Puxado pela indústria, o Rio Grande do Sul registra melhora no mercado de trabalho com carteira assinada. Sinal disso é que, em fevereiro, o nível de empregos formais encostou no patamar verificado no pré-pandemia. Contudo, a recente piora da crise sanitária ameaça o desempenho gaúcho no momento e espalha incertezas no cenário dos próximos meses.
Para analisar o quadro, GZH consultou dados do Caged, o cadastro de vagas formais do Ministério da Economia. Graças à reação vista a partir do segundo semestre de 2020, o estoque de empregos chegou a 2,584 milhões em fevereiro, no Estado. É quase o mesmo nível de vínculos de igual mês do ano passado, às vésperas dos primeiros casos de coronavírus.
Em fevereiro de 2020, o Rio Grande do Sul tinha 2,586 milhões de postos em estoque. Na prática, a comparação mostra que os gaúchos ainda têm de recuperar 2,1 mil empregos com carteira para alcançar o nível pré-pandemia.
Após amargar demissões em massa no começo da crise, o Estado voltou a ter saldo positivo de vagas (mais contratações do que cortes) em julho de 2020. Até fevereiro de 2021, houve sete meses de avanço na geração de postos de trabalho – a exceção foi dezembro.
Além da retomada de atividades, programas federais de estímulo aos negócios e preservação de empregos também geraram reflexos no mercado formal, dizem analistas. Entre as iniciativas, está o Benefício Emergencial (BEm), que freou demissões ao autorizar, em 2020, a suspensão de contratos e a redução de jornada e salários.
Trabalhadores impactados pelo BEm tiveram direito à estabilidade por período igual ao de suspensão ou corte de jornada – em fevereiro, 3,4 milhões ainda gozavam da garantia provisória no Brasil. Com a piora da pandemia, empresários pedem a renovação do programa, mas o governo não tirou o projeto da gaveta até o momento.
No Rio Grande do Sul, dos cinco grandes setores contemplados pelo Caged, quatro superaram o nível de empregos verificado no pré-pandemia. Pelo lado positivo, a indústria é o segmento que mais chama atenção. Em fevereiro de 2021, o estoque de vagas nas fábricas chegou a quase 680 mil. Em igual mês do ano passado, eram 668,2 mil. Ou seja, no intervalo de um ano, a indústria criou 11,8 mil oportunidades, alta de 1,8%.
O setor de serviços, o maior da economia, pegou a contramão. É o único que ainda segue com nível de empregos abaixo do registrado antes da chegada da covid-19. Em fevereiro deste ano, o segmento tinha 1,056 milhão de vagas em estoque – 18,7 mil a menos do que em igual mês de 2020.
Efeitos
Na visão de analistas, as situações distintas refletem os impactos da pandemia sobre o consumo. Com o isolamento social para frear o coronavírus, serviços e comércio foram atingidos em cheio, com paralisação de atividades. É o caso de bares, restaurantes e hotéis, entre outros.
Já a indústria teve mais facilidade para se adaptar a restrições. Parte das fábricas, inclusive, viu a demanda subir com o consumo de produtos em casa. O dólar mais alto, acima de R$ 5, também favoreceu exportações, destaca o economista-chefe da Federação das Indústrias do Estado (Fiergs), André Nunes de Nunes:
– À medida que não puderam consumir alguns serviços, famílias passaram a comprar mais bens, produtos para casa. Parte da renda que antes iria para uma viagem no fim de semana foi direcionada para essas mercadorias.
Professor da Unisinos, o economista Marcos Lélis frisa que, devido ao avanço da covid-19, o retorno de programas como o BEm é necessário para inibir cortes de vagas.
– Para termos uma recuperação consistente de empregos, é preciso que os serviços voltem. É o setor com maior participação na atividade econômica – pontua Lélis.
Superação nacional
Ao contrário do Estado, o Brasil superou o nível de empregos de fevereiro de 2020. No mês passado, o estoque de vagas com carteira assinada chegou a 40,02 milhões no país. Representa alta de 1% frente a igual período do último ano, conforme o Caged.
Embora tenha sido abalado pela covid-19, o restante do Brasil não sofreu uma estiagem como a registrada pelo Rio Grande do Sul em 2020. A seca elevou as dificuldades do Estado. No ano passado, o PIB gaúcho caiu 7%, enquanto o recuo nacional foi menor, de 4,1%.
A questão é que a piora da pandemia representa desafio para a continuidade da reação em todo o Brasil. Nas últimas semanas, houve fechamento de atividades comerciais e de serviços em diversas regiões além do Rio Grande do Sul.
– Saber qual será o impacto dessa situação é uma dúvida que impera entre analistas. Vimos a confiança de empresários diminuir – ressalta o economista-chefe da Fiergs, André Nunes de Nunes.
Descompasso
O Caged registra só vínculos formais. Já o cálculo de desemprego no país, feito pelo IBGE, inclui trabalhadores informais, traduzindo realidade mais adversa. No Brasil, a taxa de desemprego chegou a 14,2% no trimestre até janeiro. À época, 14,3 milhões de pessoas buscavam trabalho, a maior marca da série histórica, iniciada em 2012.
O descompasso em relação ao Caged ocorre por combinação de fatores. Os informais foram mais afetados pela pandemia, diz Nunes. Com as restrições, muitos não conseguiram exercer suas tarefas.
Além disso, para ser considerada desempregado, precisa estar à procura de nova oportunidade profissional. Devido à interrupção de programas como o auxílio emergencial na largada do ano, projeções já indicavam que mais brasileiros voltariam a buscar trabalho. Assim, há impacto na taxa de desocupação.