Vagner Mancini. Nenhum dos quatro integrantes do quarteto conseguiu encontrar soluções que fizessem o time ser consistente. Alexandre Mendes e Thiago Gomes também assumiram a equipe como interinos.
Renato Portaluppi
Passou 2016, 2017, 2018, 2019, 2020, começou 2021 e Renato estava no banco de reservas tricolor. Mesmo que o time tenha perdido a volúpia de suas primeiras temporadas no comando, o ídolo seguia com controle do vestiário. Nem mesmo um Brasileirão com resultados abaixo do desejado e a derrota no primeiro jogo da final da Copa do Brasil abalaram o seu status.
Antes da segunda partida, a direção anunciou um novo acordo com o treinador. A convicção na continuidade do trabalho durou pouco. Ao cair na última fase preliminar da Libertadores para o Independiente del Valle, na Arena, o trabalho do treinador foi interrompido. Nos últimos jogos, Renato, isolado por ter contraído a covid, sequer comandou o time em campo.
O camisa 7 que virou estátua encerrou sua terceira passagem como o treinador que mais vezes comandou o clube. Ao todo foram 308 partidas, com 161 vitórias, 82 empates e 65 derrotas.
Tiago Nunes
Depois de anos com Renato, a direção buscou Tiago Nunes para ser a peça-central no vestiário da Arena. A intenção era trazer um profissional com ideias mais modernas e um futebol um pouco mais vertical. Não funcionou.
O treinador, apesar de ter vencido o Gauchão, não resistiu ao começo com ausência de vitórias no Brasileirão. Contratado em 21 de abril, Tiago foi demitido em 4 de julho. Um dos empecilhos alegados em seu período à frente do time foi um surto de covid que atingiu o elenco. Além de jogadores, o técnico também foi vítima do vírus em um momento considerado importante para a solidificação do trabalho. Foram 20 jogos, venceu 10, empatou cinco e perdeu cinco, contabilizando 58,3% de aproveitamento.
Luiz Felipe Scolari
Se o novo não funcionou, o Grêmio foi em busca do experiente. Três dias após a queda de Tiago Nunes, Luiz Felipe Scolari foi anunciado como novo treinador. Nome histórico do clube, Felipão foi apresentado na véspera do clássico Gre-Nal do Brasileirão.
O 0 a 0 na Arena contra o maior rival foi um aperitivo do que seria o trabalho de Scolari. Com a equipe em má fase, o treinador fechou a casinha para assegurar um pontinho. A tentativa de montar um sistema defensivo sólido e matar os jogos no erro do adversário funcionou algumas vezes e falhou em tantas outras.
Felipão assumiu um time na lanterna do torneio com somente dois pontos em oito partidas. A distância para respirar fora do Z-4 era de seis pontos. Nos primeiros minutos de 11 de outubro, o treinador teve sua saída oficializada após nova derrota, desta vez para o Santos. A situação pouco tinha mudado. De lanterna, o Grêmio passou para a penúltima colocação. A salvação tinha caído para cinco pontos de distância. Sob a gestão dele, o time foi eliminado na Sul-Americana pela LDU.
No meio do caminho, Luiz Felipe se tornou o segundo técnico com mais partidas pelo clube — atrás apenas de Renato. Foram 21 jogos, com nove vitórias, três empates e nove derrotas.
Vagner Mancini
Junto com Felipão deixou o departamento de futebol o vice da pasta Marcos Herrmann. Vagner Mancini e Dênis Abrahão preencheram as lacunas. A dupla tinha 14 partidas para tirar o Grêmio da lama da zona do rebaixamento.
Tentando encontrar uma fórmula para a salvação, Mancini mexeu bastante no time. Testou diferentes formações e sistemas táticos. Deu a Gabriel Grando, ex-Gabriel Chapecó, a titularidade do gol gremista, até então de Brenno. Em meio a vitórias improváveis e derrotas evitáveis, o treinador não conseguiu evitar o rebaixamento.
Personagens
Maicon
Um dos símbolos da fase vencedora do Grêmio, Maicon não foi mais o mesmo. A batalha contra os problemas físicos virou a sua rotina. Passou mais tempo no departamento médico do que em campo. Foram somente 16 partidas na temporada. Apesar da pouca presença nos jogos, o volante seguia como líder do vestiário.
"Estava tudo caminhando para o fim do contrato, mas ter sido dispensado assim foi pesado. Quase sete anos de clube depois de tudo. Mas paciência"
MAICON
em sua despedida do clube
Em 30 de agosto a direção optou por encerrar a sua história com a camisa tricolor. Meses depois, Dênis Abrahão criticou a decisão de o clube ter demitido uma das lideranças do elenco e, indiretamente, apontou a decisão como um dos motivos para a falta de reação da equipe no Brasileirão.
Dias depois de colocar um ponto final da sua passagem pela Arena, o meio-campista voltou ao estádio para se despedir dos colegas e conceder uma entrevista coletiva, em que não escondeu a sua emoção com o momento.
Diego Souza
Ele voltou a ser o artilheiro do time, o que não significa que tenha tido um ano só de altos. Passou boa parte da temporada acima do peso. Em alguns momentos, teve sequência de atuações apagadas, o que fez com que a direção fosse em busca de outro centroavante. Da Colômbia chegou Borja.
Na hora em que a água estava acima do pescoço, o colombiano pouco contribuiu. Diego assumiu a responsabilidade e, apesar das limitações físicas, batalhou para manter vivas as chances de permanecer na elite do futebol brasileiro. Seu esforço e seus 24 gols no ano foram insuficientes para um final de ano mais animador.
Precisando reformular o elenco e reduzir pela metade a folha salarial, o clube não renovou o contrato com o seu artilheiro nos últimos dois anos.
Desempenho
Gauchão
Continuidade foi tudo que o Grêmio não teve no Gauchão. Foram quatro profissionais diferentes comandando o time na beira do gramado. Renato Portaluppi, Alexandre Mendes, Thiago Gomes e Tiago Nunes fizeram parte da campanha do tetracampeonato estadual. A estreia no Regional ocorreu antes de a temporada 2021 ser finalizada. O 4 a 1 sobre o Brasil-Pel foi disputado entre os dois confrontos decisivos da Copa do Brasil.
Na primeira fase, o Tricolor teve a melhor campanha. Na semifinal, passou sem maiores problemas pelo Caxias. Na final, manteve a hegemonia estadual sobre o Inter. Venceu no Beira-Rio por 2 a 1, com gols de Diego Souza e Ricardinho. Depois, o 1 a 1, com gol de Ferreira, foi o suficiente para levantar a taça na Arena. Após o jogo, o lateral Rafinha e o centroavante Diego Souza tocaram uma música provocando os colorados. A filmagem bombou nas redes sociais.
Ainda no âmbito regional, o Grêmio angariou mais um troféu para sua galeria. Com um time de garotos, conquistou a Recopa Gaúcha ao aplicar 3 a 0 no Santa Cruz. Os gols foram marcados por Gui Azevedo, Léo Pereira e Jhonata Robert.
Copa do Brasil
O 2020 gremista terminou com o time classificado à final da Copa do Brasil, ao empatar em 0 a 0 com o São Paulo, em 30 de dezembro. Era melhor o ano não ter virado. A ida à decisão e a chance do hexa foi a primeira grande ilusão vivida pelos tricolores em 2021. Nos dois jogos diante do Palmeiras, o time de Renato não teve chances.
Na ida, derrota por 1 a 0 na Arena. Em São Paulo o destino foi o mesmo. Desta vez, por 2 a 0. A Era Renato estava próxima de terminar, apesar de o treinador ter renovado contrato dias antes do confronto de volta diante dos paulistas.
Libertadores
O Grêmio foi longe na Libertadores, mas somente na distância. Nas fases preliminares, o time viajou até o Peru. Na sequência, quando estava às portas da fase de grupos, desembarcou no Equador.
O desconhecido Ayacucho foi o primeiro oponente. De estrutura precária, os peruanos levaram 6 a 1 na Arena. Com uma temporada colada na outra, a direção deu alguns dias de folga para os principais nomes do elenco antes da partida de volta. Fora de casa, mesmo com uma equipe descaracterizada, o Grêmio venceu por 2 a 1.
Mais tradicional, o Independiente del Valle se mostrou um adversário além das capacidades do time gremista, vencendo os dois jogos por 2 a 1, primeiro no Equador, depois em Porto Alegre. A eliminação resultou na demissão do técnico Renato Portaluppi, desvinculado do clube mesmo não tendo comandado a equipe por estar se recuperando da covid.
Sul-Americana
A queda prematura na Libertadores levou o Grêmio a disputar a Sul-Americana. Na prática, o torneio pouco agregou à temporada gremista. Além de inflar ainda mais o abarrotado calendário de jogos, sair do torneio logo nas oitavas de final serviu para aumentar a pressão sobre a equipe.
A fase de grupos não teve percalços. Conquistando 16 dos 18 pontos possíveis, o Tricolor se classificou com facilidade em um grupo que contava com Lanús, La Equidad e Aragua. Nas oitavas de final o encontro foi com a LDU.
A vitória por 1 a 0, gol de Léo Pereira, fora de casa, não foi suficiente para construir situação confortável para a volta. Na Arena, os jogadores de Luiz Felipe Scolari levaram 2 a 1 e foram eliminados no saldo qualificado, regra abolida pela Conmebol para a temporada 2022.
Brasileirão
Nada disso era tão ruim que não pudesse piorar para o Grêmio. Nada foi mais cruel do que a trajetória gremista no Brasileirão. Nos nove primeiros jogos, nada de vitória. No meio da sequência, o trabalho de Tiago Nunes ficou pelo caminho. A arrancada fez com que, desde os primeiros dias do torneio, o clube fosse um morador da zona de rebaixamento.
A partir da arrancada ruim, o clube passou a seguir a "cartilha do rebaixamento", aquele conjunto de regras não escritas que geralmente são repetidas na tentativa de evitar a visita à Serie B. A primeira medida contratar um ídolo. Felipão foi chamado para evitar o pior.
O novo/velho treinador estreou em um empate sem gols no Gre-Nal do primeiro turno. No segundo, vitória chorada sobre o Fluminense. Parecia que iria engrenar, mas ficou na aparência. Na média, os resultados de Scolari não foram suficientes para mudar o panorama. Apresentado na véspera do clássico, Felipão ficou até a derrota por 1 a 0 para o Santos, em 10 de outubro.
Então, mais algumas normas da cartilha foram colocadas em prática. O treinador foi demitido e com ele também caiu o departamento de futebol. Dênis Abrahão assumiu a vice-presidência da pasta. O dirigente fechou com Vagner Mancini para apagar o incêndio.
Mancini tinha a missão de em 14 jogos tirar cinco pontos de vantagem para o primeiro clube fora da zona de rebaixamento, à época o Santos. A estreia foi com vitória por 3 a 2 sobre o Juventude.
A esperança foi machucando o torcedor na reta final. Quando a queda parecia inevitável, uma vitória trazia a fé de que a salvação era possível. Assim foi após o resultado sobre o Juventude, o 1 a 0 sobre o Fluminense e os 3 a 0 sobre Bragantino e São Paulo. Nada disso foi o suficiente.
O clube também travou uma batalha no STJD após torcedores invadirem o gramado após a derrota para o Palmeiras. Em três partidas a Arena ficou com portões fechados para o torcedor.
Na rodada final, era preciso vencer o Atlético-MG e torcer para derrotas do Bahia e do Juventude. O 4 a 2 sobre o Galo teve a companhia do 2 a 1 do Fortaleza no Bahia, mas a vitória do Juventude por 1 a 0 sobre o Corinthians sacramentou a terceira queda.
10 jogos marcantes
- Palmeiras 2x1 Grêmio - Copa do Brasil 2020
- Grêmio 1x2 Independiente del Valle - Libertadores
- Grêmio 8x0 Aragua - Copa Sul-Americana
- Grêmio 1x1 Inter - Gauchão
- Grêmio 1x2 LDU - Sul-Americana
- Santos 1xo Grêmio - Brasileirão
- Grêmio 3x2 Juventude - Brasileirão
- Inte 1x0 Grêmio - Brasileirão
- Grêmio 3x0 São Paulo - Brasileirão
- Grêmio 4x3 Atlético-MG - Brasileirão
Continuidade
Apesar do rebaixamento, a direção gremista aprovou o trabalho de Vagner Mancini. Em 13 de dezembro, o clube confirmou a permanência do treinador para a temporada 2022. Mancini tem, agora, a missão de tirar o Grêmio do lugar em que foi contratado para evitar que o clube fosse.