A inteligência artificial (IA) está cada vez mais presente no Ensino Superior. Conforme estudo elaborado pela Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (ABMES) em parceria com a Educa Insights, 71% dos estudantes de graduação usam recursos de IA com frequência na rotina de estudos. Para 74% dos consultados, as novas tecnologias são um investimento essencial nas instituições de ensino, sendo que 80% deles conhecem as principais ferramentas, como ChatGPT e Gemini.
O estudo é resultado de entrevistas realizadas em julho de 2024 com 300 estudantes de todo o país, com idades entre 17 e 50 anos. O cenário reforça a importância do debate sobre as implicações da IA da educação e seus efeitos na formação de professores e alunos nos próximos anos. O tema já entrou em discussão das instituições, como na Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos), onde docentes e estudantes vêm adotando plataformas de IA para otimizar processos.
Os recursos têm sido usados em áreas como direito e saúde, para auxiliar no tratamento de dados, na computação, para otimizar processos de programação, bem como em cursos ligados à indústria criativa, dando suporte à construção de projetos de design, por exemplo. Segundo o professor do Programa de Pós-Graduação em Computação Aplicada da Unisinos, Sandro Rigo, é fundamental que os alunos sejam apresentados à IA na graduação, para que ingressem no mercado de trabalho dominando as novas tecnologias.
— O mercado de trabalho já vem incorporando essas ferramentas em larga escala. O uso desses recursos em sala de aula pode ser considerado uma formação complementar, capacitando o aluno para que chegue mais preparado ao mundo do trabalho — destaca Sandro, que também é decano da Escola Politécnica da instituição.
Desafio para os docentes
Na visão de 56% dos participantes da pesquisa, as ferramentas estão cada vez mais confiáveis em atividades acadêmicas, a ponto de 84% considerarem que, futuramente, a IA poderá substituir parcialmente a atuação dos professores em sala de aula, seja na estruturação das aulas ou na correção dos trabalhos e provas.
Temos que aprender a usar essas ferramentas e entender como podem servir de apoio, do ponto de vista pedagógico, para qualificar o ensino.
IZABELE COLUSSO
Coordenadora do curso de Arquitetura e Urbanismo da Unisinos
Para a coordenadora do curso de Arquitetura e Urbanismo da Unisinos, Izabele Colusso, o papel do professor é justamente mostrar ao aluno como utilizar a IA e usufruir dos benefícios das plataformas da melhor maneira.
— Tivemos outros momentos de transformações tecnológicas e avanços que impuseram desafios, como o surgimento da internet, do celular, e agora estamos vivendo isso por conta da IA. Mas temos que aprender a usar essas ferramentas e entender como podem servir de apoio, do ponto de vista pedagógico, para qualificar o ensino — argumenta.
Sandro explica que essas tecnologias podem servir como apoio pedagógico, suporte na gestão educacional e de otimização do aprendizado pelos professores. Na Unisinos, por exemplo, os docentes utilizam recursos que geram dados e trilhas digitais dos alunos, permitindo acompanhar o engajamento deles nas aulas, identificar alunos com tendência de desistência do curso e dificuldades de aprendizagem, possibilitando decisões mais assertivas.
Em comparação com o levantamento realizado no ano passado, houve aumento de 11% na quantidade de alunos que afirmaram conhecer ferramentas de IA e de 18% naqueles que fazem uso frequente na vida acadêmica. Para 91% dos entrevistados neste ano, o uso é semanal ou diário.
Para o diretor-presidente da ABMES, Celso Niskier, a IA é uma aliada dos professores e estudantes durante a formação acadêmica. O educador e doutor em inteligência artificial lançou o livro "Educação Mais Inteligente", que traz reflexões sobre inovação e qualidade no ensino na era da IA generativa.
— O professor não é mais o único dono do conhecimento, mas sim mentor do aluno, orientador de aprendizagem. Hoje, o aluno pode fazer qualquer pergunta ao ChatGPT e conseguir respostas, mas cabe ao professor mostrar a ele os limites da tecnologia e fazer com que o estudante reflita, e não meramente reproduza os resultados da IA. O professor fica num papel de estimular o pensamento crítico — ressalta Niskier.
Para a professora do Programa de Pós-Graduação em Educação da Unisinos Eliane Schlemmer, é necessário pensar na IA dentro da lógica da formação de alunos, e não somente como ferramenta de apoio ao ensino.
— Temos a necessidade de migrar de uma ideia de formação só dos indivíduos para uma formação em contextos ecologicamente conectados. Isso nos obriga a olhar de uma forma diferenciada para os processos de ensino e aprendizagem, e não simplesmente adaptar a IA ao nosso modo de fazer educação como viemos desenvolvendo até então — afirma.
Muito além do ChatGPT
A IA vem trazendo benefícios aos profissionais de Arquitetura e Urbanismo, por exemplo, e a professora Izabele Colusso busca instigar os alunos em sala de aula para que utilizem os recursos. Ela diz que há ferramentas úteis, especialmente para apoiar na etapa inicial da construção de projetos, que envolve a análise do entorno e a exploração de possibilidades de projeto.
— A tecnologia nos ajuda na parte mais técnica do trabalho. Gastamos muito tempo fazendo cálculos de estruturas, tamanho de vigas, pilares. Isso a IA pode fazer para nós. Mas a parte criativa, o componente humano, isso não tem como substituir. As ferramentas têm sido importantes nas análises urbanísticas, especialmente para economizar tempo — explica.
A docente da Unisinos destaca plataformas como ArchiVinci e Aino World, que podem auxiliar nesse sentido, otimizando processos. Além de apresentar os recursos em sala de aula e orientar os alunos sobre como utilizá-los, a professora faz vídeos para o YouTube sobre o tema, voltados a estudantes e profissionais da área.