Recostado em um dos sofás do café do Hotel Hilton Colón, em Quito, na manhã de quinta-feira, ao lado do filho, Romildo Neto, o presidente Romildo Bolzan Júnior era só sorrisos. Afinal, horas antes, o Grêmio havia vencido a LDU, superado a altitude equatoriana e carimbado seu passaporte para as oitavas de final da Libertadores. Em entrevista exclusiva a ZH, Bolzan fala sobre o futuro do clube, a possibilidade de reeleição, a compra da Arena, os frutos de sua política de austeridade financeira, o novo contrato de TV, que ele entende ter sido o maior negócio da história do Grêmio, e a organização do futebol brasileiro e sul-americano. Mas, sobretudo, mostra a visão de quem entende de futebol. E de quem tem um objetivo bem traçado para a temporada:
– O Grêmio não pode passar mais um ano sem ganhar nada. Estamos obcecados por um título.
Qual é o significado desta classificação?
Foi uma classificação em cima de um adversário bom, na casa dele, com dois componentes de muita dificuldade que foram a altitude e o campo pesado. Mas nós não ganhamos nada. A única coisa que dá é a possibilidade de jogar as oitavas. E, ainda assim, temos de ganhar do Toluca para tentar pegar um adversário cujo embate não seja tão duro. É claro que avançar na Libertadores tem uma vantagem financeira. Ganha mais recursos, mas também há o gasto da logística. Trabalhamos pela busca do campeonato. O Grêmio não pode passar mais um ano sem ganhar nada. Estamos obcecados por um título.
Leia mais:
Dedicação de fisioterapeuta do Grêmio deixou Walace em condições de
enfrentar a LDU
Em alta, Luan vira líder de assistências do Grêmio
Vice jurídico do Grêmio critica liberação de William: "Ocorreu de forma ilegal e arbitrária"
Há preferência por adversário nas oitavas?
Não temos preferência. Depois que jogamos no grupo da morte, conseguimos classificação antecipada e seremos um bom segundo colocado se vencermos o Toluca, não temos direito de escolher ninguém. Mas admito que você pode melhorar sua performance e ter menos riscos. Tem um cenário de vitória, outro de empate e outro de derrota. O que desejo é que a gente possa construir uma alternativa para jogar as oitavas sem componentes externos. Sem altitude e ambientes que influenciem negativamente a partida.
Essa é a Libertadores do Grêmio?
Não acho. Acho muito difícil. A Libertadores deste ano tem os clubes de maior camiseta de todos os seus países. É a Libertadores mais consistente, onde os clubes, mesmo que os times sejam razoáveis, têm mais capacidade de superação. Talvez seja a Libertadores em que tudo pode acontecer. O Grêmio não está nem pior e nem melhor do que ninguém.
E a renegociação das cotas na Libertadores?
Isto é um processo em andamento. A Liga Sul-Americana não tem um viés de organização de campeonatos. É exclusivamente negocial. E acho que está correto. Para que haja avanço nestas situações, a Conmebol teria de ter a sensibilidade de abrir suas contas. Tudo aquilo que representa receita que compõe a possibilidade de premiação. No momento em que a gente tiver isso, vamos saber o percentual que eles com os clubes na Libertadores, Sul-Americana e Recopa. Acho que existe margem para melhorar a premiação.
Na sua opinião, a Libertadores agora se paga?
Se paga. Mas não é um campeonato extremamente lucrativo. O campeão vai se pagar bem, as fases se pagam. Mas poderia ser bem mais rentável. Tu não pode fazer campeonato para enriquecer federação ou confederação. Tu tem que fazer campeonato para fortalecer cada vez mais os clubes, para que eles façam times cada vez melhores. Esta é a lógica de quem organiza o futebol. Eu não torço para federação ou para a CBF. Torço é para o meu clube. A federação que tire seu custeio e organize sua vida. Não precisa viver de uma maneira muito nababesca. O futebol deve ser privilegiado.
A Liga Sul-Americana pode repetir a Primeira Liga?
A Primeira Liga teve um viés de organização. Acho que não há ambiente no futebol sul-americano para organização. Mas há ambiente negocial. Assim como uma liga brasileira, talvez em um primeiro momento, se tiver um viés negocial, pode ser melhor que um ambiente de organização. Mas o Brasil tem um conceito diferente. E os clubes desejam organizar. Se isso acontecer, pode ser bom para todo mundo.
Como você avalia a realização da Primeira Liga?
Achei a Primeira Liga talvez o fato futebolístico mais importante no país nos últimos tempos. Não chegou a ser uma insurreição, mas teve no final uma autoafirmação: viemos aqui, batemos pé, queremos organizar o campeonato, temos o direito de fazê-lo e ninguém vai nos impedir. Fomos vitoriosos. Uma mostra de que podemos realizar campeonatos sem a oficialidade da CBF.
A Primeira Liga vai crescer no próximo ano?
Vai crescer. Mas temos de criar uma condição de compatibilização com os campeonatos estaduais. No Rio Grande do Sul, já coloquei isso ao presidente da federação e vi que tem espaço para isso. De fazer uma nova reorganização dos financiamentos do campeonato gaúcho, onde Grêmio e Inter ingressem a partir das quartas de final. Nunca, na discussão da Primeira Liga, admitimos não participar do Gauchão. Na cultura do futebol gaúcho e na forma da contextualização dos clubes no Interior, é extremamente importante jogar. É a mobilização das comunidades sobre seus clubes.
O calendário não ficará ainda mais apertado?
Se você tira 10 datas do estadual, pode colocar na Primeira Liga e todo mundo sobreviverá. O Grêmio atuou em dois jogos com time misto na Primeira Liga este ano. Tivemos que fazer uma opção para não atrapalhar nossa situação de calendário. Acho que o futebol brasileiro deveria se adaptar ao calendário europeu. Acho isso extremamente importante. Não vejo porque não fazer. Isso eliminaria os riscos de desequilíbrio técnico quando clubes perdem jogadores para a Europa e também quando trazem atletas que voltam de lá.
E o mata-mata no Brasileirão? É possível?
O ideal seria uma fórmula que contemple todas as experiências que tivemos até os dias de hoje. Tivemos classificatório depois mata-mata, mata-mata puro. Não sou daqueles que acha que só devemos ter mata-mata na Copa do Brasil. Depois, veio esta fase de pontos corridos no Brasileiro. Acho que você pode fazer a simbiose das fórmulas. Penso que o ideal seria classificar os campeões de cada turno e os dois melhores pontuadores. Aí você faz um playoff e dali sai o supercampeão brasileiro. E os quatro estariam na Libertadores. Em todos os momentos, você pode se recuperar na competição.
Como foi a renegociação das cotas de TV?
A coisa mais importante foi a disputa das emissoras. Não era mais possível ter tanto desequilíbrio. O Grêmio, em relação à Globo, recebeu a primeira proposta em setembro do ano passado. Avaliamos e recusamos, era uma mera prorrogação até 2020 com uma antecipação de receita de R$ 30 milhões que retirava 25% dos recursos do contrato. Teve clube que aceitou, por necessidade de caixa. Quando entrou o Esporte Interativo, a Globo alterou o conceito. E aí criou uma perspectiva de divisão por mérito. O Grêmio negociou dentro do perfil que entendeu o melhor para si.
Acabou o abismo em relação a Corinthians e Flamengo?
Vai diminuir bastante. Acho justo remunerar quem mais contribui, quem tem mais torcida. O que não pode é ter um desequilíbrio total. Mas premiar por ter mais audiência é justo. Mesmo os clubes que estavam na ponta deste processo, estão participando deste conceito novo do futebol brasileiro.
Além das luvas de R$ 100 milhões, serão R$ 140 milhões anuais?
Um pouco menos. Mas os contratos são abertos, temos novas mídias que foram anexadas a este contrato que ainda não temos mensuração. A gente estima estima um valor um pouco menor que esse. Nós avaliamos este novo contrato com a Globo como o maior de todos os tempos que o Grêmio assinou. O valor está diluído em seis anos, mas é o maior contrato individual que o Grêmio já assinou em toda sua existência.
Esse contrato dará equilíbrio financeiro ao Grêmio?
Dá, de certa forma, ao Grêmio, uma receita de perenização. Temos a projeção do que a gente terá nos próximos anos. Dá uma estabilização. E o Grêmio tem a capacidade de fazer sua readequação financeira. Avançamos no ano passado, limpamos muitas coisas do balanço. Criamos uma organização contábil e esperamos chegar ao final do ano com o equilíbrio do clube. Não só contábil, mas também com fluxo de caixa. Se a gente atender estas situações, vamos ter a capacidade de investimento que ainda não temos. Vamos chegar ao final do segundo ano de gestão próximos do equilíbrio geral do clube.
O Grêmio vai vender algum jogador no meio do ano?
Podemos nos desfazer? Podemos. Deveremos fazer isso? Deveremos até. Mas também quero ver o lado desportivo. O Grêmio passou a ser um clube formador e acho que estes jogadores, antes de saírem do clube, precisam dar resultados desportivos. Jogadores novos, se a proposta for absolutamente irrecusável, eu sento na mesa. Mas se for uma oferta que não vai resolver os nossos problemas, prefiro ter estes jogadores dentro do Grêmio, tirar tudo aquilo que eles podem dar ao clube e fazê-los vitoriosos aqui. O resultado desportivo deles, para nós, é muito mais importante que o caixa.
E sobre contratações? Só virão reforços para a defesa?
Creio que não temos, neste momento, necessidade de complementar do meio para frente. Como saiu o Kadu, talvez a gente precise de mais um zagueiro. E se você comprar um zagueiro, busca um para disputar titularidade. A dupla de zaga hoje, com Geromel e Fred, é muito eficiente. Estamos contemplados, mas a tendência do nosso elenco é ter muitos convocados, seja seleção olímpica ou principal. E isso vai nos desfalcar com lesões e cartões amarelos. Por isso, temos de ter um plantel maior para não sofrer declínio técnico. Precisamos de um zagueiro e um lateral-direito.
O que falta para fechar com o Emilio Zeballos?
O conceito da operação, principalmente. Os valores, os percentuais de compra dos direitos econômicos do jogador e o preço final. A questão salarial com o jogador já avançamos bastante. O que falta é a gente interpretar tudo isso e os dois clubes finalizarem esta negociação, prazos de pagamento. Não é que falte muita coisa, mas faltam coisas essenciais ao negócio. Basicamente o preço e o percentual dos direitos que cada clube ficará. O Defensor não admitiu o empréstimo. Então, o Grêmio passou a trabalhar numa linha de aquisição do jogador. Como não deve ser possível(Atualização: Na sexta-feira, o Grêmio condicionou a conclusão da negociação com a possibilidade de registrar o jogador. , o clube cogita desistir do acerto)
Trazer Miller Bolaños foi o maior lance da sua gestão?
Foi o maior arrojo. A gente teve a experiência com o Cristian Rodriguez, que, pela lesão, não deu dividendos nem ao clube e nem ao jogador. Foi uma situação para tentar vencer o Gauchão. Mas não tenha dúvida que comprar o Bolaños foi o lance mais arrojado da nossa gestão. A gente só tinha uma bala para gastar, gastamos nele e acho que o Grêmio muda de patamar com um jogador deste porte. Ele está muito valorizado e vai para a Europa. É questão de tempo, a gente sabe. Mas antes tem que dar resultado aqui no Grêmio.
Você já está trabalhando na sua reeleição?
Não trabalho a reeleição. Ao mesmo tempo que não trabalho a reeleição, posso dizer que, se todo o processo do Grêmio avançar como está avançando, nós podemos trabalhar a ideia de tentar mais um mandato. Mas isto está ligado diretamente ao sucesso das políticas administrativas, aos títulos e à compra da Arena. Estes três processos são indissociáveis da perspectiva de repetição de mandato. Se deu resultado, tem mais uma chance. Se não deu, o contexto tem de ser muito favorável para continuar.
Como anda este processo da compra da Arena?
É um processo que anda. Ele avança muito, mas, pela recuperação judicial da OAS, ainda não tem prazo para ser definido. Continua andando, avançando, sendo trabalhado. Estamos avançando para a finalização do negócio.
A recuperação judicial ajudou ou travou a compra?
Em um primeiro momento, atrapalhou muito. Em um segundo momento, tende a deixar as coisas mais fáceis. No início, foi extremamente difícil, até você interpretar e saber os resultados que vinham. Mas agora que o plano de recuperação foi aceito e a forma negocial com que isso estabeleceu a venda dos ativos da OAS, principalmente as Arenas, tornou as coisas mais claras. E pode ser um elemento facilitador do negócio.
Os bancos estão colocando dificuldades no negócio?
Isto tudo está sendo harmonizado, equacionado. Como são muitos interesses, tem um tempo para que isso aconteça. Mas posso te dizer que as coisas estão avançando positivamente, sem um prazo definido. A conclusão poderá ocorrer ainda no ano de 2016.
Vocês buscam um parceiro externo para viabilizar a compra?
O Grêmio vai tentar se resolver dentro daquilo que foi estruturado pelo presidente Fábio Koff. A gente sempre procurou uma estrutura de negócio que implicasse no refinanciamento de tudo. E, com a capacidade de pagamento que o Grêmio tinha, e poderá ter, além das garantias que o Grêmio tem. Este conjunto de situações é que dará ao Grêmio a sustentação. Não teremos parceiros, mas sim uma capacidade de pagamento no curso do tempo que permitirá ao Grêmio ser dono da operação do estádio.
Acompanhe o Grêmio no Gremista ZH. Baixe o aplicativo:
*ZHESPORTES