Com 1,7 mil habitantes, Barra do Rio Azul é um dos 35 municípios menos populosos do Rio Grande do Sul e um dos 125 menores do país. Lá, onde o Rio Azul e o Rio Paloma se cruzam, formando a barra que dá nome ao local e ilustra sua bandeira, também a vontade de ensinar e a sede pelo conhecimento se unem em turmas engajadas e motivadas, que aprendem brincando.
“Dar boas-vindas à educação é transformar o presente e moldar o futuro.” É a mensagem que recebe quem chega na Escola Estadual de Ensino Médio Cardeal Leme. O cartaz, bastante chamativo, condiz com a mensagem que quer passar e recebe, com as devidas boas-vindas, todos os visitantes, alunos, professores e funcionários. A metodologia implementada consiste, basicamente, em usar atividades lúdicas e jogos educativos para facilitar o aprendizado de matemática. Vem dando certo: Barra do Rio Azul é presença constante nas mais altas posições de diferentes indicadores estaduais e nacionais de educação no aprendizado da disciplina.
– Procuro abordar no dia a dia, durante as aulas, alguma atividade lúdica, usando jogos e aplicando o conteúdo em si. Não são jogos só pra descontrair: são para que ocorra o aprendizado, ou para que se fixe o aprendizado daquele conteúdo que foi visto em sala de aula. Quando a gente parte para as atividades, para os exercícios de fixação ou complementares, dá para perceber que o resultado é melhor – declara a professora de matemática e física Giovane Serraglio, uma das responsáveis pela execução do bem-sucedido método.
A prática, que contempla todas as turmas, desde o início do Ensino Fundamental até o fim do Ensino Médio, está tão atrelada ao ensino na escola que a coordenadora pedagógica, Noeli Pan, nem lembra quando começou a ser aplicada.
— Quando foi lançado o Programa Nacional Alfabetização na Idade Certa (PNAIC), em 2012, que passou a recomendar oficialmente os jogos pedagógicos como componente importante da educação no Brasil, nós vimos que estávamos fazendo certo, porque já era um método que adotávamos — orgulha-se Noeli.
E os estudantes também gostam. Em uma aula para o 8º e 9º anos – a existência de turmas multisseriadas, por conta da pequena população, é uma das dificuldades que o município tem de superar –, a professora Giovane divide os jovens em grupos. Os mais velhos recebem pequenos tabuleiros e algumas cartas, e logo vem a explicação: as cartas contêm dicas para que os alunos tentem descobrir uma equação do segundo grau. Quem acertar vai avançando casinhas, passo a passo, até que o jogo termine.
O método permite que todos participem do aprendizado e vejam aquilo que foi passado no quadro pela professora sendo aplicado na prática.
— Com os jogos, podemos brincar e aprender ao mesmo tempo — diz Ruan Dalla Rosa, 14 anos, aluno do 9° ano.
— Às vezes, a gente aprende mais do que se fosse uma aula convencional, só de explicação no quadro — resume Cláudia Lorenzato, também de 14 anos.
— A gente acaba prestando mais atenção porque, além de ser uma coisa divertida, facilita para adquirirmos conhecimento. A professora sempre tenta fazer o melhor para que a gente consiga aprender de um jeito bom, e não que seja algo que a gente não goste de fazer. Então a gente vê sempre coisas diferentes, e vai criando gosto de aprender — comemora a estudante Marina Marmentini.
Fica um convite: pesquise qualquer ranking sobre a qualidade da Educação Básica que contemple as escolas da rede estadual do Rio Grande do Sul nos últimos anos. Você vai perceber: invariavelmente, Barra do Rio Azul estará entre os municípios lá no topo. É assim no Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb), que avalia os alunos do 5º ano e do 9º ano do Ensino Fundamental e do 3º ano do Ensino Médio. E é assim na última edição do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), o mais abrangente indicador nacional de ensino nas escolas.
É preciso ponderar que municípios pequenos têm uma relativa vantagem em avaliações em larga escala como essa: quanto menor a amostra, maior a chance de uma turma atingir resultados expressivos – e também de alguns poucos alunos baixarem a média local. Para evitar falso-positivos, a solução é avaliar a evolução escolar, conferir se há motivos para os bons resultados e identificar se eles são consistentes, como acontece com Barra do Rio Azul.
Por lá, há apenas duas escolas, ambas públicas: uma estadual e uma municipal. Esta, que atende da educação infantil até o 9º ano, não tem alunos em número suficiente para constar nos indicadores nacionais, que exigem um mínimo de 10 estudantes por turma – e a Escola Municipal de Ensino Fundamental Jubaré tem, ao todo, 97 alunos. É na Escola Estadual Cardeal Leme, portanto, que se concentram os índices oficiais de Barra do Rio Azul.
Além do cartaz de boas-vindas, as paredes do colégio são repletas de referências à educação. Nas salas de aula, há respostas a perguntas propostas aos alunos que ressaltam a importância dos direitos humanos (questões como “quais os direitos dos alunos?”, “quais os direitos dos professores?” e “o que diz o Estatuto da Criança e do Adolescente?” estampam algumas delas). No refeitório, os jovens se alimentam em companhia de gênios como Aristóteles, Galileu, Newton e Einstein, em cartazes desenhados pelos próprios estudantes.
— É sempre importante ver a participação e o engajamento, tanto do professor quanto do aluno, para criar conhecimento — diz Juliana Fornech Minella, secretária de Educação do município.
Em outra aula, para o 7º ano, a professora Giovane coloca cada letra que forma a palavra “Matemática” no quadro, verticalmente. Em seguida, pede aos alunos que façam, cada um, seu próprio acróstico (composição poética em que o conjunto das letras dos versos compõe uma palavra ou frase). Parece um exercício de Língua Portuguesa? Também, mas não só: ao formar os versos, os alunos acabam pensando no que aprendem com os números além dos cálculos.
Logo na entrada da escola, um banner enaltece os resultados dos jovens: nota mais alta em Matemática entre as escolas estaduais nos anos iniciais, e quinta nota mais alta nos anos finais. Abaixo das notas, a mensagem: “Aqui, a educação é uma construção coletiva”.
O projeto
- O que é? Ensino de Matemática em Barra do Rio Azul.
- Quem faz? Educadores das escolas Jubaré (municipal) e Cardeal Leme (estadual).
- Desde quando? A coordenação pedagógica das escolas não sabe precisar, mas afirma que há muito tempo os jogos fazem parte das atividades pedagógicas no município.
- Responsáveis: professores Noeli Pan (coordenação pedagógica e 1º ano do Ensino Fundamental), Solange Mocellin (2º ano), Dilnei Borges (3º e 5º anos), Ieda Zeist (4º ano) e Giovane Serraglio (6º a 9º anos).
- Apoio: Secretaria da Educação, Cultura e Desporto de Barra do Rio Azul.
- Objetivo: aprimorar o ensino de matemática nas escolas do município com o uso de jogos educativos, atividades lúdicas e iniciativas que desmistifiquem a presença dos números, equações e fórmulas na vida dos alunos, aproximando-os dos cálculos matemáticos.
Conquistas
Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) 2017
- Maior índice de aprendizado avançado em matemática no 5º ano no Estado (72,72%);
- O índice de aprendizado insuficiente foi de 0% nos anos iniciais do Ensino Fundamental em matemática;
- Maior nota do Estado em matemática nos anos iniciais da rede pública (284,67);
- Quinta maior nota do Estado nos anos finais em matemática, também na rede pública (310,11).
Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) 2017
- Entre os maiores índices do Estado no 5º ano da rede estadual, com nota 7,7 (a maior nota é 8, conquistada pelo município de Mormaço).
Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas (OBMEP)
- Diversas premiações desde, pelo menos, 2012.