Com o mercado de vendas aquecido diante do frio e da demanda reprimida, o setor de vestuário também sente a pressão do aumento de custos na produção. Uma parcela desse gasto maior por parte da indústria acaba chegando ao consumidor final. No acumulado de 12 meses fechados em junho, o grupo de vestuário registrou avanço de 15,25% no Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), indicador oficial de inflação, na região metropolitana de Porto Alegre. Os dados são do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Esse volume de alta nos preços está acima da inflação geral no período na Grande Porto Alegre, 10,68%. Componentes em falta ou com valores em alta são alguns dos fatores que explicam esse movimento.
A variação acumulada no setor de vestuário também é maior do que o salto no grupo de alimentação e bebidas no período de 12 meses (12,86%) na Grande Porto Alegre. No entanto, vale destacar que os alimentos têm peso maior dentro do IPCA.
O vice-presidente e diretor de Comunicação do Sindicato das Indústrias do Vestuário do Rio Grande do Sul (Sivergs), Rogério Bértoli Pereira, afirma que a escalada de preços nos itens de vestuário está ligada à falta de insumos e matérias-primas. A desorganização na cadeia de suprimentos diminuiu a oferta e elevou os valores de alguns itens utilizados nas confecções, segundo o dirigente:
— Tivemos um período um pouco extenso com falta de materiais, matéria-prima, aviamentos que ajudam no embelezamento das peças, linhas, elástico. A falta dos materiais nas fábricas gerou esse aumento de preços.
Pereira destaca que, neste momento, é possível observar indícios de certa atenuação nessa pressão. Isso permite estimar cenário com estabilidade nos aumentos de preços nos próximos meses, segundo o executivo:
— Para o verão, por exemplo, já tem alguns materiais que estão sofrendo retração no preço. Porque a cadeia de fornecimento já está começando a se equilibrar.
O presidente do Sindicato dos Lojistas do Comércio de Porto Alegre (Sindilojas), Arcione Piva, também cita o desarranjo nas cadeias de insumos como um dos principais fatores para a inflação no ramo de vestuário. Aumento nos custos e com transporte tem peso importante nesse processo, segundo Piva. O presidente do Sindilojas destaca que os comerciantes buscam alternativas para garantir volume de vendas diante de preços mais elevados:
— Hoje, uma das alternativas que a gente tem visto muito no varejo da moda é a redução nas margens para continuar atendendo a essa necessidade do consumidor. Talvez dando um pouco mais de prazo para as pessoas conseguirem fazer a compra.
Os dois principais fatores para a alta nos preços no setor são a inflação mundial e o aumento nos custos de transportes dos produtos. Esse desarranjo que está ocorrendo nas cadeias de suprimentos no mundo inteiro.
ARCIONE PIVA
Presidente do Sindilojas Porto Alegre
Ao mesmo tempo que tenta amenizar os repasses de custos ao consumidor final, o setor de vestuário registra aumento de demanda pelos produtos. O grupo de tecidos, vestuário e calçados acumula alta de 19% no volume de vendas no Rio Grande do Sul no acumulado de 12 meses até maio. Os dados são da pesquisa mensal de comércio, do IBGE. O segmento ocupa a terceira colocação entre as maiores evoluções no período. Especialistas e integrantes do setor atribuem esse crescimento a uma retomada após período de baixa demanda durante os picos da pandemia, à volta dos eventos e do trabalho presencial e ao frio antecipado neste ano. Roupas de inverno costumam ter ticket com valor maior.
— O frio chegou antes do normal dos últimos anos. No mês de maio, já tínhamos dias bastante frios. Isso ajudou bastante na antecipação de compras — afirma o presidente do Sindilojas.
O executivo observa que a participação dessa espécie de "inverno antecipado" no salto das vendas do segmento será melhor aferida no final do ano. Nesse fim de ciclo, será possível observar se o crescimento ocorreu diante desse fator ou majoritariamente por causa da demanda reprimida.
Os dados separados por itens reforçam a avaliação do dirigente. No recorte de 12 meses, é possível ver variação maior entre os produtos com as maiores variações dentro do grupo de vestuário no IPCA. Já no acumulado dos seis primeiros meses deste ano, os agasalhos lideram.
Falta de mão de obra qualificada
Diante da falta de materiais, elevação na tabela de preços e entraves de importação, parte da indústria do vestuário buscou investir na produção interna de alguns itens que eram comprados de fora do país. O dirigente do Sivergs confirma que essa espécie de reindustrialização já é observada em alguns Estados.
O volume de vendas cresceu bastante. O que nós estamos sentindo agora é a falta de mão de obra. A gente não consegue crescer mais porque não tem mais mão de obra qualificada.
ROGÉRIO BÉRTOLI PEREIRA
Vice-presidente e diretor de Comunicação do Sivergs
Rogério Bértoli Pereira também afirma que, junto do aumento de demanda por artigos de vestuário, existe impulso na procura por trabalhadores. Segundo ele, a indústria do vestuário contava com aproximadamente 23 mil empregados registrados no Estado. Em maio de 2022, esse montante saltou para cerca de 30 mil funcionários. Ele reforça que ainda existe espaço para contratações:
— A questão toda é que a gente não tem mais mão de obra qualificada para trazer para dentro das empresas. Uma parte dos trabalhadores que saíram foi procurar trabalho em outras áreas.
Diante desse cenário, o dirigente cita a necessidade de intensificar o treinamento de funcionários e buscar outros para tocar a produção de artigos para o verão.
O presidente da Federação dos Trabalhadores nas Indústrias do Calçado e do Vestuário do Rio Grande do Sul (Feticvergs), João Nadir Pires, confirma que a busca por mão de obra está aquecida no setor. E salienta que esse movimento afeta o segmento como um todo, mas é mais forte no ramo de calçados.
— Os empresários do setor do vestuário têm buscado incentivar a formação de costureiros e de outros profissionais para a área porque já não encontram esses profissionais. Isso mostra que está positivo em termos de produção.
No entanto, Pires cita que ainda existe uma dificuldade no âmbito da negociação de salários para tentar recuperar perdas causadas pela inflação no bolso dos trabalhadores. Nesse sentido, ele cita a migração de funcionários da área do vestuário para outros setores em busca de vencimentos maiores.