Os alunos da turma 12 sentam-se em um círculo. Carregam, cada um deles, uma garrafinha, copo ou caneca feitos com material reciclável. Vestem camisetas de cores e tamanhos variados, todas com a mensagem "We Are the Change" ("Nós somos a mudança", em tradução livre do inglês). Ao centro, uma placa em que se lê "roda de estudos: sustentabilidade" indica o que eles fazem ali. Os pequenos falam, com naturalidade surpreendente para crianças de seis, sete anos, sobre temas que muitos adultos sequer abordam com frequência.
— Se jogar o lixo na rua, acaba que vai para o bueiro, que pode entupir. Aí o mar sobe, prédios e casas desabam. Não tem natureza, nem mais nenhum ser vivo — explica, com um certo exagero, David Baes Rodrigues, sete anos, estudante do 1° do ano do Ensino Fundamental do Colégio Santa Inês, em Porto Alegre.
— Alguns animais podem achar que o lixo é comida e se alimentar daquilo, e aí eles vão se sentir mal, com vontade de vomitar ou qualquer outra coisa assim — completa Júlia de Paris Barbieri, seis anos, sua colega.
Em outra turma, esta do 4° ano, a temática da aula é parecida. Ao fundo da sala, um grande mural em formato de árvore semeia os desenhos que os alunos produziram após a leitura do livro O Mundo Muda... Se A Gente Ajuda!. A obra, de Flávia Savary, com ilustrações de Daniel Kondo, narra a história de um menino que redige um texto descrevendo um mundo devastado pela mão do ser humano, com o objetivo de convencer a prefeitura de uma cidade a não derrubar uma mangueira centenária. A narrativa inspirou os estudantes.
— Pequenas atitudes podem mudar muitas coisas. A redação que o menino escreveu no livro salvou uma árvore! Aquela árvore é como um símbolo do que podemos fazer pelo ambiente — declara Rafaela Petry Alencastro, 10 anos.
— Isso mostra que é importante preservar. Porque assim podemos deixar o planeta mais limpo, com menos doenças — completa a colega Camille Sperb, nove anos.
O assunto é comum não só em sala de aula, mas em todos os ambientes do colégio – e até fora do terreno escolar. Estudantes, professores, diretores, coordenadores: no Santa Inês, todos participam de um projeto de conscientização ambiental que contempla desde a Educação Infantil até o fim do Ensino Médio. O objetivo é fazê-los entender, desde os primeiros anos na escola, a importância de falar sobre natureza, preservação e sustentabilidade. E tem dado tão certo que, mais do que compreender a mensagem, os jovens têm se tornado agentes de transformação por onde passam.
A "mudança de cultura", como define a direção, teve início em 2015. A partir daquele ano, foram dispostas lixeiras seletivas, criados pontos de descarte, reforçado o conteúdo sobre conservação em sala de aula. Há coleta de óleo de cozinha; uma caixa em que eletrônicos não mais utilizados podem ser deixados para serem encaminhados ao descarte adequado; a realização de uma feira semanal de alimentos orgânicos. Muito do material distribuído aos pais e alunos está em formato mais ambientalmente amigável: são agendas, informes, memorandos feitos com papel reciclável.
Mas o maior impacto veio no ano passado, quando a escola começou a realizar eventos sem o uso de copos descartáveis. Neste mês, a festa junina que mobilizou a comunidade escolar tinha suco, pipoca, amendoim. Mas nada de plástico – mesmo os pratos utilizados eram biodegradáveis. Com isso, a escola calcula ter evitado o descarte de 8 mil unidades de plástico e isopor. Isso em apenas um evento.
Isopor também? Pois é.
— Não vai ter isopor porque demora muito a decompor e isso faz mal para o planeta — explica um dos alunos, caso tenha ficado a dúvida.
Como alternativa, todas as famílias dos alunos matriculados receberam copos recicláveis, que são lavados e reutilizados como parte de um hábito já comum entre alunos e educadores.
— São ações expressivas, e houve adesão significativa. O nível de conscientização tem sido grande — declara Maria Waleska Cruz, coordenadora pedagógica do colégio.
A campanha foi tomando forma aos poucos. E hoje é um exemplo que pode ser adotado em qualquer escola.
Em vez de esse esforço ecológico se tornar algo realizado apenas uma vez por ano, ou deixado de lado e exposto somente em alguns cartazes que, depois de um tempo, ninguém mais vê, o projeto foi crescendo com o passar dos anos. Hoje as crianças e os adolescentes são também responsáveis pela conscientização, levando a mensagem a colegas e a pais, familiares e amigos.
— Essa atenção à manutenção, o cuidado diário de saber "onde eu jogo lixo", por exemplo, já não é tanto uma inquietação. É algo bem natural. Faz parte do intuito deles — descreve Luana Fellix Eckert, professora do 1º ano do Ensino Fundamental.
A adaptação é mais demorada para os alunos de séries avançadas e que estão há mais tempo no colégio, já que os pequenos, quando entram nos primeiros anos da vida escolar, são recebidos com essa conscientização em pleno vigor. Mas todos, dos anos iniciais até o final do Ensino Médio, se mostraram muito receptivos às mudanças. Hoje, até as camisetas distribuídas são feitas de maneira ecológica, em malha de PET reciclado – e a vestimenta até virou uniforme.
Mas será que essa conscientização toda dá resultado mesmo longe do colégio? Perguntamos, tanto entre os alunos de 1° quanto do 4° ano do Ensino Fundamental, o seguinte:
— O que vocês fazem quando veem os pais de vocês usando copo plástico?
Seguiu-se, em ambas as turmas, um breve silêncio, logo quebrado por vozes animadas:
— Mas eles também não usam copo plástico...
Insistimos: e em festas, em lanchonetes, o que fazem? As crianças, então, explicam que nem sempre conseguem evitar o uso dos copinhos descartáveis. Mas eles são uma eventualidade: a preferência é sempre dada a outros tipos de material.
O silêncio não se repete quando a pergunta é sobre jogar lixo no chão. Os pequenos se mostram indignados com essa atitude.
— Eu fico furioso. Nunca se deve jogar lixo no chão. Nunca! Nem que não tenha nenhum lixo por perto, nunca — exemplifica David, do alto de seus sete anos.
— Tenho vontade de gritar e dizer para não jogar no chão. Tá errado! Não se deve jogar lixo no chão — sacramenta Guilherme Willmann, da mesma turma.
Os canudinhos disponíveis na lanchonete já são, há tempo, biodegradáveis – mas a maioria dos estudantes nem pede mais canudos, tendo já se conscientizado dos problemas ambientais que eles podem causar.
— Teve uma adesão legal, no sentido de "teoricamente eu entendo". É isso que precisa ser feito. Às vezes a gente escorrega, claro. Poxa, se estou precisando tomar água, e não tenho um copo por perto, vou ali e pego o copo plástico. Escorregadelas acontecem. Mas a mudança principal começou, e tem dado certo — diz a coordenadora pedagógica Maria Waleska Cruz.
Tudo isso também se reflete em inquietações dentro da sala de aula. Os jovens querem saber por que aprendem sobre esse tema na escola, quando, no dia a dia, o assunto não é tão abordado. E eles insistem, entendem, aprendem. Assim passam, mesmo sendo estudantes, a ensinar todos a sua volta.
— Se a gente não cuidar da natureza, a gente não está cuidando de si. Porque a gente é um ser da natureza. A gente foi criado para ser inteligente, não para começar a jogar tudo no chão — diz Júlia Barbieri, com apenas seis anos.
Ela logo completa sua linha de raciocínio dando mais uma lição – esta, exibida pela escola em cartazes espalhados por várias áreas, para que todos lembrem:
— O mundo muda com a transformação das pessoas.
O projeto
O que é?
Projeto de conscientização ambiental "Do aprendizado à mudança – We are the change"
Quem faz?
Educadores e alunos do Colégio Santa Inês, de Porto Alegre
Apoio
Empresas que promovem a reciclagem e destinação adequada de óleo de cozinha e de lixo eletrônico
Desde quando?
A "mudança de cultura" começou em 2015 e teve o impacto mais significativo a partir do ano passado, quando os copos descartáveis deixaram o ambiente escolar
Objetivo
Sustentabilidade, educação e comunicação são três conceitos-chave do projeto, que estimulam os integrantes da comunidade escolar a atuarem como protagonistas de conscientização social – atualmente, com foco na preservação do meio ambiente
Conquistas
Com as iniciativas promovidas, a instituição já evitou a utilização de mais de 20 mil copos descartáveis, apenas nos principais eventos da escola; recolheu e deu a destinação adequada para uma tonelada de resíduos eletrônicos; encaminhou para a reciclagem mais de 1.095 quilos de óleo de cozinha, desde 2017. Foi premiada no 13º Prêmio de Responsabilidade Social do Sindicato do Ensino Privado do Rio Grande do Sul (Sinepe/RS)