Correndo contra o tempo para garantir aumento no valor do recém criado Auxílio Brasil, o Senado tenta avançar na análise da proposta de emenda Constitucional (PEC) dos Precatórios. O relator da PEC, senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), articula mudanças em pontos do texto para viabilizar a votação na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) nesta semana. O fatiamento da proposta é uma das soluções para resolver o impasse na Casa sobre alterações no texto.
Após aprovação na Câmara dos Deputados, no início do mês, a PEC enfrenta resistência no Senado. Na prática, a soma de dois cenários ganhou força na última semana diante da falta de consenso. O primeiro é votar o texto da Câmara ou alterar o que é possível na PEC sem alterar o mérito. Isso garantiria a aprovação no Senado nas próximas semanas e abriria caminho para promulgação.
A partir disso, mudanças mais robustas, de mérito, que obrigariam o retorno da matéria para a Câmara, seriam reunidas em uma PEC paralela. Esse texto seria apreciado em outro momento pelo Congresso. No entanto, ainda não há definição sobre esse fatiamento.
Para não voltar para a Câmara e ir direto para a promulgação, a PEC precisa ser aprovada sem modificações no mérito ou apenas com modificações de redação no plenário Senado. Por isso o governo tenta passar o texto pelo crivo dos senadores com a mesma base da proposta aprovada pelos deputados. Se isso não ocorrer, o aumento do valor mínimo do Auxílio Brasil a partir de dezembro fica ameaçado.
Líder do governo no Senado e relator do texto, Bezerra Coelho, discute algumas dessas mudanças para viabilizar a aprovação na comissão e encaminhar o texto para votação no plenário da Casa nas próximas semanas. Entre as sugestões de bancadas está a que transforma o Auxílio Brasil em um benefício permanente. O programa, que entrou em vigor na semana passada, tem prazo de validade até dezembro de 2022.
— Nós estamos avançando para construir um relatório que deve incorporar algumas dessas sugestões. Gostaria de adiantar a solicitação em relação a transformar o programa, em vez de um programa transitório, em um programa permanente. O governo deve avançar com essa reivindicação — adiantou Bezerra Coelho em entrevista para o canal GloboNews no domingo (21).
Bezerra projeta apresentar o relatório na quarta-feira (24) e votar o texto no dia seguinte. Nesta segunda-feira (22), o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), afirmou que o colegiado pode apreciar o texto ainda na quarta-feira.
A matéria abre espaço no orçamento com o parcelamento de parte dos precatórios, caminho escolhido pelo governo para aumentar o valor mínimo do benefício para R$ 400 a partir de dezembro. Precatórios são dívidas do governo a partir de ações judiciais que já transitaram em julgado. Ou seja, decisões judiciais definitivas.
O governo revisou a projeção de abertura no teto para R$ 106,1 bilhão em 2022 com a aprovação da PEC. Desse montante, R$ 48,6 bilhões seriam para despesas primárias "sem opção de escolha" e outros R$ 56,4 bilhões para despesas previstas "com opção de escolha". Nas despesas "com opção de escolha", o governo quer usar R$ 51,1 bilhões para bancar os R$ 400 mensais do Auxílio Brasil em 2022.
Propostas paralelas
No âmbito das propostas paralelas, a retirada de parte do pagamento de precatórios do teto de gastos previsto na Constituição é um dos pleitos com maior destaque. No entanto, essas mudanças podem entrar em outra proposta, que seria discutida em um segundo momento.
Os senadores José Aníbal (PSDB-SP), Oriovisto Guimarães (Podemos-PR) e Alessandro Vieira (Cidadania-SE) apresentaram uma emenda nesse sentido. Pela ideia dos parlamentares, há a possibilidade de garantir o Auxílio Brasil sem mexer no pagamento dos precatórios previstos para 2022.
— Com esse novo texto, estamos oferecendo a oportunidade de o governo criar o benefício de forma sustentável. Podemos ter responsabilidade social sem cometer nenhuma irresponsabilidade fiscal — afirmou Guimarães.
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), defendeu, nesta segunda-feira (22), a discussão sobre retirar o pagamento de precatórios do teto de gastos no futuro, mas rejeitou a possibilidade de fazer isso agora, para 2022.
— Sendo dívida, em tese, no futuro se poderia pensar a respeito de retirá-lo do teto de gastos públicos. O problema é fazer isso agora. Como sustentar a retirada de R$ 89 bilhões de precatórios do teto de gastos no momento em que se exige uma absoluta responsabilidade fiscal? — disse Pacheco.
O Senado realizou, nesta segunda-feira, uma sessão temática para debater a PEC dos Precatórios. Representantes da Instituição Fiscal Independente (IFI) e a ex-ministra do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Tereza Campello, estão entre as pessoas que participaram do encontro.
Possíveis mudanças
Essas alterações podem entrar no relatório da CCJ ou em uma nova PEC. Isso ainda não foi definido no Senado
Auxilio Brasil permanente
Substituto do Bolsa Família, o programa entrou em vigor na semana passada e tem prazo de validade até dezembro de 2022. O relator costura acordo para tornar o Auxilio Brasil permanente. A forma de financiamento para viabilizar esse cenário ainda não foi esclarecida.
Controle fiscal
Também está em negociação uma regra no sentido de que todo o espaço fiscal aberto pela PEC seja vinculado à despesa de correção do salário mínimo e do pagamento do Auxílio Brasil. Isso seria uma ferramenta para evitar que a margem fiscal aberta seja usada para aumentar salários de funcionários públicos.
Gestão da despesa com precatórios
Os senadores pretendem criar um grupo para fiscalizar os pagamentos de precatórios. Também está na pauta de negociações um mecanismo que prevê a garantia de pagamentos dos precatórios do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério para os Estados (Fundef) em 2022.
Propostas paralelas
Parlamentares tentam emplacar emendas e propostas alternativas à PEC dos Precatórios
Mudança no teto
Emenda substitutiva, de autoria dos senadores Aníbal, Guimarães e Vieira, retira do teto de gastos, em caráter excepcional, parte do pagamento de precatórios. Esse movimento abriria espaço fiscal de R$ 89 bilhões, garantindo o pagamento do Auxílio Brasil, segundo os parlamentares. A PEC original abre espaço no orçamento parcelando o pagamento de parte dos precatórios e alterando o método de cálculo do teto de gastos.
Renda básica
Proposta do senador Rogério Carvalho (PT-SE) exclui do teto de gastos R$ 50 bilhões, em 2022 e 2023, para o pagamento de uma renda básica. Além disso, o texto insere o direito a esse tipo de renda entre as garantias constitucionais.