A Federação Gaúcha de Futebol (FGF) apresentou, na tarde desta terça-feira (14), a campanha "Juntos - Contra a Violência e o Preconceito". Será uma série de ações ao longo de todo o ano com o objetivo de combater a discriminação no futebol.
Além de vídeos de conscientização, a iniciativa vai qualificar os delegados e servidores que trabalham nas delegacias de estádios de todo o Estado. O Ministério Público, a Polícia Civil e a OAB também fazem parte do projeto.
O número de whatsapp (51) 98444-0606, da Polícia Civil, foi disponibilizado para receber denúncias. O resultado buscado pela campanha, segundo a Chefe da Polícia Civil do RS, Delegada Nadine Anflor, é abranger todos os envolvidos na situação.
— A gente não foca só na vítima, dizendo que ela tem de denunciar, não foca apenas no agressor, dizendo que ele não pode fazer mais aquilo, focamos em todos as pessoas que frequentam estádios, criando uma grande corrente pelo fim da discriminação no Estado — comentou Nadine.
Nesta quarta-feira (15) se iniciaram os treinamentos dos agentes da Polícia Civil que trabalham em jogos, começando pelos de Porto Alegre. A qualificação terá dois momentos.
O primeiro é teórico, a partir de uma cartilha que explica as tipificações criminais. O material diferencia juridicamente — com exemplos das mais comuns — as situações de injúria racial, religiosa e racismo, entre outras que também estão na mira da campanha.
A segunda etapa do treinamento será uma mesa de conversa com o objetivo de sensibilizar os agentes que recebem as denúncias em delegacias e estádios. Segundo a Delegada Shana Hartz, diretora do Departamento de Proteção a Grupo de Vulneráveis da Polícia Civil, é necessário uma abordagem focada em tornar o ambiente mais acolhedor aos que são atingidos ou presenciam ocorrências:
— Tanto denunciantes quanto vítimas. Que ninguém ache engraçado, que ninguém se cale. Que tragam este problema para a Polícia. O constrangimento tem de ser do agressor, e não para quem foi agredido.
A proposta da FGF é de que a campanha siga durante todo o ano nas competições por ela organizadas — desde as categorias de base. Além disso, os agentes policiais qualificados seguirão trabalhando na Arena e no Beira-Rio, em jogos do Brasileirão, Libertadores, Copa do Brasil e demais competições da dupla Gre-Nal.
O presidente do Inter, Marcelo Medeiros, e o vice do Conselho Deliberativo do Grêmio, Alexandre Bugin, representaram as equipes da Capital no evento. Ambos falaram sobre a importância da campanha da Federação relacionando-a com projetos próprios. Medeiros relembrou a origem inclusiva do Colorado como clube, e ressaltou a cooperação que tem desempenhado no combate a violência nas arquibancadas junto a Promotoria do Torcedor do Ministério Público Estadual.
— Toda a sociedade gaúcha está engajada para que se tenha mais tolerância e um ambiente mais civilizado nas praças esportivas — pontuou, completando: — A pessoa que não tem um comportamento adequado para frequentar um estádio de futebol tem problemas para conviver em sociedade.
Alexandre Bugin destacou a necessidade de manter ações a longo prazo. Desde 20 de novembro, dia da consciência negra, o Grêmio trabalha com a iniciativa "Clube para Todos". O projeto visa utilizar as plataformas de comunicação para combater os preconceitos.
— É um trabalho muito longo, permanente. Não será de um ano para o outro que vai se transformar o cidadão. O preconceituoso, o racista, eles têm de se sentirem excluídos da sociedade — alertou Bugin.
O presidente da FGF, Luciano Hocsman, explicou que a inciativa começou a ser pensada em 2019, quando a FIFA estabeleceu novas posturas contra o racismo. Ele diz que a campanha foi planejada para ir além da preparação dos árbitros que apitarão o Gauchão 2020.
— A ideia é uma ação propositiva, preventiva, e não reativa. Sempre vemos algumas ações que ocorrem pontualmente quando há algum tipo de ocorrência preconceituosa. Então é pegar pela conscientização da sociedade, do torcedor, para que isso não ocorra. Vamos trabalhar com isso durante todo o ano para chegar ao final do ano com outro cenário, que não o que aconteceu em 2019 — ponderou.
Com novas orientações para os juízes, o ano de 2019 registrou o maior número de denúncias de racismo no futebol brasileiro. O Observatório da Discriminação Racial do Futebol, coordenado por Marcelo Carvalho, contabilizou 56 casos de injúria racial.
— No momento político que o Brasil e o mundo vivem, de discursos de intolerância, o cidadão acha que também pode reproduzir isso, e o estádio de futebol reflete. Por outro lado, vejo maior conscientização de torcedores e jogadores — opinou Carvalho, acrescentando:
— Uma ação nunca vai ser suficiente se as punições não forem, de fato, executadas. Se a pena não existir, o torcedor vai seguir com o sentimento de impunidade.