Após quatro anos de tensão entre a gestão da reitoria e parte da comunidade acadêmica, com protestos e pedidos de impeachment, a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) realiza, neste mês, o processo de escolha de seus novos mandatários. Até o momento, três chapas disputam, e nenhuma se apresenta como continuidade da atual administração.
A chapa 1 destaca como bandeiras a democracia, a transparência e a defesa da autonomia da universidade. Já a chapa 2 foca em quatro eixos: estudantes, servidores, infraestrutura e conhecimento e sociedade. A chapa 3, por fim, quer fortalecer as ações afirmativas, a extensão, o trabalho com mudanças climáticas e a sustentabilidade.
A previsão é de que a eleição de reitor e vice-reitor para os anos de 2024 a 2028 passe por uma consulta informal a alunos, professores e técnicos-administrativos e, depois, por eleição formal feita por membros do Conselho Universitário (Consun), que enviará a lista tríplice dos mais votados para o Ministério da Educação (MEC), que empossará uma das três chapas.
A novidade desta vez é que a consulta informal à comunidade universitária será paritária. Ou seja: os votos de alunos, docentes e técnicos-administrativos terão pesos iguais. Até a última eleição, as escolhas dos professores valiam 70%, enquanto as de estudantes e técnicos-administrativos pesavam 15% cada. Em 2020, por exemplo, se houvesse paridade, a chapa mais votada seria a 3, composta por Karla Maria Müller e Claudia Wasserman, e não a 2, de Rui Oppermann e Jane Tutikian. Ainda assim, nenhuma das duas foi empossada pelo MEC, que tem a prerrogativa de escolher qualquer um dos nomes da lista tríplice e nomeou os candidatos da chapa 1, a menos votada, formada por Carlos André Bulhões e Patrícia Pranke.
Confira abaixo as principais propostas das três chapas que concorrem ao pleito de 2024:
É composta por Liliane Ferrari Giordani, candidata a reitora, e Carlos Alberto Gonçalves, candidato a vice-reitor.
Liliane é formada em Educação Especial pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) e tem mestrado e doutorado em Educação pela UFRGS. Se tornou professora da instituição em 2011 e, desde então, atua nas áreas de Língua de Sinais, Educação Bilíngue e Educação Especial. Participou da Comissão de Graduação da Pedagogia e da Educação do Campo, do Núcleo Docente Estruturante da Educação do Campo, chefia de departamento, da representação docente no Consun e, desde o final de 2020, é diretora da Faculdade de Educação (Faced).
A última parte de todo o processo foi a escolha dos nossos nomes, que se complementam: a Lili (Liliane Giordani) é uma pesquisadora da Educação e eu, um pesquisador da Saúde. A Lili trabalha muito com extensão, eu trabalho muito com pesquisa. Então, ela tem uma expertise na inclusão social e eu na ciência aplicada.
CARLOS ALBERTO GONÇALVES
Candidato a vice-reitor pela Chapa 1
Carlos Alberto, conhecido como “C.A.”, é formado em Medicina em Pelotas e tem mestrado e doutorado em Bioquímica pela UFRGS. Em Newcastle, na Austrália, fez pós-doutorado. Quando estudante, participou do diretório acadêmico e da Associação de Pós-Graduandos e fundou a Associação Nacional dos Pós-Graduandos. É professor da UFRGS desde 1991, foi chefe de departamento, vice-coordenador do Programa de Neurociências e coordenador do Programa de Bioquímica. É membro honorário da Sociedade Cubana de Neuroimunologia, foi membro do Consun e do Conselho de Ensino Pesquisa e Extensão (Cepe). É pesquisador 1A do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Também foi vice-presidente da Adufrgs e presidente da Andes/UFRGS, ambas entidades sindicais que representam professores da instituição.
Precisamos de políticas fortes de combate ao racismo, à LGBTfobia, ao capacitismo. Para nós, as políticas afirmativas são uma pauta que engrossa muito o nosso movimento e fortalece essa discussão entre os setores e as unidades. Vivemos os últimos quatro anos de encastelamento desta universidade, com uma falta absoluta de diálogo, e os coletivos estudantis e dos servidores técnicos têm uma expectativa de retomada do diálogo sobre o papel da universidade.
LILIANE FERRARI GIORDANI
Candidata a reitora pela Chapa 1
A chapa 1 surge do movimento Virada, formado em 2016, quando Gonçalves foi candidato a reitor e defendeu a implementação de eleições paritárias na UFRGS. No ano passado, o grupo retomou seus encontros e aponta como base de suas propostas a transparência e a democracia.
A candidata a reitora ressalta que a UFRGS, pelos índices, é de excelência, mas, na vida cotidiana, nem sempre. Um dos exemplos é a falta de políticas mais fortes de permanência e diversidade dentro da instituição.
A diretora da Faced assegura que o diálogo com as comunidades interna e externa são o primeiro passo na busca pela excelência buscada pela universidade. Entre as propostas da chapa, está a criação de um orçamento participativo, nos moldes do existente em Porto Alegre, para que a escolha sobre o que será feito com o recurso da instituição aconteça de forma coletiva.
É composta por Ilma Brum, candidata a reitora, e Vladimir Nascimento, candidato a vice-reitor.
Ilma é formada em Ciências Biológicas pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), tem mestrado e doutorado em Ciências Biológicas (Fisiologia) pela UFRGS e fez pós-doutorado no Institut National de la Santé et la Recherche Médicale, na França. É membro da Sociedade Brasileira de Fisiologia (SBFis) e das sociedades científicas “European Society of Endocrinology e Endocrine Society. É orientadora nos Programas de Pós-Graduação de Fisiologia e de Ginecologia e Obstetrícia. É diretora do ICBS e foi chefe do Departamento de Fisiologia. Foi membro do Cepe e do Consun. Coordenou o Programa Multicêntrico de Pós-Graduação em Ciências Fisiológicas pela SBFis. Na pandemia, coordenou a realização de 145 mil testes de RT-PCR para o retorno das atividades na UFRGS e integrou o comitê científico que auxiliou o governo do Estado a tomar decisões.
Nossa proposta sempre foi ter a UFRGS em primeiro lugar. A universidade não deve estar atrelada a grupo nenhum, seja político ou de qualquer ordem: deve trabalhar em prol da sociedade. Juntos, eu e a Ilma temos mais de 30 anos de Conselho Universitário, e queremos que o Consun não só tenha protagonismo, mas volte a dialogar com todos.
VLADIMIR NASCIMENTO
Candidato a vice-reitor pela Chapa 2
Vladimir é médico veterinário pela UFRGS e Ph.D. em Medicina Veterinária pela Universidade de Glasgow, na Grã-Bretanha. Fez estágios na Universidade de Oxford, na Grã-Bretanha, e na Faculdade de Veterinária da Cornell University, nos EUA. Foi pró-reitor de Pós-Graduação e de Graduação e, hoje, dirige a Faculdade de Veterinária. É bolsista de produtividade nível I do CNPq e líder do grupo de pesquisa do Centro de Diagnóstico e Pesquisa em Patologia Aviária junto ao CNPq. Preside a Comissão de Ensino do Conselho Regional de Medicina Veterinária e foi membro do Conselho Federal de Medicina Veterinária. Participa de grupos ligados à Organização das Nações Unidas e aos governos federal e estadual.
O orçamento será apresentado e discutido no Conselho Universitário e nas unidades acadêmicas. A distribuição desse recurso é feita há anos de forma que não condiz mais com as necessidades das unidades. Essa forma deve ser revista com os diretores das unidades, e o orçamento geral da UFRGS, a partir de planejamento, ser apresentado e discutido de forma clara e transparente.
ILMA BRUM
Candidata a reitora pela Chapa 2
Formada por diretores, a chapa 2 surgiu de um trabalho entre unidades acadêmicas, desde 2021, para levantar as demandas desses locais. O resultado foi disponibilizado em julho do ano passado e uma proposta de nova gestão foi elaborada, sem a definição de quais os nomes que coordenariam esse movimento na eleição.
Um desafio é lidar com o orçamento da universidade, que foi reduzido nos últimos anos. Ilma defende que, para o gestor, “é muito mais cômodo ter um orçamento aprovado e analisado pela sua comunidade do que definir”.
Para Ilma, administrar uma instituição do tamanho da UFRGS “já á difícil quando tu tem sintonia; quando tu não tem, fica absolutamente impossível”, e isso, ela garante, a chapa 2 tem.
É composta por Marcia Barbosa, candidata a reitora, e Pedro Costa, candidato a vice-reitor.
Marcia é professora do Instituto de Física da UFRGS e pesquisadora nível 1A do CNPq. Foi diretora do Instituto de Física. É membro da Academia Brasileira de Ciências e da Academia Mundial de Ciências e integra organizações como American Physical Society, Conselhos Nacionais de Ciência e Tecnologia, de Desenvolvimento Econômico e Social da Presidência e Comitê de Gênero da The World Academy of Sciences. Em 2023, assumiu como secretária de Políticas e Programas Estratégicos do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, cargo que deixou há dois meses. Pesquisa Física da Matéria Condensada, principalmente em água e no uso de suas anomalias para processos físicos e biológicos.
É desafiador, porque historicamente a UFRGS vem de uma federação, e, se não bastasse o desafio de restaurar o diálogo, vemos uma mudança violenta e mundial nas universidades, com o decréscimo do interesse dos estudantes de irem a universidades tradicionais. Em paralelo a pautas conservadoras, o mundo avançou na questão dos costumes, e a universidade não está acompanhando isso.
MARCIA BARBOSA
Candidata a reitora pela Chapa 3
Pedro é professor da Escola de Administração da UFRGS, onde ministra disciplinas sobre Administração de Organizações da Sociedade Civil e Administração Pública Social, Estado, Terceiro Setor e Organizações não governamentais. Na pós-graduação, atua na linha de Gestão Social e Desenvolvimento. Trabalha com projetos de pesquisa e extensão na área de gestão social e tecnologias sociais. Fundou o Núcleo de Estudos em Gestão Alternativa. Foi chefe do Departamento de Ciências Administrativas, coordenador da Comissão de Graduação e da Comissão de Extensão de Administração e vice-presidente da Comissão Especial de Acompanhamento junto ao MP e MEC. Foi membro da Comissão Permanente de Pessoal Docente, presidiu a Comissão Especial de Avaliação de Reestruturação da Reitoria e foi representante docente no Conselho da Unidade e no Consun.
Queremos fortalecer a participação da universidade na sociedade, principalmente através da extensão, que é onde a gente consegue exercer o nosso compromisso social de universidade pública.
PEDRO COSTA
Candidato a vice-reitor pela Chapa 3
Um dos entendimentos da chapa 3 é de que a falta de diálogo da reitoria tornou a UFRGS uma “federação de institutos” que realizam diferentes projetos, mas sem relação uns com os outros, o que, no entendimento de Marcia, pôde ser percebido em maio, durante a enchente.
A dupla avalia que, diante de demandas como essas e a transição energética, por exemplo, a universidade precisa “sair da caixa e ir para a sociedade” – se não o fizer, a evasão seguirá acontecendo e a instituição seguirá pouco ouvida na busca de soluções para esses problemas. Para sair da caixa, defende o fortalecimento de projetos de extensão, com a criação, por exemplo, de uma Secretaria Especial de Emergências Climáticas e Ambientais, para reunir projetos.
A parceria com empresas é outra bandeira da chapa 3, o que deve ser facilitado a partir da elaboração de um banco de dados que mapeie os projetos e competências de cada servidor da instituição.