Volta à pauta da Câmara dos Deputados, a partir desta terça-feira (22), o substitutivo ao projeto de lei 4.401/21, que regulamenta os criptoativos no Brasil. Aprovado em abril no Senado, o texto conta com acordo de parlamentares para ser apreciado até a próxima quinta-feira (24) e considera ativos virtuais a representação digital de valor que pode ser negociada ou transferida por meios eletrônicos na realização de pagamentos ou investimentos. Essa modalidade movimentou R$ 215 bilhões em compra e venda no ano passado.
No substitutivo, aprovado em 26 de abril pelo Senado, foram incorporados elementos de projetos anteriores. A meta é normatizar a prestação de serviços com as criptomoedas por meio de diretrizes para o ingresso e o funcionamento das exchanges (semelhantes às corretoras de valores) que atuam no mercado.
A ideia é que para operarem no país, as prestadoras de serviços necessitem obter autorização prévia de um órgão a ser indicado por ato do poder Executivo federal, muito provavelmente o Banco Central. A entidade também definirá a classe de ativos submetidos ao crivo da futura lei.
A discussão é retomada no Brasil, justamente, em meio ao colapso da FXT, considerada a segunda maior exchange de criptoativos no mundo, com US$ 50 bilhões geridos por 130 empresas. O conglomerado foi alvo de especulações sobre a liquidez de seus ativos que motivaram saques simultâneos superiores a US$ 8 bilhões na segunda semana de novembro e derrubaram as cotações internacionais da principal criptomoeda, o Bitcoin. Na ocasião, levaram outras duas gigantes do setor, sediadas em Hong Kong, a suspenderem as retiradas.
O advogado, economista, presidente da Associação Brasileira de Direito e Economia (ABDE) e sócio do escritório Neubarth Trindade, Manoel Gustavo Neubarth Trindade, destaca, nesse contexto, que o projeto nacional traz contribuição para a segregação patrimonial dos valores pertencentes às empresas e aos clientes. Ele aponta ainda que a prestação de serviço de ativos virtuais observará, segundo os parâmetros a serem estabelecidos, a livre iniciativa e livre concorrência.
Proposta dá segurança sem abrir mão da livre concorrência
Da mesma forma, Trindade destaca que a futura lei passará a exigir boas práticas de governança. Entre os exemplos estão: a transparência, análise de riscos, solidez de operações, segurança de informação, proteção de dados pessoais, de poupança, e de defesa de consumidores e usuários.
— A iniciativa é muito positiva do ponto de vista da segurança proporcionada aos agentes econômicos e ao mercado de modo geral. Ao se normatizar a matéria de forma específica, há o maior reconhecimento, de certo modo, da sua regularidade e licitude. Embora pelo princípio da legalidade, pelo menos no âmbito da iniciativa privada, o que não está proibido seja permitido, a inexistência de normatização específica sobre o tema ainda traz dúvidas e, consequentemente, insegurança — comenta.
Para o presidente da ABDE, o marco legal também dará mais confiança e credibilidade para o investidor. Ele lembra que a necessidade de autorização prévia foi alvo de reclamações iniciais, em razão do receio de que fossem criadas barreiras de entrada adicionais ao mercado, com temores de eventual desestímulo à concorrência. Contudo, considera que a lei acrescentaria segurança, em um segmento que carece de fiscalização.
— Desde que a avaliação e autorização para funcionamento não seja arbitrária e discricionária, poderá ser um avanço importante — pontua.
Mercado
Em franca expansão, os ativos virtuais são utilizados, hoje em dia, por mais de 10 milhões de brasileiros (5% da população). De acordo com dados da Forbes Money, o país é um dos cinco maiores mercados do planeta, atrás apenas da Índia, Estados Unidos, Rússia e Nigéria.
Por aqui e no mundo, o crescimento dos criptoativos gera preocupação com sua utilização para a finalidade de lavagem de dinheiro. Em 2021, para se ter uma ideia, no Brasil, ocorreram golpes virtuais que, juntos, somaram R$ 2,5 bilhões em moedas virtuais, o que corresponde a pouco mais de 1% dos R$ 215 bilhões movimentados naquele ano, segundo dados do Senado.
Por essa razão, o substitutivo também altera o Código Penal para acrescentar a tipificação por “fraude em prestação de serviços de ativos virtuais, valores mobiliários ou ativos financeiros”. As penas previstas vão de dois a seis anos de reclusão mais multa.
Ponto a ponto: o que prevê o substitutivo ao PL 4401/21
- Classifica como ativo virtual a representação digital de valor que pode ser negociada ou transferida por meios eletrônicos em pagamentos ou investimentos;
- A exceção são as moedas soberanas, mesmo eletrônicas, e criptoativos que se consubstanciarem valores mobiliários, que deverão ser regulados pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM);
- Poder Executivo indicará órgão que concederá a autorização prévia ao ingresso de empresas no mercado e definirá ativos financeiros regulados pela lei;
- As prestadoras de serviços de ativos virtuais terão que manter separados os patrimônios de recursos financeiros e ativos virtuais pertencentes aos clientes;
- Regulamenta práticas de governança como transparência, riscos, proteção de dados pessoais, proteção de poupança, solidez e defesa de consumidores e usuários;
- Exige prevenção à lavagem de dinheiro, à ocultação de bens, direitos e valores e combate à atuação de organizações criminosas;
- Altera o Código Penal para acrescentar a “fraude em prestação de serviços de ativos virtuais, valores mobiliários ou ativos financeiros”;
- Fixa de dois a seis anos de reclusão e multa para quem organizar, gerir e ofertar carteiras de ativos virtuais, com o fim de obter vantagem ilícita, em prejuízo alheio;
- Considera prestadora de serviços de ativos virtuais as empresas que realizam:
○ Troca entre ativos virtuais e moeda nacional ou moeda estrangeira
○ Troca entre um ou mais ativos virtuais;
○ Transferência de ativos virtuais
○ Custódia ou administração de ativos virtuais ou de instrumentos que possibilitem controle sobre ativos virtuais
○ Participação em serviços financeiros e prestação de serviços relacionados à oferta por um emissor ou venda de ativos virtuais.
Fonte: Agência Senado