Os participantes do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) 2023 devem escrever na redação sobre os "desafios para o enfrentamento da invisibilidade do trabalho de cuidado realizado pela mulher no Brasil".
O anúncio do tema, que é mantido em sigilo até depois do começo oficial da prova, foi realizado por volta das 14h, em Brasília, pelo ministro da Educação, Camilo Santana, acompanhado pelo presidente do Inep, Manuel Fernando Palácios da Cunha Melo, e servidores da instituição.
A redação costuma ser um dos pontos mais desafiadores da prova, pois exige, além da capacidade técnica para a escrita argumentativa, uma visão atualizada de assuntos de interesse da sociedade.
No texto, que pode ter até 30 linhas, as ideias precisam estar embasadas por explicações fundamentadas e argumentações sobre o assunto. Os participantes também contam com textos motivadores para desenvolverem os seus conceitos.
Debate necessário
Professora das redes pública e privada em Porto Alegre, a doutora em História Muriel Rodrigues de Freitas destacou a apresentação dos estudos de gênero e trajetória feminina para os candidatos do Enem.
— Sabemos que as mulheres são as maiores responsáveis pelo cuidado de filhos, idosos e doentes. O grande desafio é entender essa atividade, muitas vezes doméstica, como trabalho e não como um papel que deva ser desempenhado naturalmente pelas mulheres. É um papel não essencialista.
Muriel acrescenta que a prova de redação, por representar 20% da nota geral, é decisiva para a aprovação dos candidatos com mais afinidade com o tema proposto.
— O ideal é tirar uma nota acima de 900. A competência número 5 do Enem pede apresentação de propostas para solução ou amenização do problema. Uma boa sugestão é a participação de todos na família nos cuidados e uma maior compreensão da importância na igualdade da divisão das tarefas, além de políticas púbicas relacionadas ao tema — relata a professora.
A coordenadora de redação do Fleming Pré-Vestibular, Sharlene Leite, lembra que o tema inclui a palavra “desafios”, no plural, exigindo que o estudante propusesse, aos menos, duas soluções à questão.
— O trabalho de cuidado feminino é uma característica do patriarcado no Brasil. É uma atividade destinada às mulheres como se fosse uma obrigação exclusiva. O aumento do número de idosos requer mais cuidado, que tem que ser bipartido. É comum ouvirmos sobre um homem que exerce essa função que ele tem virtudes, mas se é uma mulher, é apenas uma obrigação. São perspectivas diferentes, mesmo nas classes mais letradas — compara.
A busca de um outro lugar social por meio do empoderamento feminino é, segundo Sharlene, comprovado pela maior participação histórica de mulheres nas provas do Enem em relação aos homens:
— Se a prática do cuidado for exercido praticamente só pelas mulheres, segundo a visão machista, como vai ser a sociedade se elas ocuparem outras cargos? Na educação, séries iniciais têm mais professoras, porque requer mais cuidado. Já nas séries finais, há mais professores homens. É uma prática incomum refletir sobre aquilo que na sociedade não engendra valor monetário.