Faltavam sete minutos para acabar o clássico catalão Barcelona contra Español naquele sábado 16 de outubro de 2004, quando o técnico Frank Rijkaard fez a última substituição da partida. Tirou o brasileiro naturalizado português Deco, autor do gol da vitória por 1 a 0, e colocou uma jovem promessa da base, um argentino ainda menor de idade.
Dezoito anos depois daquele dia, Lionel Messi completará, neste sábado (3), sua milésima partida oficial como jogador de futebol. E será em grande estilo: às 16h (horário de Brasília e de Buenos Aires), estará com a camisa 10 da seleção de seu país no confronto com a Austrália pelas oitavas de final da Copa do Mundo.
Pedimos licença da parte poética, do simbolismo que esta partida terá, para apresentar os dados frios. Falamos de matemática mesmo. O jogo de número 1 mil é atestado pelos dois clubes que defendeu, Barcelona e PSG, e pela seleção principal do país, além de seu próprio site oficial. Na Espanha, foram 778 jogos; na França, 53; na Argentina, 168. Não incluem partidas não-oficiais nem de categorias de base (ou com alguma limitação de idade).
Em 147 dos 999 jogos que disputou, fez dois gols. Em 47, poderia pedir música no Fantástico — anotou três vezes. Em oito partidas, balançou as redes quatro ou mais vezes. Ao todo, tem, até agora, 788 gols e 345 assistências. É como se um jogo, com Messi em campo, começasse já 1 a 0 para seu time.
Estatísticas assim só poderiam se refletir em 41 títulos coletivos e 78 prêmios individuais. Na atual Copa do Mundo, apenas dois jogadores têm mais partidas do que ele: Cristiano Ronaldo (1.179) e Daniel Alves (1.078), e ambos estiveram em campo nesta sexta-feira.
Esses são os dados, os números, as marcas. Mas há muito mais em campo nesse milésimo jogo. Desde 2004, o mundo tem assistido estarrecido a revolução que Messi causa no futebol. A perna esquerda afiada, o zigue-zague entre zagueiros e o faro de gols (e fazer isso tão bem e por tanto tempo) lhe deixam em um patamar elevado na comparação com outros craques. Foram poucos que conseguiram se manter no topo há mais de uma década e meia.
Nesses 1 mil jogos a serem completados neste sábado, Messi também foi um revolucionário. E não é fácil conseguir isso em equipes como o Barcelona e como a seleção argentina. "Mais do que um clube", diz o slogan do time que teve Rinus Michels, Johann Cruyff e Pep Guardiola.
Mais difícil ainda é ser um herói no país de Perón, Che e Maradona (e isso ainda vai ser tema mais à frente). Especialmente tendo passado só 13 anos na Argentina. E estar há 24 na Europa. Mas Messi conseguiu, com o talento puro, renovar o ânimo do povo. Um país, que ficou carente desde que Diego parou, aposta tudo na presença de Messi. Sem ele, tudo será ainda mais complicado.
Guardiola brincou inúmeras vezes que deve algumas garrafas de vinho a Lionel pelos "muitos contratos que conseguiu". Em uma das comparações, acabou citando, involuntariamente, a inspiração dessa série de reportagens, o Chicago Bulls dos anos 1990, e a Última Dança. Disse Pep:
— Muitas vezes, quando Messi atacava, me senti como Phil Jackson quando a bola estava com Michael Jordan. Era a tranquilidade de saber que tudo funcionou.
O técnico catalão, aliás, é dono de uma frase que talvez resuma Messi no futebol contemporâneo:
— Ele é tudo.
Mil vezes tudo.