Depois de o governo federal anunciar que vai cortar ou reduzir o imposto de importação de 11 produtos para conter a disparada da inflação, os efeitos na conta final para os consumidores ainda são incertos. Apesar de concordarem que a redução de taxas ajuda a cadeia produtiva, representantes de alguns setores beneficiados pela medida avaliam que a queda de preços pode não acontecer.
Um dos itens da lista é o trigo, produto-base para padarias, fábricas de pães, massas e biscoitos. A taxa era de 9% e foi zerada. Para a farinha de trigo, o tributo caiu de 10,8% para zero.
No Rio Grande do Sul, o vice-presidente do Sindicato das Indústrias de Panificação e Confeitaria e de Massas Alimentícias e Biscoitos do Rio Grande do Sul (Sindipan-RS), Arildo Bennech Oliveira, avalia que o efeito é praticamente nulo. Isso porque o principal fornecedor de trigo para o Estado é a Argentina, país do qual já não havia cobrança da Tarifa Externa Comum (TEC) por fazer parte do Mercosul.
Nesse sentido, a extinção da taxa pode ser benéfica aos Estados do Centro e do Norte do Brasil, que se abastecem do trigo dos Estados Unidos e do Canadá, em razão da logística.
Na avaliação de Oliveira, a medida terá mais efeito para não faltar trigo do que para baixar o preço. O conflito entre Rússia e Ucrânia tem reduzido a oferta do cereal no mundo, já que os países lideram a lista dos maiores exportadores de trigo.
— Mais do que tentar reduzir, o governo está evitando uma escassez de trigo, porque a Argentina começou a exportar para outros países (em função da guerra), e não sei se o estoque vai até a nossa safra. Temos uma situação muito difícil de falta de trigo — diz o diretor do Sindipan.
Oliveira lembra que a produção gaúcha do cereal em 2022 tende a ser a maior história, superando a safra que já foi recorde no ano passado. O problema é a entressafra, porque a Ucrânia tem produção que não consegue escoar da Europa. O Brasil não é autossuficiente no trigo e depende do que vem de fora para abastecer o mercado interno.
O preço da tonelada do trigo importado, com o frete, já chega a R$ 2,7 mil. Há dois meses, custava R$ 2,1 mil. Com esse cenário, o dirigente não acredita em redução de preços ao consumidor nos produtos fabricados a partir do cereal:
— Pelo contrário. Vamos ter aumento em junho — adianta Oliveira.
Resposta ao consumidor final
Nas prateleiras, o efeito não deve ser diferente. Presidente da Associação Gaúcha de Supermercados (Agas), Antônio Cesa Longo avalia que a redução das taxas é importante sobretudo “pelo efeito psicológico”. Segundo o dirigente, embora o governo demonstre intenção em colaborar, existe a questão da oferta e da procura.
— A redução de impostos é importante para dar a oportunidade às indústrias de buscarem insumos para manter seus preços competitivos. Infelizmente, em alguns segmentos como o trigo, questões externas como a Guerra da Ucrânia seguirão pressionando os preços — disse Longo.
Para o presidente da Agas, o momento é desfavorável para o consumidor porque o brasileiro está perdendo renda. E o cenário deve seguir pesando no bolso.
— Não dá para criar uma expectativa de que os preços vão baixar porque nenhum país do mundo tem algum produto ou alimento mais barato que o nosso — acrescenta.
Competitividade na construção
Outro item que entrou na lista de redução de imposto para importação é um produto do aço, o vergalhão, que tem efeito na construção civil. A tarifa foi reduzida de 10,8% para 4%. Na avaliação do presidente do Sindicato das Indústrias da Construção Civil no Estado do Rio Grande do Sul (Sinduscon-RS), Claudio Teitelbaum, a medida é um impulso pequeno, mas que ajuda o setor a aumentar a produção e mostra sensibilidade do governo ao tema.
— Temos que comemorar toda iniciativa que reduz tributos porque isso propõe aumento de investimento por parte dos empresários. O custo da obra vem encarecendo por causa dos insumos, e isso faz perder a competitividade — diz Teitelbaum.
Para o dirigente, ajustes no mercado interno, como a redução de tributos nacionais, são sempre mais efetivos. Mas a importação do produto a menor custo pode ajudar a reequilibrar o mercado:
— É mais um competidor entrando. O aço tem aumentos de preço represados, e, com a entrada de produto do mercado externo, pode ajudar a reequilibrar.