Fernanda Gomes Laureano, 25 anos, descobriu na atenção aos idosos o seu ofício. Depois de anos trabalhando como empregada doméstica, passou a ajudar uma vizinha que cuidava de um homem em idade avançada e tomou gosto pela atividade. Neste ano, Fernanda começou a fazer um curso para ampliar seu conhecimento em controle de medicação, troca de fraldas e abordagem psicológica.
– Quero obter o certificado para conseguir fazer meu trabalho ainda melhor – afirma.
Fernanda reveza com sua prima Jaciara Laureano Monteiro, 28 anos, os cuidados com Oscar Fontoura, 93 anos, na casa dele no bairro Moinhos de Vento, na Capital. Ele morava sozinho até o início deste ano, mas passou a ter mais dificuldades para realizar as tarefas do dia a dia. Jaciara cuida de idosos há dez anos e vê potencial para que o ofício avance com velocidade no país.
– A expectativa de vida da população brasileira é cada vez maior, ao mesmo tempo, os filhos nem sempre conseguem estar ao lado dos pais para dar suporte. Nosso trabalho será cada vez mais necessário – acredita.
Exigência de qualificação
Levantamento feito pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), com base em dados do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), reforça a percepção da cuidadora. O estudo mostra que a quantidade de pessoas que trabalham como cuidadores de idoso passou de 5.263, em 2007, para 34.051, em 2017, alta de 547% – tornando a ocupação a que mais cresceu no país na última década. A atividade também é apontada por consultores de recursos humanos como uma das mais promissoras no Brasil para os próximos anos.
– O mercado está em expansão e se tornou uma opção profissional tanto para quem tem alguma experiência na área da saúde quanto para quem busca o primeiro emprego – explica Gicele Melo, coordenadora e diretora da ONG Projeto Surfar, que oferece cursos gratuitos para cuidadores de idosos em Porto Alegre.
Por muito tempo, as famílias chamavam parentes distantes, vizinhos ou buscavam indicações pessoais para designar um acompanhante aos idosos. Às vezes, os próprios familiares faziam este papel. Nos últimos anos, isso mudou. Os cuidadores passaram a ser escolhidos com mais cautela junto a agências especializadas ou por indicação de enfermeiros ou técnicos de enfermagem que já tenham atendido os idosos. Em um mercado mais especializado, a qualificação se tornou fundamental, explica Fernanda Rodrigues, mestre em gerontologia e professora dos cursos de Cuidadores de Idosos do Senac Saúde em Porto Alegre:
– Ser cuidador é inerente do ser humano, mas é preciso se qualificar para exercer esta atividade da maneira mais profissional e eficiente possível, inclusive de forma a ampliar, com qualidade, a expectativa de vida do idoso.
Uma barreira para a ocupação ainda é a falta de regulamentação. A atividade não tem regras próprias de jornada de trabalho, qualificação mínima ou designação de tarefas, por exemplo. Por isso, muitos cuidadores ainda são contratados como empregados domésticos, o que pode gerar distorção nas suas atividades. Há projetos na Câmara e no Senado para regulamentar a profissão, mas ainda não chegaram ao plenário.
Principais tarefas do cuidador de idoso:
- Fazer companhia ao idoso, auxiliando-o em suas tarefas do dia a dia.
- Prestar apoio durante a higiene pessoal, inclusive nas suas funções fisiológicas quando necessário.
- Estimular o idoso com suas atividades de lazer, que podem ser leitura, caminhada ou encontrar os amigos.
- Fazer exercícios, massagens e troca de posição quando houver necessidade.
- Verificar se os remédios são consumidos corretamente e observar o funcionamento das sondas. Os cuidadores não estão aptos a receitar ou dar medicamentos nem a trocar sondas, ao menos quando tenham formação na área da saúde.
- Principalmente em clínicas, trabalhar ao lado de técnico de enfermagem e fisioterapeutas para o bem-estar do idoso.
- Auxiliar o idoso em tarefas domésticas que estejam previstas no contrato de trabalho, como preparo de refeições.
- Monitorar o estado de saúde e manter contato com a família para avisar se houver alguma emergência ou mudança de comportamento.
Quanto ganha:
- No atendimento a domicílio, o cuidador de idosos ganha entre R$ 80 a R$ 120 em jornadas de oito horas por dia. Também é comum que trabalhe nos finais de semana, com pelo menos dois domingos de folga por mês.
- Em clínicas ou casas geriátricas, o salário costuma ficar acima de R$ 1,2 mil em jornadas que variam de seis a 12 horas por dia, incluindo um dia do final de semana.
Enquadramento na lei
- Em fevereiro deste ano, a comissão de assuntos sociais do Senado aprovou a regulamentação da profissão de cuidador de idosos, pessoas com deficiência e doenças raras. Entretanto, o projeto ainda não foi ao plenário.
- Como a profissão ainda não é regulamentada, nos trabalhos a domicílio muitas vezes a carteira é assinada como "doméstico", compartilhando dos mesmos direitos trabalhistas.
- O cuidador pode também trabalhar em agências, que contratam os cuidadores e fornecem serviço para famílias. Quando a contratação é feita por meio de uma agência, a responsabilidade jurídica é da empresa e cabe aos familiares pagarem o valor estabelecido.
- Outra opção é se tornar microempreendedor individual (MEI) e prestar serviços para clínicas especializadas ou casas geriátricas. A atividade de cuidador pode ser enquadrada no MEI.
Características do bom profissional:
- É fundamental que um bom cuidador de idosos tenha paciência, capacidade de empatia e respeito com o idoso.
- Também deve ser proativo para estimular o idoso a realizar atividades que estejam dentro de sua capacidade.
- É desejável que tenha conhecimento de fisioterapia, massoterapia e fonoaudiologia para prestar o melhor serviço ao idoso.
- É desejável ter noções de primeiros socorros, para casos de emergência. Isso explica porque há tantos profissionais da área da enfermagem que cuidam de idosos.
Onde se qualificar:
- Existem dezenas de cursos pagos ou gratuitos pela presencialmente ou pela internet, que oferecem certificado de conclusão.
- Cursos a partir de 20 horas pela internet podem ser um primeiro contato com a profissão, mas professores experientes alertam que é necessário buscar uma qualificação mais longa para realmente estar capacitado.
- Cursos mais extensos e presenciais são importantes porque envolvem abordagem multidisciplinar, com aulas teóricas e práticas sobre cuidados com a saúde, fisioterapia, nutrição, primeiros socorros, higiene pessoal, massoterapia, entre outros.
- O Projeto Surfar oferece cursos gratuitos ou pagos de 220 horas/aula (dez meses) em uma abordagem multidisciplinar, com foco em alunas de baixa renda e canal para inserção no mercado de trabalho. Inscrições para a próxima turma devem ocorrer em março. Informações serão publicadas neste site.
- O Senac Saúde em Porto Alegre oferece cursos de 160 horas/aula com abordagem multidisciplinar. O valor fica em torno de R$ 900 e há opções para turnos de manhã, tarde e noite. As próximas turmas podem ser consultadas neste link.
- Faculdades de saúde no Estado também oferecem cursos acima de 100 horas/aula e com foco multidisciplinar. Via de regra, não é necessário ter formação prévia na área da saúde.
Para as famílias, como avaliar e contratar os profissionais:
- Há dezenas de agências de contratação de cuidadores em Porto Alegre e na Região Metropolitana, mas é preciso se certificar quanto à sua regularidade. Peça o número do CNPJ e o alvará de funcionamento para garantir que o negócio é regular.
- É importante consultar órgãos de defesa ao consumidor e sites de discussão na internet para verificar a reputação da agência que pretende contratar.
- Ao iniciar a busca por profissionais, peça para ver certificados de cursos e capacitações e atente-se à carga horária e às competências trabalhadas.
- Peça referências de trabalhos anteriores e entre em contato para saber como foi a experiência.
- Faça sempre um contrato prevendo as tarefas que serão realizadas e o horário de trabalho.
- O próprio idoso que receberá os cuidados deve ter um protagonismo na escolha de seu assistente, uma vez que envolve empatia e preferências pessoais, como faixa etária e sexo.
Fontes: ONG Projeto Surfar e Fernanda Rodrigues, mestre em gerontologia e professora dos cursos de Cuidadores de Idosos do Senac Saúde em Porto Alegre