O Real Madrid não é sempre bicho papão. Não amassa todos os seus adversários. Não goleia em todos os jogos. O Al Jazira, com seu desempenho surpreendente na semifinal, mostrou bem.
A fama de imbatível do time de Zinedine Zidane, calcada no bicampeonato europeu e na constelação de estrelas que o técnico tem à disposição, tornou-se menos crível desde o início da atual temporada europeia. O Real faz uma campanha irregular. Mistura desempenhos arrasadores com tropeços em que parece apenas uma sombra da equipe avassaladora dos últimos anos.
As oscilações fazem o Grêmio sonhar. Há possibilidade de uma surpresa no sábado. E três equipes têm algo a mostrar a Renato. GaúchaZH analisou três partidas em que o Real foi derrotado para entender como o bicho pode não ser tão papão assim.
Real Madrid 0x1 Real Betis
Liga Espanhola, 21 de setembro de 2017
1) O que o Betis fez sem a bola?
Há algo em comum entre os três adversários do Real analisados: a preocupação em marcar as estrelas de Zidane desde o início das jogadas. Isso significa adiantar a marcação, algo que o Betis fez em vários momentos do jogo no Bernabeu — especialmente no início.
Não significa que tenha sido uma pressão, uma marcação agressiva. Mas foi suficiente para negar espaços, tolher a liberdade de talentos como Kroos e Modric, que costumam ser os fiadores de um primeiro passe preciso e lúcido.
Vencer aqui sem sofrer é uma utopia.
QUIQUE SETIÉN
Técnico do Betis, sobre jogar no Santiago Bernabeu
Evidente que, quando o Real passava por essa primeira linha de marcação, o Betis, em bloco, recuava para recompor as linhas e não ficar vulnerável em uma região próxima ao próprio gol. Ainda assim, o time sofreu forte pressão e contou com a sorte em alguns momentos, e com a competência do goleiro Adán em outros. Só assim para resistir a 27 finalizações dos madrilenhos sem sofrer gol.
— Para vencer aqui você sabe que irá sofrer, e sabe que o goleiro tem de ser espetacular. Vencer aqui sem sofrer é uma utopia — resumiu, à época, o técnico do Betis Quique Setién.
2) O que o Betis fez com a bola?
Paciência. Esta é a chave para entender como o Betis se portou quando teve a bola no pé para jogar. Triangulações, passes curtos, aproximação entre os jogadores. Em alguns momentos, a estratégia foi importante para esfriar o ânimo do Real, fazer a linha defensiva respirar. Em outros, o toque de bola foi tão preciso que resultou em chances criadas.
E, nos minutos finais do jogo, resultou no gol. Nos acréscimos do segundo tempo, quando a pressão do Real era intensa, o Betis tomou a bola e não se apressou. Foi fiel à estratégia traçada desde o início da partida e trabalhou com passes de um lado ao outro do campo. O lance terminou com um cruzamento da direita que encontrou Sanabria na área, sozinho, para completar de cabeça para o gol.
3) O que o Grêmio pode repetir?
Da estratégia do Betis sem a bola, a marcação na frente, desde que repita, também, o recuo rápido quando o Real passar por esse primeiro combate, pode ser importante para o Grêmio.
É algo que o time se acostumou a fazer desde 2015, com Roger, e que esteve ausente diante do Pachuca, especialmente no primeiro tempo. Mas o Grêmio sabe marcar adiantado com eficiência. Há riscos nessa estratégia? Evidente. Basta o Real trocar passes em velocidade, que evitem essa marcação, para que se arme um contra-ataque veloz. Só que mais arriscado será deixar os talentosos meio-campistas do Real comandarem o jogo lá de trás, como gostam de fazer.
Com a bola, a ideia do Betis se encaixa com perfeição ao que é o Grêmio de Renato. Trocas de passe com paciência, sem acelerar a todo momento, é algo que marca a trajetória gremista até a final do Mundial.
Girona 2x1 Real Madrid
Liga Espanhola, 29 de outubro
1) O que o Girona fez sem a bola?
Coragem. Não há palavra melhor para entender o que fez o nanico Girona na histórica vitória do fim de outubro. Se o Betis avançou para tirar espaços e quebrar a fluidez do toque de bola do Real, o Girona foi agressivo, pressionou lá em cima, desestabilizou a saída do poderoso rival.
O tipo de marcação foi semelhante ao que o Grêmio adotou diante do Lanús, a partir do segundo tempo da final na Arena. Encaixes individuais apressaram zagueiros, volantes e laterais do Real, causando erros de passe. Os dois pontas, Portu e García, "atacavam" os zagueiros, enquanto o centroavante Stuani recuava para pegar o primeiro volante. Os alas avançavam para tirar espaços dos laterais. O time inteiro se adiantava no campo.
O risco era evidente. E o Real fez o Girona pagar quando abriu o placar. O lance começou com Benzema recuando para receber a bola às costas dos volantes. A partir daí, armou-se um contra-ataque na situação de três contra três. Isco finalizou. A dificuldade do time de Zidane para sair da pressão, porém, foi o que deu combustível para o Girona virar o placar.
2) O que o Girona fez com a bola?
A ideia do Girona foi tentar aproveitar eventuais fragilidades defensivas do meio-campo formado em losango por Zidane. Os quatro jogadores do setor costumam se movimentar juntos, ficando sempre próximos da bola. O que significa que uma inversão rápida de bola, de um lado ao outro, permite que o ponta receba a bola e enfrente o lateral do Real no um contra um.
Assim, o Girona apostou nessas jogadas de flanco, sucedidas por cruzamentos para a área, para insistir e permanecer próximo ao gol de Casilla.
3) O que o Grêmio pode repetir?
Talvez o risco de uma marcação tão agressiva, tão adiantada, seja demasiado para o Grêmio no sábado. Funcionou para o Girona, mas em um momento em que a estratégia carregava o fator surpresa. O jogo mostrou, também, uma certa displicência nos movimentos do Real, o que contribuiu para o sucesso do time da casa. Em uma decisão, com o Real mais ligado, a cena do contra-ataque merengue que gerou o primeiro gol pode se repetir várias vezes.
Com a bola, a ideia de forçar pelos flancos não é das piores. A questão é que o Grêmio não se caracteriza por recorrer a muitos cruzamentos, o que dificultaria a vida da equipe no momento de finalizar as jogadas.
Tottenham 3x1 Real Madrid
Liga dos Campeões, 1 de novembro
1) O que o Tottenham fez sem a bola?
Assim como Betis e Girona, o Tottenham se preocupou com o início das jogadas do Real. Por mais que o time de Zidane tivesse iniciativa e mais posse de bola no jogo, em nenhum momento os donos da casa permitiram que o adversário os encurralasse atrás.
A chave para que o time madrilenho não fizesse uma forte pressão foi a compactação do Tottenham. A imagem abaixo mostra como os setores da equipe inglesa ficaram próximos. E se havia combate à saída de bola do Real, significa que a linha defensiva também tinha de se adiantar, já que o técnico Mauricio Pochettino não abriu mão dessa compactação.
2) O que o Tottenham fez com a bola?
Ao contrário do Betis, que trabalhou em passes curtos com paciência, o Tottenham foi vertical sempre que teve a bola. A movimentação dos dois atacantes, Dele Alli e Harry Kane, foi decisiva para ligar os contra-ataques.
Os dois sempre buscavam se apresentar para receber a bola no início dos contragolpes. Deslocavam-se para os lados e para trás, confundindo a marcação e encontrando largos espaços para avançar. Alli foi o destaque individual do jogo, com dois gols.
Outro ponto explorado pelo Tottenham foi a marcação falha do lado esquerdo da defesa do Real. O ala Trippier se projetou várias vezes sem a bola para receber lançamentos às costas de Marcelo, a exemplo do que fez no primeiro gol, em que cruzou para a finalização de Alli.
3) O que o Grêmio pode repetir?
Ficar com os setores próximos, reduzindo espaços para o Real trabalhar a bola, é uma das chaves para o Grêmio no sábado. O Real tem vários jogadores que adoram encontrar vazios no campo entre os setores. Isco e Cristiano Ronaldo, por exemplo, são mestres em fazer times descompactados pagarem por suas falhas de posicionamento.
Já a estratégia do Tottenham com a bola não combina muito com este Grêmio que trabalha a bola com passes curtos. O time de Renato não tem, ao menos entre os titulares, jogadores com as características dos atacantes do time londrino. Talvez no segundo tempo, com uma eventual entrada de Everton, o Grêmio consiga emular os rápidos contra-ataques da vitória do Tottenham em Wembley.
Te prepara, Grohe
Mesmo com as derrotas nos três jogos, a média de finalizações do Real Madrid foi de 20,33
A bola é deles
Nas três partidas, o Real Madrid ficou com a bola 61,43% do tempo
Por cima
O Real Madrid não conseguiu vencer na estatística de disputas pelo alto em nenhum dos três jogos. Contra o Girona, houve empate em 12 a 12 neste quesito. Betis e Tottenham foram superiores ao Real pelo alto.