Fundada em 1944, a Escola Estadual Antão de Faria é uma das cem escolhidas pelo governo do Estado para receber o projeto-piloto de uma parceria público-privada (PPP) focada na gestão da estrutura das instituições. Com 675 alunos, o colégio do bairro Bom Jesus, na Zona Norte de Porto Alegre, enfrenta há anos necessidades de reparos, e a direção espera que a mudança traga uma solução para a situação.
— Se realmente acontecer, eu não acho, tenho certeza de que vai ser maravilhoso. Tenho certeza absoluta, porque, pelo vídeo que eu vi e o pouco que eu sei do projeto, vai ser muito interessante e especial. A escola realmente vai ser grandiosa — diz Mara Denise de Oliveira, diretora da escola.
A equipe da instituição faz o que pode para oferecer o melhor para seus estudantes, mas, com o repasse mensal de R$ 3 mil por meio da autonomia financeira, sendo R$ 1,9 mil usados em gastos fixos, sobra pouco para fazer os reparos e os investimentos necessários. Um exemplo é o corte da grama, que, segundo Mara, custaria em torno de R$ 8 mil, valor inviável de entrar na conta mensal. Com isso, boa parte do pátio do colégio não pode ser usada pelos alunos, porque o mato toma conta e há risco de presença de insetos e animais peçonhentos.
Outros exemplos são pintura, troca de vidros e conserto de pisos e telhado, que acabam demandando processos para pedir ao governo do Estado a contratação dos serviços com recursos extras. A comunidade também se mobiliza para promover eventos como a festa junina, a fim de angariar recursos para melhorar um pouco a situação ao longo do ano.
— Eles amam, esperam o ano todo (pela festa junina). Eles gostam da gente, gostam da escola. Com toda dificuldade que a gente tem, eles valorizam — relata Cristina Barbosa, professora dos Anos Iniciais da instituição.
A Antão de Faria foi a primeira a receber, na semana passada, uma visita técnica, que ocorrerá em todas as cem escolhidas para participar da PPP. O objetivo é fazer um diagnóstico sobre as condições de espaços como salas de aula, quadras, bibliotecas e refeitórios, bem como aspectos estruturais mais específicos, como telhados, instalações elétricas e hidráulicas.
Na vistoria feita dias depois pela reportagem de GZH, foi possível identificar uma escola em apuros. Um prédio anexo ao principal está inutilizado há anos. O auditório está interditado por risco de desabamento da estrutura de madeira, e as formaturas são realizadas há quase 10 anos no saguão de entrada. Uma parte de um dos muros do pátio desabou e foi instalado um tapume, que também começou a cair com a chuva de 16 de janeiro. Em muitas salas, a água entra quando chove, gerando infiltrações nas paredes e causando estufamento no parquet. Na sala da professora Alaídes de Souza Santos, que dá aulas para o primeiro ano do Ensino Fundamental, a água é tanta, que a turma precisa correr para outro espaço nesses momentos.
— Lá, nem precisa de temporal para molhar. E é uma sala de crianças, então tem muitos trabalhos deles nas paredes. E aí é um horror, uma correria. Qualquer chuva alaga lá dentro, daí eu perco materiais, atividades. Estou tirando tudo o que posso das paredes em que eu sei que corre mais água, porque sei que tudo vai ser pedido — lamenta Alaídes.
A rede elétrica da escola é antiga e não tem capacidade de suportar muitos eletrônicos ligados. Por isso, um aparelho de ar-condicionado doado ao colégio, por exemplo, ficou guardado em uma caixa por oito anos. Quando se torna imprescindível instalar algum equipamento, como uma impressora ou um computador, são feitos “puxadinhos” na fiação.
Durante a visita técnica, não houve detalhamento sobre o que será feito no local, o que deve ser sabido em uma próxima etapa (confira o cronograma no final da matéria). A promessa é de resolver todos os problemas e renovar mobiliários de equipamentos de esporte e lazer.
Visitas técnicas
No cronograma apresentado pelo governo em agosto, consta que todos os estabelecimentos de ensino contemplados passariam por esse diagnóstico a partir de outubro de 2023. A etapa das visitas, contudo, foi iniciada no dia 15 de janeiro. A decisão foi de fazer as vistorias durante as férias, para evitar prejuízos às aulas. A previsão é de que um relatório com os resultados apurados seja entregue até o fim de fevereiro, quando começará a elaboração da modelagem econômico-financeira do projeto, para estimar os investimentos necessários.
A escolha das escolas ocorreu a partir de critérios de vulnerabilidade social – todos os municípios abrangidos integram o programa RS Seguro, projeto na área de segurança pública. Em Porto Alegre, serão 33 instituições atendidas. Também serão incluídos Caxias do Sul (8), Santa Maria (8), Alvorada (7), São Leopoldo (6), Viamão (7), Rio Grande (5), Canoas (4), Cruz Alta (4), Gravataí (4), Pelotas (4), Bento Gonçalves (3), Sapucaia do Sul (3), Novo Hamburgo (2) e Cachoeirinha (2). A lista completa das instituições pode ser conferida aqui.
O parceiro privado ficará encarregado de requalificar a infraestrutura das escolas e prestar serviços de apoio que não interferem nas atividades pedagógicas, tais como: conservação e manutenção predial, conectividade, zeladoria, higiene e limpeza, segurança e vigilância, jardinagem e controle de pragas, fornecimento de utilidades, gestão de resíduos sólidos e fornecimento de mobiliário e equipamentos.
O secretário estadual de Parcerias e Concessões, Pedro Capeluppi, salienta que a PPP não é, exatamente, de manutenção, o que se enquadraria mais em um contrato, por exemplo, de reparos em rodovias, no qual o prestador do serviço fica responsável por sanar os problemas por um período determinado. Na concessão prevista para as escolas, há uma previsão de requalificação das estruturas das instituições, além da gestão e manutenção em si dessa infraestrutura. O período, nesse caso, será de 30 anos.
— O responsável pela gestão da infraestrutura será o mesmo que fez o investimento. Ou seja: você alinha o incentivo, para ele ter todo o cuidado quando faz a obra, para que os custos de manutenção sejam menores. Se eu for responsável por fazer a manutenção de uma rodovia, eu vou fazer uma rodovia bem-feita, que precise menos de reparos — exemplifica Capeluppi.
O governo do Estado se inspira em formatos já adotados de PPP na educação em outras redes brasileiras, como a municipal de Belo Horizonte, em Minas Gerais. Lá, a concessão foi iniciada com a construção de 40 escolas, que, depois, foram geridas pela concessionária.
— Todo problema que acontece, a empresa tem que resolver. Se queima uma lâmpada, não é a diretora que tem que cuidar disso. Se quebrou a janela, também não: a pessoa responsável vai lá e inclui no sistema. Coisas que podem afetar o dia a dia da escola precisam ser resolvidas num prazo muito curto, e teremos no contrato um pagamento mensal do Estado pelo serviço que só acontecerá se a concessionária estiver atendendo todos os parâmetros do contrato — explica o secretário.
Além do diagnóstico dos reparos necessários, as visitas técnicas também visam identificar possibilidades de outros serviços nas instituição. Capeluppi diz que equipamentos de lazer e esportivos, por exemplo, poderão ser agregados e até oferecidos, aos finais de semana, para uso dos moradores do entorno daquele colégio. Esses investimentos adicionais, se forem acontecer, precisarão ser definidos com antecedência e ser previstos no edital de licitação.
Confira o cronograma de ações
- Agosto de 2023 – Assinatura do contrato com a SP Parcerias, responsável pelo projeto
- Outubro de 2023 – Primeira fase, que compreende workshops para discussão sobre o projeto e visitas in-loco para o diagnóstico da infraestrutura das cem escolas
- Fevereiro de 2024 – Modelagem do projeto, com a elaboração dos documentos e a estimativa de investimentos e custos de operação
- Abril de 2024 – Discussão do projeto com a sociedade e realização de audiências e consultas públicas
- Agosto de 2024 – Consolidação dos documentos para o edital
- Dezembro de 2024 – Capacitação dos servidores para gestão do contrato
- Fevereiro de 2025 – Licitação
- Abril de 2025 – Assinatura do contrato da PPP
- 2º semestre de 2025 – Início das obras nas escolas