O programa Future-se é o tema central da sessão pública do Conselho Universitário (Consun) nesta sexta-feira (16), na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). O projeto, lançado pelo Ministério da Educação (MEC) em julho, promete a ampliação da autonomia na gestão das universidades e institutos federais. Porém, as entidades de ensino questionam a falta de detalhamento de diversos pontos do projeto e pedem o debate amplo da proposta.
Com praticamente todos os 1300 lugares do Salão de Atos ocupados, foi preciso abrir uma sala para que as pessoas que não conseguiram entrar pudessem acompanhar a discussão por meio de um telão.
O programa Future-se, que é de adesão voluntária e que ainda não apresenta a redação final, foi a alternativa dada pelo Governo Federal para tentar conter a crise orçamentária em universidades e institutos federais. O MEC propôs que estas entidades captassem seus próprios recursos. Neste cenário, União, instituições de ensino e organizações sociais (OS) deveriam formar parcerias.
As OSs são associações privadas, sem fins lucrativos, que devem reverter para sua atividade fim o dinheiro excedente e que, além disso, devem atuar em áreas relacionadas ao ensino, pesquisa, saúde, cultura e desenvolvimento. Dentro desta proposta, a pasta afirma que a medida não implica a privatização do ensino público, mas uma alternativa para sua manutenção.
Pontos de desacordo entre a UFRGS e o Future-se
A sessão pública da UFRGS começou às 8h30min e se estendeu até o início da tarde. Esta foi a primeira conversa sobre o tema e a entidade promoverá outros debates para discutir a proposta. Só então o Consun irá deliberar pela entrada ou não da universidade no programa Future-se.
Durante sua explanação, o reitor da UFRGS, Rui Oppermann, afirmou que “há aspectos inegociáveis" na adesão:
— É preciso que haja a garantia do financiamento público adequado para as universidades e que incluam e garantam o tripé ensino, pesquisa e extensão. A preservação da dedicação exclusiva dos professores e a defesa das universidades como algo público, pluricultural, inspirado na liberdade constitucional e de consciência crítica.
Oppermann observa, ainda, que o programa não entra em detalhes que garantam a autonomia universitária que, segundo ele, ficaria ameaçada dentro deste modelo.
— O projeto não aborda a questão do financiamento público. A criação deste Comitê Gestor (previsto no Future-se), que pode definir diretrizes, avaliar desempenho, estabelecer metas e multar as universidades, significa a perda da autonomia das instituições de ensino, porque ele substitui o papel do Consun (órgão máximo de função normativa, deliberativa e de planejamento da instituição) — afirmou o reitor da UFRGS que ressaltou ainda que aceitar a gestão do comitê é praticamente “dar um cheque em branco” para uma entidade cuja a constituição é desconhecida.
Outro apontamento feito pelo gestor foi quanto ao papel das OSs que, pelo projeto, poderiam participar da elaboração dos planos de ensino e dos projetos de pesquisa, por exemplo. Competência que é de responsabilidade do Consul e dos conselhos das unidades dos cursos. Ele ressaltou que tais organizações teriam atuação, inclusive, sobre os servidores técnicos e definição do quadro docente. Estas entidades estariam autorizadas a contratar, sem concurso público, servidores e professores.
— Está claro pelo programa que ele definiria a redução no número de funcionários isso vai no sentido contrário à nossa política de expansão — explica Oppermann.
O reitor da UFRGS afirma que há ponto relevantes no programa que precisam ser levados em consideração como a superação de entraves legais que impedem a universidade de arrecadar recursos e de melhorar sua performance, mas que isso não significa tirar esta responsabilidade da União.
— Universidades e institutos federais devem ser financiadas pelo poder público assim como prevê a LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação). Não há motivo para redigir um programa que desonere o Estado do seu dever constitucional. O future-se precisa mudar para contemplar o que acreditamos ser essencial para que possamos pensar um programa de desenvolvimento para as universidades — sinalizou.
Próximos passos
Uma das convidadas a se manifestar foi a ex-reitora e professora da Faculdade de Educação da UFRGS Maria Beatriz Luce. Em seu pronunciamento, ela afirmou que é preciso resistir.
— Eu nunca senti tanta preocupação quanto no presente momento, porque as ameaças nos atingem institucionalmente. Este é um momento de construir coesão entre nós e construirmos condições de resistência — disse a docente.
A data para a votação final ainda não foi definida, mas, na próxima sexta-feira (23), haverá uma nova reunião. Desta vez, com os conselheiros do órgão que acertaram os detalhes de uma carta que firma o posicionamento da instituição frente ao plano do governo federal.