Em um cenário marcado por transformações tecnológicas e mudanças climáticas, profissões ligadas às Ciências da Natureza e à Tecnologia da Informação aparecem em alta no Ensino Superior. Neste mesmo contexto, no entanto, as formações na área das Ciências Humanas ganham cada vez mais importância no sentido de refletir a sociedade a partir das novas dinâmicas.
Cursos de graduação como Filosofia, Ciências Sociais, Pedagogia e Serviço Social têm o papel de transformar realidades a partir do pensamento crítico e auxiliar na compreensão da sociedade e suas problemáticas. Um aspecto que chama a atenção é a diversidade de pessoas que buscam as formações, sobretudo os bacharelados.
Quase metade dos matriculados em cursos de Serviço Social no Rio Grande do Sul em 2023, por exemplo, tinha mais de 40 anos. São 48% (2.736 alunos) nesta faixa etária, e somente 14,5% (895 pessoas) tinham entre 18 e 24 anos, grupo etário predominante entre os universitários do país.
Os dados são do Censo da Educação Superior de 2023, elaborado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) e se referem aos bacharelados. Fenômeno semelhante é observado nos cursos de Filosofia do RS, que contam com estudantes de diferentes faixas etárias: 25,6% (143) entre 18 e 24 anos, e 36,5% acima dos 40 anos (204 alunos).
Quanto ao recorte de gênero, o levantamento do Inep mostra que as mulheres são maioria entre as matrículas nos cursos de Serviço Social no RS (89,6%) e de Relações Internacionais (60,6%), sendo que os homens predominam nos cursos de Filosofia (71,1%). Conforme o professor Luiz Rohden, decano da Escola de Humanidades da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos), essa área atrai estudantes curiosos e questionadores.
— São jovens e adultos que buscam conhecer o cenário das políticas públicas, da justiça social e democratização, mas principalmente estudar as diferentes expressões da questão social na sociedade, discutir e experienciar possibilidades de transformação nos diferentes e espaços de prática — explica.
Papel transversal das humanas
Segundo Rohden, na Unisinos, por exemplo, os cursos de humanas têm a missão de propiciar que os estudantes e egressos participem dos esforços científicos, tecnológicos, culturais, assistenciais e ambientais de construção do desenvolvimento do Estado. Essas graduações buscam garantir uma formação humanística aliada às competências técnicas.
Com isso, os profissionais podem e devem contribuir para a solução de problemas graves e crescentes que assolam a humanidade, incluindo questões emergentes, como migrações e crise climática. Para além da docência, hoje, quem busca essas formações tem um amplo leque de possibilidades no âmbito da carreira.
Conforme o professor, atualmente, há oportunidades em organizações internacionais, consultorias, ONGs, no setor público e privado, onde habilidades analíticas são valorizadas.
— Filósofos, por exemplo, atuam em áreas como ética empresarial, inteligência artificial, consultoria em políticas públicas e até na mídia, e redes sociais oferecendo cursos online, bem como insights críticos e reflexivos para os desafios modernos — destaca.
Ou seja, são profissões que atravessam diferentes segmentos, como direito, saúde, educação, setor habitacional. Para a gerente de desenvolvimento do ensino da Unisinos, Cristiane Schnack, a área de humanidades tem um caráter transversal, capaz de estabelecer diálogos com todas as outras.
— Esses profissionais são cada vez mais demandados, por terem este olhar sistêmico, que permite pensar nos problemas sociais e éticos, pauta fundamental neste momento. Enquanto sociedade, precisamos das humanidades para pensar em soluções que levem em consideração aspectos como diversidade, empatia, questões étnico-raciais e muitas outras — diz.
Intercâmbio cultural
Na Unisinos, por exemplo, a formação nas Ciências Humanas tem uma longa tradição. A Escola de Humanidades conta com os cursos de bacharelado de Serviço Social, Filosofia e Relações Internacionais (RI), bem como outros que ofertam Licenciaturas. Antes, o curso de RI era vinculado à Escola de Gestão e Negócios, mas passou a integrar a Escola de Humanidades em 2022, pela interface com questões sociais, históricas e políticas.
Para a estudante Isabella Abrão Bertoluci, 20 anos, que está no 6º semestre do curso de RI, o ponto forte do curso é o contato próximo com os professores e a possibilidade de construir projetos junto dos docentes e colegas, permitindo uma formação integral e multidisciplinar.
— Eles nos desenvolvem, para além de profissionais, mas também como pessoas sensíveis ao que acontece no mundo, com a capacidade de analisar qualquer cenário global ou local, com um olhar mais atento aos detalhes — conta a jovem.
Outro aspecto dos cursos são as possibilidades de internacionalização, que permitem trocas interculturais. Por meio do programa de mobilidade da Unisinos, os estudantes podem ter experiências globais e networking em suas áreas de interesse em instituições internacionais parceiras.
As experiências têm permitido que egressos do curso de RI conquistem oportunidades de trabalho em organismos internacionais e na carreira diplomática, por exemplo. Para Isabella, que retornou de uma experiência na Suíça em outubro, as trocas foram importantes.
— Foram experiências que mudaram a minha vida. Fui com a turma para Genebra, e visitamos diversas organizações importantes, como a ONU (Organização das Nações Unidas), a Organização Mundial do Comércio, a Organização Mundial da Propriedade Intelectual. Foi sensacional — conta.
*Colaborou Beatriz Coan