A Justiça Federal do Distrito Federal concedeu liminar nesta terça-feira (1º), autorizando que empresas de apostas online credenciadas pela Loteria do Estado do Rio de Janeiro (Loterj) possam operar em todo o território nacional. A decisão, provisória, derruba três portarias publicadas pelo Ministério da Fazenda e que restringiam essa atuação ao Estado do Rio.
Com a liminar, as empresas credenciadas no Rio, que regularizou a operação em abril de 2023, poderão operar em todo o país mesmo sem a chancela do governo federal.
"Concedo liminar (...) assegurando à autarquia e aos credenciados o amplo e irrestrito direito à exploração de apostas de quota fixa em ambiente online e virtual, nos termos do seu Edital e seguindo o seu critério para aferição de territorialidade", decidiu o juiz federal Antonio Claudio Macedo da Silva.
Na petição à Justiça, a Loterj alegou que opera de forma regulada desde abril de 2023, quando regulamentou lei própria no Estado do Rio, e que houve decisão no Supremo Tribunal Federal dando a garantia de operação de forma concorrente à União.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, apontou que a liminar "não faz sentido" e deve ser cassada:
— Eu acredito que nós vamos conseguir cassar essa liminar, porque não faz muito sentido um Estado ter uma loteria nacional. Ele ter estadual faz sentido, tem previsão legal, inclusive tem jurisprudência a respeito. Mas, se tiver atuação nacional em cada Estado, aí você vai realmente criar uma situação que não condiz com o texto constitucional. A nossa inclinação é defender junto aos tribunais que cada Estado tenha a sua jurisdição no território.
Nas portarias da Fazenda, houve ainda a restrição de divulgação das bets estaduais por meio de publicidade ou de patrocínio a equipes esportivas nacionais, em eventos com divulgação nacional, salvo aquelas autorizadas pela Fazenda. A liminar concedida à Loterj derrubou também estas medidas.
"As restrições impostas para publicidade, especialmente em eventos de âmbito nacional, são ilógicas e desproporcionais, já que as pessoas domiciliadas no Rio de Janeiro poderiam estar em trânsito pelo país. Portanto, as portarias violam diretamente os direitos da Loterj e de seus operadores, inviabilizando uma atividade previamente autorizada e contrariando legislações federais e constitucionais", disse o juiz.
Procurada, a secretaria de Prêmios e Apostas (SPA) do Ministério da Fazenda afirmou que "vai se pronunciar nos autos quando houver intimação de eventual decisão já tomada".
Segundo o Secretário de Prêmios e Apostas, Regis Dudena, a equipe econômica diz que está segura sobre as portarias publicadas, mas que a Advocacia Geral da União (AGU) poderá atuar judicialmente, caso necessário.
Loterj X União
O pano de fundo da disputa entre Fazenda e governo do Rio é o crescimento vertiginoso desse mercado bilionário, que passa a ser tributado, gerando receitas aos Fiscos federal e estaduais. Trata-se, portanto, de um setor de interesse dos governadores, envoltos em uma nova reestruturação da dívida, e também da União, que tenta se aproximar da meta de déficit zero nas contas públicas neste e no próximo ano.
Nesse contexto, o embate entre Fazenda e Loterj diz respeito ao alcance das loterias estaduais — viabilizadas recentemente pelo STF, em decisão de 2020, que quebrou o monopólio da União. Em notificação formal enviada em março, a equipe econômica solicitou ao órgão fluminense que alterasse o edital de credenciamento das bets.
A exigência era de que fosse respeitado o princípio da territorialidade, ou seja, que a operação ficasse restrita aos apostadores localizados no Estado — como determina a lei aprovada pelo Congresso no fim do ano passado. Para isso, seria necessário que as plataformas fizessem uso de serviços de geolocalização, que processam informações em tempo real.
A Loterj, porém, rebateu os argumentos da Fazenda. A autarquia alega que essa mesma lei preservou os termos das concessões estaduais — isso para aquelas realizadas antes da edição da Medida Provisória (MP) que conferiu as diretrizes da atividade no âmbito nacional. A MP de autoria do governo foi publicada em julho de 2023, enquanto que o edital da loteria do Rio data de abril do mesmo ano.
As condições oferecidas pela Loterj foram bem mais benéficas às empresas do que as posteriormente estabelecidas pelo governo federal. O Estado cobra, por exemplo, R$ 5 milhões pela outorga, ante R$ 30 milhões exigidos pela União; e taxa em 5% o chamado GGR (gross gaming revenue, na sigla em inglês; ou seja, a receita obtida com os jogos, subtraídos os prêmios pagos aos apostadores) ante 12% praticados pelo governo.