Nos momentos de crise, o cooperativismo — sobretudo, por meio das instituições que atuam no mercado financeiro — costuma ganhar papel de relevância. Foi assim, durante a pandemia, quando a base de associados do sistema cooperativo de crédito brasileiro — formada por Sicredi, Cresol, Unicred, Ailos e Sicoob — aumentou 64,65%, passando de 11,6 milhões de pessoas, em 2019, para 19,1 milhões, em 2023.
Agora, em meio ao processo de retomada da economia gaúcha após a tragédia climática de maio, a história se repete. E a expectativa é de que a taxa de crescimento do volume de ativos administrados, que foi de 78,40% (de R$ 338 bilhões para R$ 603 bilhões), em igual período, volte a figurar no horizonte, em razão da função exercida pela presença dessas bandeiras nos municípios de menor porte.
No Sicredi, além das somas aportadas em linhas de financiamento próprias e as operadas de maneira emergencial com recursos subvencionados pelo governo, já foram alocados R$ 90 milhões em ações inseridas no processo de reconstrução do Rio Grande do Sul.
Em evento realizado nesta terça-feira (16), no Centro Administrativo da instituição — que, aliás, serviu de base para as operações da Defesa Civil durante o período mais crítico da inundação em Porto Alegre —, o presidente da Central Sul/Sudeste, Márcio Port, apresentou um conjunto de razões que reforçam a atuação das cooperativas para além do universo estritamente financeiro.
Presença no Interior reforça a participação
Atualmente em 87 municípios, o que representa 17% das 497 cidades gaúchas, o Sicredi é a única agência bancária presente nessas localidades. No auge da enchente, comenta Márcio Port, um diretor de operações chegou a ser nomeado para controlar o acesso de carretas que traziam mantimentos ao Estado.
As agências, lembra o executivo, foram transformadas em centros de doações, que responderam por mais de 700 toneladas de materiais repassados aos desabrigados.
Lógica que difere do mercado
Os representantes do segmento destacam ainda que não é incomum que as cooperativas ofereçam linhas com condições de carência e juros mais em conta do que as de mercado. Desde a tragédia no Vale do Taquari, em setembro do ano passado, não são poucos os casos de associados que obtiveram crédito a juro zero para capital de giro ou investimentos.
Isso acontece, explica o economista-chefe da Sicredi, André Nunes de Nunes, porque a lógica cooperativa é diferente. Enquanto nos bancos tradicionais pode haver um entendimento de que os locais afetados por intempéries climáticas podem representar um aumento do risco na concessão de crédito, a divisão do sistema cooperativado em regionais não permite a realocação de uma região mais afetada para outra.
— Se o RS está mal, as cooperativas não podem optar por direcionar o recurso para outro Estado. Temos uma delimitação em alguns municípios, é algo físico, contempla os associados, que estão naquela região, então ela vai continuar lá.
Nunes usa o exemplo do furacão Katrina, em 2005, para reforçar a diferença no sistema cooperativo para a atividade bancária convencional:
— Olhando outros eventos, como o furacão Katrina, nos Estados Unidos, com todo o rigor acadêmico, o que se percebe é que as cooperativas, quando comparado o período do evento, estavam emprestando 70% a mais. Ou seja, a participação delas era maior nos empréstimos, em relação ao que se tinha no período anterior ao desastre. Na outra ponta, os bancos tradicionais (estavam) optando por não tomar risco elevado na região.