A Secretaria Municipal de Educação (Smed) de Porto Alegre confirmou a GZH ter solicitado a municipalização de cinco escolas de Ensino Fundamental administradas pelo Estado. Três delas integram um grupo de oito instituições indicadas pela Secretaria Estadual da Educação (Seduc) para a troca de responsabilidade, processo que deve avançar no Rio Grande do Sul. As outras duas fazem parte de uma contraproposta feita pela Smed ao Estado.
Uma audiência pública nesta terça-feira (31) na Assembleia Legislativa foi palco de diversas opiniões contrárias à troca de gestão e ao modo como o processo tem sido conduzido (leia as manifestações no fim da reportagem).
A Smed não quis nomear as instituições pretendidas nesse processo, nem a localização delas antes de a parceria com o governo estadual ser concluída. A transição deve ocorrer em novembro, conforme José Paulo da Rosa, secretário de educação da Capital.
— Avaliamos uma série de quesitos das escolas: acessibilidade, infraestrutura, condições de cozinha, refeitório, para atender demandas dos estudantes. Optamos por aquelas que não demandam grande investimento neste momento e que são alternativas viáveis de curto prazo — explicou.
As três instituições da proposta original têm investimento previsto de R$ 1,5 milhão para receber 300 alunos. A expectativa é que elas estejam prontas no início do ano letivo em 2024. As outras duas solicitadas na contraproposta completariam o "projeto-piloto" do início da municipalização na Capital.
— É uma tendência que os municípios assumam (o Ensino Fundamental), e essa é uma tentativa de iniciar o processo, que é longo e depende de negociação do Estado com sua equipe, professores e diretores. Nós somos favoráveis (à municipalização), entendemos que atende à legislação nacional e que é possível evoluir, mas com o devido cuidado — ponderou José Paulo da Rosa.
Segundo o secretário, pouco mudará nas escolas quando o processo for concluído: os professores continuarão funcionários estaduais e a sede da instituição seguirá a mesma, o que não demandará, por exemplo, transferência de estudantes.
— O que será diferente é que o projeto político-pedagógico será do município, mas com pequenas alterações, que não mudam em nada a qualidade da educação que o estudante vai ter — acrescentou.
Audiência pública critica municipalização
Porta-vozes de entidades representativas e de escolas, deputados e mães de alunos participaram de uma audiência pública na Assembleia Legislativa nesta terça-feira para debater a municipalização de escolas de Ensino Fundamental da rede estadual de educação do Rio Grande do Sul. O encontro foi convocado pela Comissão de Educação, Cultura, Desporto, Ciência e Tecnologia da Assembleia Legislativa e conduzido pela presidente do grupo, deputada Sofia Cavedon.
Entre os participantes, estavam representantes do Centro dos Professores do Estado do Rio Grande do Sul (Cpers), do Sindicato dos Municipários de Porto Alegre (Simpa), da Secretaria Municipal de Educação (Smed) de Porto Alegre e do Ministério Público. Já a Secretaria Estadual de Educação (Seduc) não enviou porta-vozes ao evento, devido a um “conflito de agendas”, conforme informou Sofia no início da audiência.
A falta de participação da pasta nos debates sobre o tema e a dificuldade de comunicação com seus representantes foram pontos bastante criticados durante o encontro. A reportagem de GZH tentou contato com a Seduc, por meio da assessoria de imprensa, a fim de esclarecer alguns pontos a respeito da municipalização e não obteve retorno até o fechamento desta matéria.
Conforme informações de agosto deste ano, quando a secretária estadual de Educação, Raquel Teixeira, concedeu entrevista à Rádio Gaúcha, a intenção era que as matrículas do Ensino Fundamental vinculadas ao Estado passassem para as mãos dos municípios gradualmente – assim como os devidos repasses federais.
O Ensino Fundamental é uma responsabilidade compartilhada entre Estados e municípios. Então, não pode ser uma mera prefeitualização de matrículas, tem que ser parte do planejamento das cidades.
DEPUTADA SOFIA CAVEDON.
Presidente da Comissão de Educação, Cultural, Desporto, Ciência e Tecnologia da Assembleia Legislativa
Em 2022, havia 1.257.890 alunos cursando essa fase de ensino, sendo que 52,7% já estudavam em instituições municipais. O restante era dividido entre rede estadual (33,2%), privada (13,9%) e federal (0,1%).
A previsão da secretária era que a mudança ocorresse até 2028 para os Anos Iniciais. Depois, o mesmo deveria ocorrer em relação aos Anos Finais.
"Prefeitualização de matrículas"
Na abertura da audiência pública, Sofia citou uma regulamentação do Conselho Estadual de Educação, que prevê casos de mudança de mantença de escolas entre gestão estadual e municipal, a chamada municipalização, como o fechamento de uma instituição de ensino. Também criticou que o processo fosse imposto pelo Estado, sem que as comunidades escolares fossem ouvidas, defendendo um debate "com todas as instâncias que têm que responder pela cobertura e pela qualificação da educação”:
— No regime de colaboração é possível, não é ilegal. Mas todas as comunidades escolares devem fazer uma escuta e nenhuma prefeitura é obrigada a receber uma escola estadual. O Ensino Fundamental é uma responsabilidade compartilhada entre Estados e municípios. Então, não pode ser uma mera "prefeitualização" de matrículas, tem que ser parte do planejamento das cidades.
A deputada enumerou ainda escolas de outros municípios que recusaram a municipalização, com a ajuda de movimentos detalhando a situação das instituições e reuniões que mostravam os prejuízos dessas propostas.
Edson Garcia, segundo vice-presidente do Cpers, ressaltou que houve solicitação de agendas para tratar dessa pauta junto à Seduc, porque foram “pegos de surpresa por um elevado número de tentativas de municipalização”. Também criticou que esse processo não leva em conta características específicas de cada escola e comunidade.
— Estamos há alguns anos lutando contra os processos e conseguimos fazer com que alguns cessassem com o apoio da comunidade. Sabemos que o processo de municipalização não é tão simples como o Estado apresenta, não é simplesmente fechar uma escola e fazer com que outra absorva os alunos. Tememos muito e alertamos sobre esses processos, que são nocivos e, às vezes, parecem feitos por pessoas que não conhecem a realidade das escolas — disse.