O prédio icônico da Fundação Iberê Camargo, às margens do Guaíba, foi o cenário de um projeto um tanto diferente experienciado, nesta quarta-feira (5), por alunos do Ensino Médio do Colégio Maria Imaculada, de Porto Alegre. Divididos por turmas e séries, os estudantes participaram de uma visita guiada pelas exposições com uma missão que foi além de observar as obras: eles precisavam ficar atentos aos próprios colegas e, usando celulares, capturar imagens deles.
Batizado de Olhar pela Lente do Outro, a iniciativa idealizada pelos professores das disciplinas de Português e Literatura, Artes e Sociologia, em parceria com o setor pedagógico, tem como objetivo provocar a reflexão dos adolescentes. Antes de ingressarem no ônibus rumo ao Iberê, cada aluno sorteou o nome do colega que deveria observar e fotografar durante o passeio. A ideia era instigá-los a olhar para o próximo.
— Estamos trabalhando muito a empatia, ainda mais nessa hora em que a febre é a selfie. Eu não vou me fotografar, mas vou fotografar o outro. Hoje, eles estão fotografando os colegas, colocando-se no lugar deles, dispensando tempo e preocupação ao outro — justificou a professora de Português e Literatura Ludmilla Mazzini.
Trabalhar com um elemento tão familiar como o celular foi proposital, explicou o professor de Sociologia Alessandro Varela. Na avaliação do docente, essa tecnologia pode ter um viés pedagógico, contribuindo para o aprendizado e desenvolvimento dos jovens:
— Não há problema nesse uso pedagógico. Importa o que vamos fazer com esse produto. Que narrativas vamos criar? Aí, entra o pedagógico, o porquê fazer. Não é fazer a foto por fazer, mas, sim, para narrar e contar sobre ela.
Desafio da foto anônima
Às escondidas pelas rampas e corredores, os estudantes tentavam flagrar os colegas sorteados em diversos momentos. A grande dificuldade, apontou a aluna do 1º ano Maria Eduarda Fabião Calixto, era manter o anonimato. Sem muito alarde, a menina de 15 anos se esforçava para clicar o seu alvo durante a visita.
— Tu tens que observar a pessoa e a relação com as obras, mas não pode se mostrar muito interessado (no fotografado). Trabalhamos a foto com a expressão e os sentimentos do fotografado — explicou.
Vitória Bernardi e Eduarda Egert, também de 15 anos, tiveram um desafio extra para concluir a atividade: ambas deveriam fotografar estudantes que ficaram em outro grupo na hora da divisão da turma. Contudo, aproveitaram as brechas em que os cerca de 40 alunos estavam reunidos para cumprir a tarefa.
— Parece que estamos vendo o mundo com outros olhos. A gente se coloca no lugar deles _ destacou Vitória.
Menos shopping, mais museu
Em um ambiente que incita os mais diversos olhares, os estudantes mergulharam no universo das obras de diversos fotógrafos que expõem na FestFoto 2019, como a aranha gigante da francesa Louise Bourgeois e, claro, a estrela da Fundação, o gaúcho Iberê Camargo. Com olhos e ouvidos atentos às explicações dos mediadores, o grupo foi instigado a interpretar alguns trabalhos.
— A gente fala muito que aqui, na sequência, temos um shopping. Então, geralmente, eles vão para lá e não para o museu. Pensamos que talvez fosse o tempo de cooptá-los desses centros comerciais e "jogá-los" nos museus. Jogar no sentido de reflexão, de pensar e olhar com outros olhos esse ambiente — disse o professor de Sociologia.
De acordo com Ludmilla, cada vez mais, a escola abre as portas para discutir a interpretação de texto de forma mais abrangente, incluindo obras de arte, fotos, vídeos e esculturas.
— As pessoas têm uma ideia distorcida quando se fala em texto. Pensam em texto escrito: conto, romance, poesia. Só que imagem também é texto. Já que o mundo é tão visual, preciso saber interpretá-lo — pontuou a docente.
Eduarda aprovou a iniciativa e saiu com outra ideia das obras depois de ouvir as palavras dos mediadores.
— Foi legal saber que as obras remetem à infância dos artistas, como a aranha e os carreteis de Iberê, pois a gente vê a arte como cotidiano e não como algo mais profundo — concluiu.