Dentro de campo, os gremistas tiveram apenas motivos para sorrir neste domingo (24). Com a goleada de 6 a 0 sobre o Juventude, a equipe virtualmente selou sua presença nas semifinais do Gauchão. Por isso, fica difícil entender a briga entre duas torcidas organizadas do Grêmio, que resultou em uma pessoa baleada, nos arredores do Estádio Alfredo Jaconi, em Caxias do Sul. O problema é justamente este: não se trata de um fato isolado. As duas torcidas organizadas, Geral do Grêmio e Máfia Tricolor, já vêm protagonizando confrontos há, no mínimo, uma década.
A rixa teria se iniciado em 2008, quando dissidentes da Geral, descontentes com um suposto pagamento de salários aos líderes desta torcida, se aliaram à Máfia. Pelo Brasileirão daquele ano, inclusive, após partida contra o Coritiba, um enfrentamento nas imediações do Estádio Olímpico resultou em dois integrantes da Máfia baleados. O incidente gerou uma operação da Polícia Civil, em que três pessoas ligadas à Geral do Grêmio foram presas. Outros seis permaneceram foragidos — entre eles, Bruno Pisoni Garcia, baleado neste fim de semana na Serra.
Em 2013, Garcia (conhecido pelo apelido de Cabeludo) chegou a ter seu nome citado em matéria de GaúchaZH que apresentava recibos assinados por ele e Rodrigo Marques Rysdyk (o Alemão da Geral), totalizando um repasse de mais de R$ 1,1 milhão direto dos cofres do clube para os dois líderes da organizada. O fato teria ocorrido entre 2011 e 2012, durante a gestão de Paulo Odone, que alegou à época que os pagamentos eram ajuda de custo para organização de viagens.
Desde então, inúmeras confusões foram protagonizadas pelas duas partes, incluindo na inauguração da Arena, em dezembro de 2012. O confronto mais recente havia ocorrido no clássico Gre-Nal válido pelo Brasileirão do ano passado, disputado no Beira-Rio. Como de costume, os torcedores gremistas foram orientados a se encontrar na Arena para que, de lá, dentro de ônibus, fossem escoltados pela Brigada Militar até o estádio do rival. Porém, membros da Geral resolveram fazer o trajeto a pé, do Estádio Olímpico ao Beira-Rio. No caminho, entraram em confronto com membros da Máfia em uma lancheria na rua Botafogo, no bairro Azenha.
Das duas organizadas, apenas a Geral é reconhecida pelo Grêmio, justamente por apresentar uma liderança responsável por interlocuções junto ao clube e poder público. Quem responde pela torcida atualmente é Leonardo Araújo, conhecido pelo apelido de Di Caprio. Garcia deixou de representar a Geral quando, apesar de ser conselheiro do clube, envolveu-se em uma briga na esplanada da Arena, em fevereiro de 2016, em partida contra o Novo Hamburgo, pelo Gauchão. Identificado pelas câmeras de segurança, foi indiciado e condenado ao final daquele ano a um ano e nove meses por "promover tumulto, praticar e incitar a violência". Acabou recorrendo e teve a pena convertida em dois anos e quatro meses de regime aberto. No último dia 13 de março, quando seria comunicado de que teria de se apresentar à delegacia duas horas antes de cada partida disputada pelo Grêmio, não compareceu à audiência. Sua aparição se deu justamente neste domingo (24), identificado após internação em um hospital em Caxias do Sul, depois de levar dois tiros do lado de fora do Estádio Alfredo Jaconi.
Fillipy Rocha e Renan Mello Pinto, detidos em flagrante e que serão indiciados por tentativa de homicídio e porte ilegal de arma, respectivamente, são ligados à Máfia Tricolor. Um terceiro membro, identificado como Cristian Vianna Garcia, também foi levado para prestar depoimento, mas acabou liberado.
— O trabalho que o Ministério Público vem fazendo é de responsabilizar os envolvidos em atos de violência. E os enfrentamentos de grupos de torcedores também são apurados com as responsabilizações previstas no Estatuto do Torcedor — comenta Márcio Bressani, titular da Promotoria do Torcedor.