A volta dos estaduais neste final de semana traz um debate que se perpetua ano após ano: qual é a real utilidade destes campeonatos para os clubes? Tanto os menores quanto os gigantes do nosso futebol sofrem com os atuais formatos e calendários. Talvez seja necessária uma transformação que sirva por igual a todos os interesses envolvidos.
É preciso primeiro olhar para todas as perspectivas. Os clubes pequenos precisam jogar o ano inteiro. Os grandes precisam focar nas competições que lhe são importantes. A imprensa precisa de conteúdos para gerar notícias. E o público gosta de jogos interessantes e da rivalidade.
A média de público nos estaduais é baixíssima. O campeonato de maior sucesso é o Paulista, que tem média de público de 7.880 por jogo. O Pernambucano, tem média de 3.585 por jogo. E o Gaúcho, de 3.966. Isso nos últimos cinco anos. Sendo que são campeonatos de tradição, com times grandes nas capitais e no interior.
Este ano, a detentora dos direitos de transmissão não transmitirá jogos de meio de semana, e já se sabe que não transmitirá mais os campeonatos a partir de 2020, por serem deficitários para o grau de investimento da TV.
Sendo realizados no começo da temporada, o nível técnico e tático dos times geralmente é bem irregular. Para os times grandes, uma lesão ou falha na preparação nessa época pode comprometer o planejamento em torneios mais importantes. Sendo que temos mais de 600 clubes no Brasil envolvidos, o que fazer para transformar a realidade dos estaduais?
FUTEBOL RAIZ: RIVALIDADE LOCAL
Durante muitos anos, partimos da premissa errada que o mais importante do estadual é quando o time grande vai até o interior jogar contra o time local. Pensava-se que assim geraria renda ao pequeno clube e a torcida local poderia ver os “ídolos” do time da capital.
Nada é mais raiz no futebol que a rivalidade local. Ela que gera a economia, que sustenta ideias e paixões, que faz o torcedor sair de casa para ir ao estádio. Um BaGuá ou um BraPel por exemplo, tem muito mais força e importância do que quando a dupla GreNal vai até Bagé ou Pelotas enfrentar algum dos locais.
Precisamos resgatar as rivalidades locais! Valorizar esses embates para que as comunidades possam voltar a investir em seus clubes, e estes poderem voltar a serem sustentáveis. No final dos anos 70, Campinas (SP) viveu uma época de ouro da sua economia local graças à rivalidade entre Guarani e Ponte Preta, gerando vários craques nos dois times e ambos chegando a finais importantes.
O MUNDO MUDOU
Hoje a tecnologia permite novas formas de gerar recursos financeiros e os clubes podem se aproveitar das plataformas de streaming, video on demand (VOD) e over-the-top (OTT) para ganhar dinheiro - por exemplo, a plataforma Footters que na Espanha transmite online jogos das divisões menores e monetiza aos clubes diretamente.
Assim, fortalecidos pelo comércio e indústria local além da renda das novas tecnologias, os clubes podem se tornar mais independentes da verba da TV (a qual vai acabar, inclusive). O que não impede negociar jogos com outros canais que possam se interessar.
Talvez os estaduais tenham que ser transformados nas Séries E e F do Campeonato Brasileiro. As famosas Quinta e Sexta divisões nacionais. Jogos o ano inteiro, pontos corridos, turno e returno, separados por grupos regionais até chegar em etapas nacionais, nos moldes da atual Série D do Brasileirão.
Os times que estão nas Séries A e B Nacional participariam com seus times de transição ou times B, como fazem os grandes da Europa, poupando os principais jogadores para as competições maiores (e aproveitando estas para valorizar a base e testar contratações). Sem rebaixamento para estes.
Assim, o Corinthians B e o Flamengo B por exemplo, jogariam contra os menores de São Paulo e Rio na quinta divisão nacional. Permitindo que essas marcas visitem as cidades do interior, mas principalmente, que os clubes pequenos tenham chances reais de serem campeões nas suas divisões.
É só uma ideia que sustento há muitos anos e que depende de muita vontade política e costura dos clubes e federações para dar certo. Mas essas forças, juntando-se, conseguem organizar patrocinadores, novas tecnologias e estimular mais rivalidades locais e impulsionar aos clubes que são a base do futebol brasileiro.
Pode ser que os estaduais estejam em cheque, mas a paixão nunca morrerá. Ela só precisa ser cuidada e alimentada por todos que fazem parte dela.