Nesta semana, GaúchaZH ouve treinadores que passaram pela dupla Gre-Nal neste século para relembrar histórias de bastidores de suas passagens por Porto Alegre e saber mais sobre a continuidade de suas carreiras.
A aposta em Tite, técnico vindo do interior gaúcho, se mostrou certeira no Grêmio. Contudo, após um ano e meio de Estádio Olímpico, o treinador foi demitido. Na tentativa de repetir o acerto, em 2003, a diretoria buscou Nestor Simionato, mais um profissional acostumado às agruras do futebol gaúcho. Sua passagem pelo vestiário gremista foi curta, no entanto, durando somente um mês.
Simionato deu continuidade à carreira até encerrá-la em 2014, no União Frederiquense. Hoje, vive ao lado da família no município de Bom Retiro do Sul. Avesso a entrevistas, aceitou conversar com GaúchaZH para contar o motivo que o fez se aposentar do futebol e relembrar sua passagem como comandante tricolor.
Por que você se afastou do futebol?
Militei por quase 40 anos no futebol, seja como atleta ou treinador. Gosto de falar de futebol, mas não de expor minha vida, falar da minha vida particular. Comecei a jogar com 15 anos no Tupi de Crissiumal, depois fui para as categorias de base do Grêmio. Rodei pelo Brasil e depois virei treinador. Em todo este tempo, vivi dentro de estádios, em um ambiente intenso, que traz bastante estresse. Você abdica da família em nome da carreira. Isso me cansou um pouco, acabei hipertenso e, no ano de 2016, descobri um câncer. Passei por cirurgia e um tratamento prolongado e, graças a Deus, fui curado. Aí meus filhos e minha esposa reivindicaram que eu deixasse o futebol para viver uma vida mais tranquila, mais próximo deles. Como não dependo do futebol para sobreviver, optei por parar de trabalhar como técnico. Até ouvi o Falcão dizer que jogador de futebol morre duas vezes. Eu não tive esse problema. Não tenho apego a mídia, a publicidade. Hoje, tenho noção de que tomei a melhor decisão da minha vida. Estou com saúde sobrando e até jogo pelada com os meninos aqui onde eu moro.
Não tenho apego a mídia, a publicidade. Hoje, tenho noção que tomei a melhor decisão da minha vida.
NESTOR SIMIONATO
técnico gremista em 2003
As pessoas ainda te reconhecem na rua como ex-técnico do Grêmio?
Sim, em vários lugares onde chego, quando preciso me identificar, principalmente os torcedores do Grêmio me reconhecem. Eles perguntam muita coisa, alguns até pedem foto e autógrafo. Isso acontece bastante. Há poucos dias, em uma agência do INSS, o menino que me atendeu é de torcida organizada do Grêmio e me pediu para tirar uma foto. Eu gosto.
Em 2003, você pegou uma equipe que foi montada pelo Tite e que tinha grandes jogadores no elenco, como Tinga, Danrlei, Christian. Foi o ápice de sua carreira?
Eu trabalhei muito no Interior antes de chegar ao Grêmio. Fui do mesmo grupo de treinadores do Tite, Mano Menezes, Celso Roth. Nos enfrentávamos pelo interior do Estado. Assim como eles, eu também cheguei. É difícil vir do Interior e ser contratado por um clube do tamanho do Grêmio. E eu consegui isso por meus méritos, por trabalhar muito. Sem dúvidas, foi o ponto mais alto que tive em toda minha trajetória. Claro que as coisas não aconteceram como eu sonhava, porque teve todo um contexto. O Grêmio vinha de eliminação na Libertadores, de uma crise financeira violenta, um desmonte do time montado pela patrocinadora que saiu. Naquele ano, o Grêmio ainda escapou do rebaixamento. Era um ciclo que estava se encerrando e eu peguei o final. Não deu tempo de montar um novo ciclo, como o Mano fez depois. Mas sou grato a tudo. Foi uma experiência maravilhosa, embora curta. Isso nos traz crescimento.
Hoje, aposentado, você tem algum time do coração?
Não, não tenho clube do coração. Se eu tivesse alguma espécie de dívida de gratidão, teria de fazer isso ao Grêmio, onde me criei desde os 16 anos, trabalhei como técnico e tenho vários amigos até hoje. Mas não sou torcedor, porque quando você vira profissional, principalmente como técnico, você perde o vínculo.
Mas você segue acompanhando futebol então?
Sim. Embora eu esteja afastado, olho tudo. Acho até engraçado que, quando sento para ver jogo com meus amigos, eles mais me questionam do que assistem ao jogo. Porque olho o jogo por um outro ângulo, de quem trabalhou por muito tempo com futebol, sem paixão. Assisto a todos os campeonatos do mundo, porque, por mais que eu não queira trabalhar com isso, pelo menos agora, não sai tão fácil assim. Às vezes, você sai do futebol, mas o futebol não sai de você.