Passava da meia-noite quando o link para entrar no grupo "Protesto aeroporto hoje" apareceu no meu WhatsApp. Vou preservar quem compartilhou — assim como farei com as identidades dos integrantes, até porque é impossível saber se os nomes de usuários correspondem a quem, de fato, teclou ou enviou áudio. Cliquei no link e me vi em um universo diferente do que estou acostumado, e olha que faz parte de minha rotina interagir com torcedores.
O grupo manteve uma média de 300 membros, sendo quatro administradores. Era praticamente impossível selecionar mensagens, a tela rolava tão rápido com a entrada de novas pessoas ou com postagens, quase todas de reclamação quanto ao desempenho do time de Renato Portaluppi, que minutos antes havia perdido para a Universidad Católica. O objetivo dos "organizadores" era bem claro: levar o máximo de gente possível ao aeroporto para reclamar dos jogadores, do treinador, do presidente e de quem mais aparecesse.
Muitos citaram como exemplo o protesto feito por corintianos, que há uma semana foram a Guarulhos intimidar os atletas. "Ja reservei uma barra de ferro aqui e vou levar o meu canhao" (sic), escreveu um, "Tem que quebrar esses p... na porrada", digitou outro, ambos com a tecla caps lock ligada. A esses, seguiram-se outros exaltados falando em rojão, soco e outras ações, digamos, mais físicas. Aos poucos, vozes (e teclas) ponderadas apareceram. "Amanha vamos protestar somente no grito sem quebrar nada temos nossas familias que nao merecem nos ver presos por causa de Renato e seus bruxos" (sic), pediu alguém, igualmente em letras maiúsculas. Esse também ganhou apoio da turma que queria reclamar mais na base da voz e do barulho.
Entre ameaças mais e menos exaltadas, um dirigente do Grêmio se manifestou. Avisou que estava acompanhando as conversas e ameaças de invasão e agressão. Solidarizou-se com a indignação dos demais, mas alertou que não seria tolerada violência, que as autoridades seriam avisadas e que policiais militares monitoravam o grupo. Isso ajuda a explicar o forte aparato que recebeu a delegação na chegada do Chile.
Seguiu-se, claro, desaforo. E alguns até mudaram o tom. Conforme os minutos passavam, a indignação foi dando lugar a outras conversas. Todo tipo de assunto apareceu. O mais curioso foi quando um rapaz (ao menos é o que diz o nome) lamentou que "tudo o que queria era uma namorada gremista". Isso causou indignação ("o time nessa situação e o cara pensando em mulher") e uma resposta "oieee estamos aí".
O foco do papo, porém, era outro. A ira contra Renato, jogadores e dirigentes dominava o assunto. Muitas soluções apareceram, de mudança na gestão do futebol a demissões de jogadores e, claro, troca de comissão técnica. Roger e Tiago Nunes batiam cabeça a cabeça como os mais lembrados.
Alguns minutos mais tarde, com os ânimos menos exaltados, voltaram as participações. Mas a ordem era voltar ao foco do grupo, organizar o protesto. Mas, afinal, a que horas voltaria o Grêmio? Entre tantas fake news e desinformação, tinha gente prometendo passar a madrugada esperando o voo pousar. Prints, falsos e verdadeiros, pipocaram, até que a informação correta aparecesse. O grupo foi, novamente, fechado.
Dormi.
Quando acordei, eram 1.241 mensagens. Àquela altura, metade da manhã, o debate era saber se iriam ao aeroporto ou ao CT. Eles queriam ser ouvidos. Novos prints fakes, mas muito bem feitos, reconheço, diziam que Romildo Bolzan tinha convocado uma entrevista coletiva para as 18h, e havia expectativa por demissões e contratações (claro que o assunto Cavani voltou).
Aquele monte de desinformação só poderia resultar no que, de fato, resultou: na hora que o avião chegou, havia três torcedores no aeroporto. Entre a lista de quem iria para o aeroporto e a dos que preferiam o CT, os gritos foram, mesmo, na Arena. Não passaram de cantos de protesto, sem quebradeira ou pancadaria.
Depois da manifestação, já na noite de quinta-feira, o grupo vivia seu momento mais tranquilo. "Éramos" apenas 140. Alguns poucos ainda falavam em ir ao CT nesta sexta. Mas a voz de uma moça fez a lembrança que muitos precisavam: "Gurizada, brigar com jogador não dá muito certo. Ir lá só pra 'cachorrear' os cara não dá. Vamos tentar apoiar porque, cara, o Gre-Nal tá chegando".